31 agosto 2010

MINHA VIDA POR UM REINO



Naquela noite o ilustre visitante parecia está revestido de uma luz gloriosa e intensamente ofuscante. O seu rosto era severo e cheio de decisão ante a expressão mansa e indecisa do sacerdote que estava a sua frente.

Subiram os dois ao ponto mais alto da colina onde estava erguida a sua casa, e sentaram à sombra de uma frondosa árvore. Lá de cima podia-se ver toda a cidade banhada da cor de ouro por um sol em declínio no horizonte.

— Confie em mim, e escute atentamente o que vou te propor — disse a figura angelical, ao pé do ouvido do magérrimo sacerdote.

— Estás vendo todos esses ricos palácios, essas ricas chácaras, esses estupendos aviões, arranha-céus e imensas indústrias funcionando a todo vapor? — perguntou o visitante com voz melosa de anjo.

— Sim, estou vendo — respondeu o sacerdote com a alma palpitante de um dia poder possuir tudo aquilo, pois só assim, um dia, iria mostrar ao mundo inteiro ser um homem poderoso, igual a Salomão, a quem ele tanto idolatrava, pela sabedoria e pela ostentação nababesca em que esse rei vivia.

— Tudo isso te darei – Bradou o anjo com voz tonitruante.

O sacerdote apesar de ser considerado pobre, pois não tinha nenhum bem, era portador de uma aversão nata à pobreza — coisa que considerava a maior das maldições. Era rara a noite que não tinha sonhos megalomaníacos em que se via como o seu ídolo Salomão, cercado de belas mulheres em seu harém. Em seus devaneios diários gostava de delirar em sua imaginação com as histórias do Velho Testamento. O Novo Testamento quase não lia, mas quando o anjo de luz dissera para ele “Tudo isso será teu, se prostrado, me adorares”, chegou a lembrar que já lera em algum canto dos Evangelhos sobre um ser poderoso celestial, que fizera uma abençoada proposta, como esta que estava a ouvir. Só não sabia a quem tinha sido endereçada o rico presente.

Disse o homem da lei para si mesmo: “Burro, e pobre de mim, se não confiasse nesse anjo enviado por deus”.

Satã, em trajes divinos dirigiu-se a ele de forma contudente:

— Decida-se! Se você é realmente aquele por quem esperei, deus já tomou a decisão e você não poderá escapar. Decida logo, não quero deixar o mundo dos desesperados à mercê de um ilusório paraíso celestial. O céu tem de ser AQUI E AGORA.

Então, com o espírito altamente regozijado, ele entrega-se de corpo e alma às hostes do luminoso mensageiro angelical, o qual lhe pede que em suas transações divinas, nunca intente pregar que o reino dos céus é de graça.

Tudo tem que ser pago, e com muito sacrifício — disse o visitante angelical, em pose de lenhador quando toma do seu machado para golpear a árvore.

Disse mais o anjo ao seu sumo sacerdote:

— Resgatarás todos os símbolos do Judaísmo em forma de réplicas, para que o meu povo volte a lutar pela posse das riquezas que estão nas mãos dos pagãos, e esqueçam por completo essa história de que o pobre é bem aventurado. Brade todos os dias, que pobreza é maldição. O meu povo tem que ser cabeça e não cauda. O meu povo tem que dominar todos os setores da sociedade. Só assim, poderão ver que tu és o verdadeiro filho do deus altí$$imo. Todas as nações da terra se prostrarão diante do símbolo universal da igreja que entregarei ao teu comando.

Naquele instante um abutre de cabeça vermelha voou sobre o sacerdote, ao mesmo tempo em que ele ouvia uma voz estrondosa dizer: “Grava bem, esse será o símbolo que porás em todas as suntuosas catedrais que o povo irá construir com o suor de seu rosto”.

