30 janeiro 2009

A FERA INTERIOR




Lá dentro de mim se esconde
Um animal perigoso.
Está preso entre as grades,
Por ter algo venenoso.
Ponho guarda dia e noite,
Pois ele é contencioso.





..........Seu vil veneno entorpece
..........Nos deixando estonteado.
..........No sangue, o cálido desejo
..........Pode ser disseminado.
..........Quem não resistir a essa fera,
..........Termina envergonhado.
.



A mordedura desta fera
Envenena o coração.
Me induz a ver um argueiro
No olho do meu irmão;
Não deixa enxergar a trave
Na minha própria visão.




..........P’ra não expor esse monstro
..........Construí uma fachada.
..........Se ele mostrar suas garras
..........Logo dou uma recuada;
..........Lutarei contra esse instinto
..........Seguindo uma tabuada.





Na Bíblia o apóstolo Paulo
Desigual luta travou.
Com a fera dentro do peito,
Ele então assim falou:
Quando eu quero o bem fazer,
O mal diz aqui estou.





..........O que me ensina esse Livro
..........P’ra domar o animal?
..........Diz que eu não posso matá-lo,
..........É o meu espinho carnal.
..........E só então no fim dos tempos
..........Deus dará fim a esse mal.




Versos em prosa por Levi B. Santos
Guarabira, 27 de janeiro de 2009


26 janeiro 2009

VENDIDA




Vendeste o meigo corpo e prendeste a tua alma,
Abdicando da inocência, a beleza e a esperança.
Pois saibas que na vida não há fardo mais pesado
Que a cruz desse pecado sendo ainda uma criança.




Deixasse o amor puro do doce tempo da escola.
Dos arroubos pueris só restam sombra e saudade.
E quando os anos passarem e cansares dessa vida,
Lembrarás as fantasias sem a mácula da maldade.




O teu olhar radiante que enlouquecia os rapazes
Desapareceu com o tempo, o sofrimento o levou.
Os gemidos e teus ais hoje espantam os clientes,
Que em teu corpo imaturo se serviram sem pudor.




Os teus amantes agora te consideram um estorvo;
De tua graça e teu riso, eles nem se lembram mais.
Mas se esboçares um sorriso em teu sono agitado,
Sei que em sonho estarás voltando para teus pais.



Versos por Levi B. Santos
Guarabira, 26 de janeiro de 2009

19 janeiro 2009

SE EU TIVESSE A MENTE DE CRISTO




Se eu tivesse a mente de Cristo ─ não choraria só por Jerusalém, Gaza e Israel. Choraria sobre as favelas do nosso Brasil onde o tráfico de drogas mata muito mais do que o conflito Israel-Palestino.

Se eu tivesse a mente de Cristo ─ não discutiria sobre teologia e religiões. Antes diria que a verdadeira religião pura e imaculada para com nosso Deus seria: visitar os órfãos e viúvas em suas aflições, e guardar-se isento da corrupção do mundo.

Se eu tivesse a mente de Cristo ─ as minhas vestimentas de obreiro seriam idênticas à da maioria das pessoas que estão ao meu redor.

Se eu tivesse a mente de Cristo ─ toda vez que fosse orar a Deus, eu me trancaria secretamente em um quarto, sem ter ninguém por perto.

Se eu tivesse a mente de Cristo ─ eu não amaria os primeiros lugares nas ceias, nem as primeiras cadeiras nos templos.

Se eu tivesse a mente de Cristo ─ não me importaria de ser chamado beberrão e comilão ao sentar à mesa com os pecadores.

Se eu tivesse a mente de Cristo ─ eu defenderia os meus discípulos do veneno dos escribas e doutores da Lei.

Se eu tivesse a mente de Cristo ─ eu ficaria do lado das prostitutas, fazendo calar os seus acusadores.

Se eu tivesse a mente de Cristo ─ eu chamaria de raposa, certos Herodes de hoje; assim como denominaria de sepulcros caiados a maioria dos que estão sentados na cadeira de Moisés.

Se eu tivesse a mente de Cristo ─ eu chamaria quem me traísse, de amigo.

Se eu tivesse a mente de Cristo ─ eu me surpreenderia com a fé dos que não são nossos.

