14 setembro 2019

EM RUÍNAS A CATEDRAL DO INÍCIO DE NOSSA VIDA ACADÊMICA (Turma de 1971)





O mitólogo, Joseph Campbell, falando sobre o PODER do Simbólico em nossa realidade psíquica, o comparou a esfera do Sagrado. Disse ele: “Um templo é uma paisagem da alma”.

Fui, não nego, inundado por uma imensa tristeza, ao contemplar o Velho edifício que nos serviu de Templo no início de nossa jornada como acadêmicos de Medicina; templo, agora, em completa ruína e total abandono.

Transtornado, a mim mesmo perguntei e ao mesmo tempo respondi: o que aconteceu com a nossa primeira CATEDRAL? Só pode ter sido vítima de uma violação sacrílega.
Não à toa, os nossos guias ou mestres eram denominados catedráticos. Se vivos fossem, que diriam, hoje, os sacerdotes, Asdrúbal, Amílcar, Aníbal, Vitorino, Genival Veloso, e outros que os arquivos travados de minha memória, por ora, não me permitem trazer à tona?
Só sei que esses denodados guias, foram os primeiros a abrir nossos olhos para o estudo macroscópico e microscópico do corpo humano inerte e fatiado, porém sagrado.

Que extasiantes aulas recebíamos dos veneráveis mestres! Lembro de que, lá fora, enquanto nossos “xamãs”(líderes inspirados pelos espíritos para condução das cerimônias) se preparavam para execução do doce/crucial rito (as aulas), as alamedas que contornavam o Templo Sagrado, nos intervalos das ministrações, nos serviam de espaço profano para extravasamento do lado oposto da dualidade intrínseca de nosso mundo afetivo ou interno, como faz ver bem, Elíade Mircea, no trecho, abaixo, pinçado de seu antológico livro “O Sagrado e o Profano”:

Sagrado é todo aquele espaço, objeto, símbolo, que tem um significado especial para uma pessoa ou grupo. Profano é tudo que não é sagrado, toda a vida comum do dia a dia, os fatos e atos da rotina”.

O certo é que quando adentrávamos nos recintos mais íntimos da Catedral primeira de nosso passado de acadêmico, algo nos transformava: um misto de medo, temor e tremor nos contagiava, algo como uma voz angelical a imbuir em nosso espírito o mesmo sentimento solene que assoma os corações dos fiéis que ascendem ao altar da catedral para, em sua prece dominical, oferecer seus sacrifícios vivos e agradáveis a Deus.

Cada um de nós da turma de 1971, com certeza, guarda célebres lembranças desse longínquo passado. O nosso colega Evaldo Carneiro, portador de uma fantástica memória, foi buscar no baú de seu abismo psíquico, memoráveis lembranças, uma delas retocadas pelo colega Joaquim. Não poderia deixar de ressaltar, aqui, o brilhante passeio histórico que saiu da pena do colega Jaime Xavier.

Quantas imagens, quantas memórias surgiriam se o caleidoscópio do nosso inconsciente coletivo daquele saudoso tempo pudesse, um dia, destravar seus arquivos e deixar fluir seu conteúdo por completo. Com certeza, livro nenhum caberia a autobiografia do nosso primeiro ano de faculdade (peço vênias ao nosso genial biógrafo ― o irmão Fonseca).

Ao olhar demoradamente o que restou de nosso primeiro palácio sagrado, me vieram à lembrança a melodia e a letra de “Saudosa Maloca” magistralmente interpretada pelos “Demônios da Garoa”. O estribilho desse memorável samba, cai bem aqui, como epílogo de minha melancólica descrição:

Saudosa maloca, maloca querida
Din din donde nos passemos
Os dias feliz de nossas vidas”


Por Levi B. Santos
Guarabira, 14 de setembro de 2019