Já era noite quando o anjo desapareceu, deixando-o ajoelhado de mãos para o alto a sussurrar: “Meu deus! Sou apenas um grão de areia. Sou um grão de areia que fala respira e ama a riqueza. Eu te amo e te chamo de Pai. Não possuo outra arma que não seja o amor pelas almas sedentas de riquezas. Ajude-me Senhor!”

Dali em diante, ele ganhou coragem, astúcia e ousadia, e quase todas as noites via sua alma de pé com os anjos em volta de uma grande instituição financeira. Embalado na orgia da prosperidade, cheio de paz e sem medo, era assim que fechava os olhos e adormecia com a mente iluminada por cifrões em forma de estrelas, ao som de emocionantes hinos.


Por Levi B. Santos

Guarabira, 31 de agosto de 2010

27 agosto 2010

BLOGS — Censura à Vista

Uma proposta que foi apresentada no dia 14 de abril deste ano tem como objetivo cercear a liberdade de expressão no Brasil através de blogs, umas das poucas fontes de informação ainda não controladas.

Se você mantém um blog ou se simplesmente se importa com a sua liberdade de expressão e com a defesa e garantia de liberdades individuais e coletivas informe-se e faça algo a respeito antes que todos tenhamos que testemunhar o nascimento de uma nova e poderosa CENSURA.

A proposta de número 7.131 de autoria do deputado federal Gerson Peres (PP-PA), foi apresentada no dia 14 de abril e pretende instaurar mecanismos de censura sob o pretexto de regulamentação.

Este ofensivo projeto de lei, que não só inclui blogs, mas também fóruns e mecanismos similares de publicação na internet (termos muito convenientemente vagos), inclui basicamente três pontos principais:

  • Comentários de blogs (e semelhantes) terão que ser previamente moderados.
  • Crimes contra honra - calúnia, injúria e difamação - advindos dos comentários de blogs serão de responsabilidade de seus editores, proprietários ou autores. Ações civis poderão ser impetradas contra o dono do blog.
  • Todos os blogs (e semelhantes) terão que ser registrados no registro.br. Este registro inclui informações tais como: Nome Completo, Endereço completo, Bairro, Cidade, Estado, CEP, Telefone (fixo, celular ou os dois), CPF e RG.


Caso o blog ou similar não estiver em conformidade com estas regras terá que pagar uma multa de R$2.000 até R$10.000 reais!!! Por exemplo, o meu blog seria multado, porque meu registro não é no registro.br, e provavelmente nunca será!

O pretexto utilizado é que os blogs e afins, por mais que tenha aumentado as possibilidades de manifestação do pensamento e liberdade de expressão, não são passíveis de responsabilização civíl e penal no caso de ocorrência de crimes contra a honra.

O que vemos aqui é um dupla armadilha. A primeira será de manter a identificação e o registro de cada um de nós blogueiros. Não haverá mais anonimato, todos os blogueiros serão conhecidos, pelo menos para o governo. A segunda é que, quando bem entenderem, poderão cancelar o registro no registro.br. Alguém ousou criticar a nova campanha de vacinação do governo? Simples, cancele seu registro, afinal, onde já se ouviu tamanha calúnia! ;)

Em relação ao comentários anônimos, caso você não tiver habilitado moderação ou não tiver muito cuidado para não deixar passar um comentário calunioso, pessoas mal intencionadas (ou até mesmo empresas ou departamentos do governo que se sintam expostos pelo blog ou fórum) poderão simplesmente escrever algo que possa ser visto como calúnia para que o responsável seja processado de forma civil e penal.

Apesar do foco da lei ser nos comentários anônimos, no meu ver o real objetivo é identificar e registrar todos os blogueiros, além de criar burocracia e esta ameaça constante que com certeza fará com que menos pessoas se aventurem a abrir um blog.

No caso dos fóruns, esta lei irá torná-los totalmente ineficaz. Ou você terá que achar uma forma de identificar os usuários do fórum ou terá que moderar todas as mensagens. Quem irá usar um fórum assim?