Se eu tivesse a mente de Cristo ─ eu diria que condenação eterna seria rejeitá-Lo, e diria que vida eterna era reconhecê-Lo como Filho de Deus.

Se eu tivesse a mente de Cristo ─ eu não andaria ansioso, nem procurando sinais do fim do mundo.

Se eu tivesse a mente de Cristo ─ eu não procuraria bens terrenos, onde a traça come e o ferrugem corrói.

Se eu tivesse a mente de Cristo ─ eu diria para os que se preocupam com o vestuário: “olhai para os lírios do campo. Nem mesmo Salomão em toda a sua glória se vestiu como eles”.

Se eu tivesse a mente de Cristo ─ eu diria para os fariseus de hoje: “vocês estão fechando o reino dos céus; nem entram, nem deixam entrar os que estão querendo”.

Se eu tivesse a mente de Cristo ─ eu denunciaria os que estão fazendo da igreja covil de ladrões.

Se eu tivesse a mente de Cristo ─ eu deixaria as minhas empresas para seguí-Lo, como fez o empresário da pesca Simão Pedro.

Se eu tivesse a mente de Cristo ─ não estaria profanando o lugar sagrado (púlpito) com “shows”, espetáculos, e retetês estimulantes de êxtases carnais coletivos.

Se eu tivesse a mente de Cristo ─ não diria vim para mandar. Diria vim para ser servo.

Se eu tivesse a mente de Cristo ─ eu não colocava fardos pesados sobre as ovelhas, que nem eu mesmo com a mão consigo movê-los.

Se eu tivesse a mente de Cristo ─ tudo que eu falei até agora, ficaria gravado em meu coração e seria posto num quadro bem visível na parede interna dos templos.


Levi Bronzeado dos Santos
Guarabira, 20 de Janeiro de 2009

17 janeiro 2009

UMA CRISE BEM-VINDA



Uma das recentes preocupações do mundo globalizado, e que a imprensa vem dando uma cobertura toda especial, é a relativa à crise das montadoras de automóveis. O governo dos EUA já desembolsou quantias bilionárias para salvar a GM, a FORD, e a Chrysler. No Brasil as nossas autoridades econômicas vêm fazendo de tudo, tentando manter o ritmo de crescimento dessa indústria. Para isso criou várias facilidades, entre as quais, a diminuição de impostos do setor.

O mercado saturado de automóveis não dá bolas para as cidades entupidas de carros, em detrimento da população que vem perdendo a cada ano o seu direito de livremente circular pelas ruas. Na grande metrópole, São Paulo, as ruas não são mais das pessoas, são tomadas por filas intermináveis de carros praticamente parados, andando a uma velocidade menor que a do pedestre. Até agora, todas as tentativas de melhorar o trânsito na nossa maior cidade foram infrutíferas.
Quem, porventura, tiver a ousadia de tentar disputar o espaço com esses bólidos automotivos nas grandes cidades, pagará caro. O pobre do pedestre é obrigado a aceitar como "coisa" normal, os barulhos acima de sua capacidade auditiva, a poluição no ar que se respira, sem falar da invasão desrespeitosa de seu já exíguo espaço, entre outros infernais incômodos.


Não é de se pensar que essa crise caiu do céu? Não seria esse o momento para uma reflexão mais profunda por parte de nossas autoridades? Não seria essa a ocasião propícia, para entender que as cidades já não suportam a grande quantidade de automóveis existentes, além do que é despejado anualmente pelas montadoras? As nossas estradas e vias urbanas não têm as mínimas condições para oferecer um tráfego razoável. Porém, apesar dos engarrafamentos monstruosos que nos causam tanto estresse durante a maior parte do dia, esses bólidos poluidores e causadores de acidentes continuam sendo a nossa ambição maior de consumo.


Esta crise “bendita” é mais que um alerta, é um recado urgente convocando-nos a deixar para trás, certos paradigmas sociais que nos animam a comprar um carro sempre que recebemos o nosso primeiro salário, sempre que assumimos um emprego, ou melhoramos a nossa condição econômica. Se quisermos que as nossas cidades sobrevivam, temos que acabar com essa racionalização burguesa de que a aquisição de um automóvel é a condição prévia para ser visto como participante de uma elite. Elite esta, que nunca pára, a fim de refletir sobre sua qualidade de vida.