Uma outra implicação serão nos blogs corporativos de jornais, ou até matérias de jornais que permitam comentários. Os veículos de mídia terão que se certificar da identidade dos autor dos comentǽrios ou arcar com a responsabilidade por processos. O resultado será que lamentavelmente irão remover quaisquer oportunidades de interação com os usuários. A internet simplesmente virará o que vemos hoje na TV, um total controle da mídia corporativa.

Não apenas seremos todos nós blogueiros identificados, dando oportunidade para retaliações e coações por parte do governo quando postarmos verdades inconvenientes, mas teremos nosso blog rapidamente retirado do ar quando bem entenderem.

De acordo com o site Terra, o projeto de lei (PL-7131/2010) tramita na Câmara em regime de urgência, e aguarda apreciação em plenário, ainda sem data definida.

Leis similares estão sendo criadas nos Estados Unidos, e não me surpreende que o Brasil está querendo ficar a frente em matéria de controle totalitário.

Por favor, passe esta mensagem adiante, ou leia esta lei e dê sua opinião.

Por gentileza repasse este texto, mobilize suas redes e vamos barrar este texto absurdo. A omissão pode trazer sérias consequências.

Clique aqui para mandar sua reclamação para o nosso nobre deputado. Seja educado mas faça valer sua opinião.



Fontes:
Íntegra da proposta
Página de Gerson Peres na Camara
Ferramentas Blog: Projeto de lei quer responsabilizar donos de blogs por comentários "anônimos"
UOL: Projeto de lei quer regularizar os blogs brasileiros
Terra: Projeto de lei: anonimato na web pode penalizar

Postagem original: "A Nova Ordem Mundial" - via "Descanso da Alma"

21 agosto 2010

NÓS — As Eternas Crianças



É só na aparência que a criança se separa da mãe. Na realidade, ela só se separa de uma parte de si mesma que ficou dentro da mãe. A criança cresce sem ter essa lembrança, mas ela não sabe que na fase adulta, as separações e reencontros que vivencia em sua existência são rescaldos da presença e ausência materna, fruto do primeiro desamparo, da primeira solidão, quando “desligou-se” das doçuras do seio materno.

Separado da mãe, o novo ser continua sentimentalmente ligado a uma “mãe” simbólica, que o acompanhará durante toda a sua vida. A comunidade, a confraria, a igreja são figuras representativas da mãe primeva. Sem os eflúvios dessa mãe o indivíduo caminha nu, desamparado e irreconhecível.

“Durante muito tempo, quando éramos crianças, recebíamos o apoio de nossos pais naturais ou substitutos. O comportamento desses co-viventes, desses nossos tutelares forjou-nos e informou-nos de modo indelével em sua caracterização diária, tanto em termos de estrutura como de linguagem” — disse a psicanalista Françoise Dolto, autora do livro “Psicanálise dos Evangelhos”

O sentimento da “falta” ou do “vazio” nada mais é que a nostalgia daquilo que foi tirado do indivíduo nos seus primórdios. Nada do que foi gravado no “disco virgem” do nosso cérebro pode ser deletado. Apesar de não termos lembranças daquele passado longínquo, não podemos negar que os nossos sentimentos, hoje, fluem no sentido de nos reatar a algo que foi desligado de nós. Ora, como podemos dizer que não somos religiosos, se esse instinto de agregar, de nos re-ligar ao “gozo” primitivo que nos é INCONSCIENTE, perdura em nós e não obedece ao nosso comando consciente? Como dizer que somos independentes, se toda nossa ação é fruto das profundezas obscuras dessa área da psique, que está esquecida ou adormecida em nós? Na verdade, antes de pensarmos, algo lá no nosso íntimo é que determina os nossos pensamentos. A grande frase bíblica: “Vós não Me escolhestes, eu escolhi a vós”, aplica-se, magistralmemte, a linguagem do inconsciente, que diz: “não sabemos por que somos o que somos”.