Aqui mesmo, andando por minha capital (João Pessoa – PB), é raro o dia no qual não vejo acidentes. Os motoristas nem sequer param mais para observar as vítimas estiradas no solo, cobertas com papéis ou sacos plásticos. Diante das tragédias nas pistas bem asfaltadas e sinalizadas de nossas cidades, os comandantes em suas máquinas potentes, passam céleres rumo aos seus destinos, sem nenhum olhar de condescendência dirigida ao local da tragédia. À medida que cresce o nosso corre-corre cotidiano e sem sentido, os acidentes nas rodovias vão sendo banalizados como “coisa” inerente ao que se chama de “progresso”.


Esse progresso insano que não nos deixa enxergar que as cidades não suportam mais tantos automóveis circulando, deve ser revisto ou repensado.


Será que o povo não será o maior beneficiário da quebradeira que atingiu as multinacionais automotivas?


Poderão dizer os grandes da indústria automobilística: “E o desemprego com as demissões em massa?”. Essa será a resposta dos que têm cabeça para pensar: “O setor de defesa do meio ambiente, incorporará muitos desses desempregados em suas fileiras”.


As montadoras em crise produzirão menos carros a partir de 2009. E daí...


Que importa! Essa “crise bem-vinda” da indústria automobilística, com falência e tudo, trará, quem sabe, as famílias de novo para as tranqüilas caminhadas nas ruas de suas cidades, sem medo de atropelamentos. Resta a cada um de nós, possuidores de um ou mais veículos automotivos, refletir, se queremos deixar um mundo melhor para nossos filhos e netos, ou continuar com os nossos maiores objetos de desejos em meio ao caos atual das estradas e avenidas.


Pode ser uma utopia, ou começo de um sonho, mas na minha imaginação eu vislumbro as gerações futuras vencendo essa guerra e voltando a tomar conta das ruas ─, seu lugar de sempre. Vislumbro as artérias da saudosa cidade das acácias fervilhando de gente a passear despreocupadamente, como acontecia nos tempos de minha mocidade.




Ensaio por Levi B. Santos
Guarabira, 17 de Dezembro de 2009

09 janeiro 2009

AS DUAS IMAGENS: A DA TELINHA E A NOSSA




Já duram catorze dias os bombardeios de imagens que adentram os nossos lares, transmitidas pelas nossas telinhas de TV. As cenas de crianças e adultos despedaçados em meio a prédios destruídos nos deixam comovidos e estupefatos. Em um recente artigo, Reinaldo de Azevedo fala que os cadáveres de crianças palestinas mostrados pela mídia televisiva têm um efeito pior do quem as bombas jogadas por Israel, por estimular mais ainda o anti-semitismo em todo o mundo.


A cada dia que se passa, as manchetes dos maiores jornais do país estampam a gradativa soma de mortos no conflito Palestino- Israelense. Diz a Folha de São Paulo de 07/01/2009: “Já são mais de setecentos os mortos do lado Palestino”.


Vejam que paradoxo:
A grande tragédia que está acontecendo no Sudão, não nos causa nenhum transtorno, justamente pela escassez de imagens transmitidas da carnificina naquele recanto do mundo. “Uma imagem vale mais do que mil palavras”. Sendo assim, ficamos de olhos fechados para uma mortandade trezentas vezes maior do que a do Oriente médio, por falta de cobertura. Os senhores governantes muçulmanos da guerra do Sudão, já contam 300 mil mortos entre cristãos e animistas, afora os três milhões de refugiados que se deslocaram para Darfour. Diante dessa gigantesca guerra civil no Sudão, o conflito da palestina parece ser coisa secundária.


Lógico, que não interessa a mídia apresentar as imagens dos nossos paupérrimos irmãos africanos sendo dizimados de forma selvagem. Com certeza, as guerras tribais desse povo não elevam o Ibope. Lá não há jogo político de grandes proporções, nem riquezas econômicas que despertem interesses nos paises ricos. Enfim, a África não é a vitrine do mundo. Afinal, as vidas dos africanos são a nossa nódoa maior, e como tal foi colocada lá no porão do esquecimento, como uma criança faz com um brinquedo velho e imprestável.


Para nós, que estamos de longe, a imagem da vitrine do ódio e da violência que nos é transmitida, parece ser só coisa que se passa lá no Oriente médio. Entretanto devemos abrir os olhos para uma outra imagem: a imagem interna, que está intrínseca no nosso ser, e que nos ameaça através de um mecanismo patológico ─ “o da projeção”. Por mais estranho que pareça, o inimigo surge como personificação de todo o mal, porque todo o mal que sinto em mim se projeta nele. Já que o mal foi transferido para o outro lado, eu me considero a personificação de todo o bem. O resultado é a indignação e o ódio contra o inimigo, e a minha autoglorificação sem crítica. Esse pensamento individual quando se torna uma paixão coletiva, desemboca na destruição mortal das guerras.


Levi Bronzeado dos Santos
Guarabira, 09 de janeiro de 2009

04 janeiro 2009

AS DUAS FACES DA GUERRA






A guerra é uma “moeda” ─, resolvi criar esta metáfora, em meio às notícias de tanto sangue derramado e ainda por derramar lá na faixa de Gaza.


Normalmente não vemos as duas faces da moeda ao mesmo tempo. Uma fica sempre escondida e para baixo. A que está a nossa vista é sempre a face de cima. Tem mais: as duas faces da moeda nunca são iguais (vide a brincadeira de cara ou coroa).


Mas o que tem em comum a guerra com a moeda? ─ perguntarão os senhores.


E entusiasmadamente direi:


Em todas as guerras desde que o mundo é mundo, há sempre duas histórias: a história dos vencedores e a dos vencidos. A narrativa dos louros colhidos pelos guerreiros vencedores vem logo à tona. É a primeira a ser imposta e acolhida pela mídia. A história dos perdedores é como o eco, o qual é ouvido sempre depois do estrondo inicial.


Não foi diferente na história de nosso país. Quando estudante de Ginásio, a minha mente foi como que repetitivamente impregnada pela história contada do ponto de vista dos Portugueses, nossos exploradores, que aqui vieram trazer as “virtudes” da civilização Européia. Na época das minhas primeiras letras eu só via a moeda por esse lado. Muitos anos depois, já formado, é que pude atentar para a existência da outra face da moeda, ao entrar em contato com a narrativa histórica do ponto de vista dos nativos, que tiveram a sua cultura destruída em prol de um suposto progresso moral e social.


Venho assistindo diàriamente há mais de uma semana a carnificina do Oriente Médio transmitida ao vivo via televisão e internet. Em pleno século XXI, olhando pedaços de cadáveres e sangue fluindo como rios, em contraste com a alegria do pipocar das rolhas de champanhe saudando o novo ano, eu me pergunto:


Em que a civilização está nos abrandando?


Se o que se entende por civilização for o jogo de palavras e manchetes inúteis da ONU, dos EUA e dos principais governos da Europa diante de uma guerra, ela desenvolveu no homem por todos esses séculos apenas uma diversidade de sensações... e nada mais. Não seria mais honesto se estes homens se desnudassem de suas máscaras e admitissem que, lá no fundo, encontram certo prazer no derramamento de sangue?


Séculos e séculos de civilização, e o que podemos concluir: o homem tem se tornado um sanguinário pior e mais hediondo. Antes, ele com a consciência tranqüila massacrava aquele que julgava merecer, e achava que isso era um modo de fazer justiça. Hoje, ainda que ele julgue que derramar sangue é uma torpeza, mesmo assim o pratica, e ainda mais do que no passado.


Não resta dúvida que a razão é coisa boa. A razão torna-se um mal quando se faz dela o pior instrumento da irracionalidade, que é chegar ao cúmulo de admitir como solução, matar o seu próximo.


Sabendo que a guerra é a forma de barbárie mais primitiva pelo aparecimento dos elementos mais arcaicos e destrutivos que existe no homem, o despojamento das armas seria o melhor sinal da abdicação desses instintos e desejos incontroláveis.


Ah, se cada guerreiro soubesse que ele também é como uma moeda, tendo também duas faces distintas em seu ser. Ao se situar do lado do bem, querendo exterminar o “mal” na pessoa do seu inimigo, ele sem querer está destruindo a si mesmo. Coitado desse valente soldado, não sabe que está ferindo gravemente a sua face encoberta, ao tirar a vida do seu semelhante.