Dizem aqueles pentecostais que já experimentaram o fenômeno da “glossolalia”: “‘falar em línguas estranhas’ é um gozo indescritível”.

Mas, pergunto eu: “Não seriam os balbucios estranhos (a glossolalia), uma experiência DIRETA com o inconsciente? Não poderia por intermédio desse fenômeno, o indivíduo está realizando um retorno daquele antigo “gozo”, em que repetia as fonetizações diante dos pais, quando ficava todo radiante ao pronunciar as primeiras sílabas de forma desajeitada?

Quantas vezes, nós adultos, experimentamos o medo, sem saber de onde ele vem! Quantas coisas, nós adultos dizemos hoje, que nada mais são que reflexos dos tempos maravilhosos de nossa meninice. Às vezes, na ânsia de bloquear os afetos infantis, o que conseguimos é a indiferença ou reações defensivas representadas pela amargura, revolta e ressentimento. Às vezes, na ânsia de não ser criança de novo, reprovamos o outro quando ele se mostra infantilizado, sem saber que ao ridicularizá-lo, estamos rindo de nós mesmos.

A predominância da função dos pais fica ligada à nossa memória, e se exterioriza nas artes, na poesia, na escrita e em tudo que é linguagem. Viver é reconhecer que somos veículos de um emaranhado de afetos, cujos ecos aparecem de uma forma figurada no vasto oceano dos símbolos. Só se consegue TRANSCENDER aos tempos da casta ternura quando não se amordaça o desejo infantil de unir-se, de religar-se para poder caminhar.

.................


................Quando a gente tenta
.....................De toda maneira
......................Dele se guardar
...................SENTIMENTO ilhado
....................Morto, amordaçado
.....................Volta a incomodar.

................(estrofe da canção “Revelação” de Clodô e Clésio – gravada por Fagner)


...............Ensaio por Levi B. Santos

...............Guarabira, 21 de agosto de 2010

17 agosto 2010

QUE BOM O ESPELHO TER SE QUEBRADO!


Ele adorava se por à frente do espelho. Passava horas e horas, embevecido, fitando a sua imagem naquela lâmina refletora presa na parede do seu quarto, logo acima de sua velha escrivaninha. Interessava-se bastante pela a imagem no espelho, por achar que era só sua e de mais ninguém. Ali, ele passava horas e horas em êxtase, absorto, olhando os mínimos detalhes impressos pelo tempo, no seu rosto.

Certo dia, um vento forte arrancou o seu espelho da parede e o despedaçou no chão do seu quarto, privando-o do gozo do auto-enlevo, que o fazia, não sentir a falta de ninguém. Apavorava-lhe, depois desse incidente, a idéia de que ficaria impedido de apreciar a sua bela fisionomia pelo resto da vida. A falta do espelho trouxe-lhe muito desespero e ansiedade. “Como poderei, agora, ver a minha face? Como poderei saber como estou? Como estão as janelas da minha alma que são os meus olhos?” — perguntava de si para si. Deixara-o mais tranqüilo, a notícia de que um primo viria morar com ele e compartilhar do seu quarto.

“Por que andas tão triste?” —, foi a primeira pergunta que o primo lhe fez. A frase que acabara de ouvir, realmente, coincidira com os sentimentos mais profundos de tristeza que estava a experimentar naquele instante. Esse fato constituiu-se na senha milagrosa, a fim de que ele pudesse substituir o espelho quebrado pela opinião do seu primo, a respeito de si. O espelho que falaria sobre si, passaria a ser o outro. Doravante, seu primo, seria o “espelho” a quem ele recorreria para saber como estava o seu ser. A imagem sua refletida no espelho seria, agora, traduzida pelo que o outro iria relatar, observando as janelas da alma, em suas ondulações sentimentais diárias. Ele, que pensava que sua vida após a quebra do espelho não tinha mais razão de ser, agora, sentia a pulsão de vida fluir, pois ser visto pelo outro, passou a ser o motor de sua existência. As esperanças se reacenderam em seu peito, quando ele disse de si para si: “Se o outro me vê, logo existo”.