Ensaio por Levi B. santos
Guarabira, 04 de Janeiro de 2009






02 janeiro 2009

DISCURSOS QUE ALIMENTAM A CULPA E O MEDO




Por vinte séculos a igreja vem pregando a salvação, a graça e o perdão de Deus a uma humanidade assediada pelo medo e pela culpa. Uma das noções que mais prejudicam as pessoas que anseiam pela GRAÇA e que está tão arraigada na mente humana, é a questão de que “tudo tem que ser pago”. Mesmo sabendo que Cristo tomou sobre si nossas culpas, as pessoas não abrem mão de seu passado cheio de faltas e falhas e, nem parecem demonstrar que foram perdoadas, vivendo como se estivessem sendo corroídas por dentro angustiadamente.


As práticas do passado, volta e meia, passam a cercear a liberdade do cristão, como um fantasma que o acusa de não ter sido absolvido de suas atitudes pregressas. Segundo o cristão e psiquiatra suíço Paul Tournier, tudo isso se passa como uma forma de punição que o sofredor administra a si mesmo, e continua repetindo indefinidamente como uma espécie de fatalidade inexorável. Nunca foi o projeto do evangelho, extinguir a nossa espontaneidade para nos transformar em “autômatos”.


Estamos vivendo numa época em que os julgamentos apregoados por certos guias espirituais estão disseminando o medo e alimentando a culpa. E, se não vigiarmos, esse amargo veneno pode até nos esterilizar e nos impedir de produzir os verdadeiros frutos.


Numa época em que tanto se acusa, tanto se amedronta, tanto se castiga, é preciso que nos debrucemos, mais uma vez, para uma reflexão sincera e profunda sobre o emblemático caso da mulher apanhada em adultério, narrado nos evangelhos. A nossa atenção deve estar redobrada para entender que nessa história, o objetivo da acusação dos guardiões da Lei não se baseava em um preconceito social ou moralista. Eles acusavam a mulher pecadora valendo-se de uma citação das Escrituras Sagradas, no intuito de atemorizar Cristo, quanto a uma resposta que pudesse contestar o que preconizava a Lei. Disseram eles:


“E na lei mandou Moisés, que tais mulheres sejam apedrejadas. Tu, pois, o que dizes?”


É nesse momento que o Mestre dos Mestres opera a mais estranha inversão. Ele apaga a culpa que esmagava a mulher e ao mesmo tempo suscita culpa naqueles que supostamente não a experimentavam: “Aquele que dentre vós estiver sem pecado seja o primeiro a lhe condenar”. Em termos psicológicos, esta instigante resposta de Cristo pode ser assim explicada: “Deus apagou a culpa consciente da pecadora, e tornou consciente a culpa reprimida dos seus acusadores”.


Vejamos agora um exemplo de um aparente conselho ou julgamento em que está embutida a semente do medo pelo reforço da culpa:


“A mãe vendo a filha chorar a morte de seu pai, insinua: ‘não chore por seu pai, ele morreu porque você não era boazinha. Agora você vai ter que me obedecer!’”.


Traduzindo as palavras da mãe, veremos que ela inconscientemente semeou culpa, para depois exigir através do medo, uma obediência sem questionamento. Lá no fundo, a mãe exigia a submissão da filha como expiação pelo suposto pecado de ter sido um entrave na vida do pai.


Não é raro vermos em nosso meio, pessoas zelosas em socorro aos doentes e necessitados, como também não é raro vermos os que esmagam os enfermos com testemunhos conflitantes, que dão a entender que o doente não sara, porque lhe falta a fé. E a pessoa que já carrega a culpa por estar doente, agora acrescenta uma outra bem mais grave: a idéia de ter culpa porque não tem fé para ser curado.


Já é tempo de revisarmos conceitos e paradigmas arcaicos, para entender que a finalidade da religião é libertar e não esmagar. É libertar da culpa e não culpar. É tornar o jugo suave e não árduo. É tornar o fardo leve e não pesado


Não é brandindo a espada do medo que iremos salvar os que estão se afogando nas águas turvas, revoltas e profundas desse imenso oceano que são as trevas da ignorância. A palavra ameaçadora, filha do medo, ao invés de ajudar as almas a não naufragarem, antes semeia a intranqüilidade que as leva mais rápido ao fundo do abismo.




Ensaio por Levi B. Santos
Guarabira, 03 de Janeiro de 2009