Com o tempo, pode perceber que o “primo-espelho” estava lhe oferecendo mais atrativos que o velho espelho quebrado, pois, passara a lhe interessar o engrandecimento de sua própria imagem, ao se servir da linguagem do outro para “gozo” próprio.

Depois, foi que veio compreender que ao fazer do outro seu espelho, estava corroborando que o “seu desejo era o desejo do outro”. Na aceitação da linguagem do outro, como se fosse sua, ele estava compensando o narcisismo perdido com a quebra do espelho original.

Agora, ele já mais amadurecido, anotava tudo que vinha a sua cabeça. E não é que já se enfronhava pelo mundo da filosofia! Entre as suas primeiras anotações, estavam essas: “O meu mundo resulta da minha percepção de mundo, e da percepção de mim no mundo pelo outro, e da percepção que tenho do outro” — “Do espelho estilhaçado na infância dos afetos, nasceu a ALTERIDADE” — “Que bom, o espelho ter se quebrado! Se assim não fosse eu nunca elegeria o outro como espelho de mim”.

Na experiência construída no diálogo entre os dois primos, formou-se um campo comum de reciprocidade, em que as abjeções de um, quase sempre arrancavam do outro, pensamentos que eles não sabiam que já existiam dentro de si de forma latente, antes de viverem juntos sob o mesmo teto.

A última frase anotada em seu caderninho de filosofia foi essa: “Cada um deve emprestar seus pensamentos para ampliar a compreensão do outro”.


P.S.: A quebra do espelho primitivo narcisista fez surgir os relacionamentos mútuos entre dois seres humanos. O fato de cada um ser o espelho do outro, constituiu-se no fator “sine qua non” para o aparecimento da INTERSUBJETIVIDADE. A síntese entre “Eu e TU” funda a intersubjetividade, que diz: “sou nomeado por ti quando falas sobre mim, ao mesmo tempo, que sentes ser nomeado por mim quando eu falo de ti”.


Ensaio por Levi B. Santos, baseado na peça “Entre Quatro Paredes” de Jean-Paul Sartre, e no “Estágio do Espelho” de Jacques Lacan.


Guarabira, 17 de agosto de 2010

09 agosto 2010

O Menino, O Pastor e o “Demônio da Libido”

Durante os seus três primeiros anos, antes de se tornar um sujeito, ele viveu fortemente vinculado à mãe, e, o único prazer que conhecia era apreender com os lábios os seios fartos maternos, a fim de sugar a seiva branca adocicada e pegajosa, que sempre teimava em extravasar pelos cantos de sua boca. Mais tarde, ele iria entender que aquela sensação de gozo ficaria como um marco a estruturar todos os seus desejos instintivos pelo resto da vida. No âmbito da religião, futuramente, ele iria sentir uma espécie de eterno retorno do gozo primeiro, ao ser acolhido no seio de uma bondosa e simbólica mãe, chamada Igreja.

O desmame foi a sua primeira experiência desagradável. Depois que os peitos da mãe foram interditados, ele nunca se contentou com o engodo da velha chupeta oferecida em seu lugar. Foi quando sentiu a sua primeira solidão, a sua primeira ruptura, a primeira frustração e seu primeiro vazio.

Disse-lhe a mãe: “Meu filho, você já está grandinho, a ordem de seu pai, é que já é tempo de você parar de mamar”. Desse dia em diante, um sentimento de raiva passou a lhe rondar o coração, pois ele não suportava a ideia de que a sua mãe seria exclusiva do seu genitor. Durante muitas noites era atormentado por sonhos terríveis, em que um lobo mau, com a cara de seu pai, devorava a sua genitália, e isto, deu lugar a um medo permanente de que seu pai fosse castrá-lo, caso pudesse adivinhar os seus sentimentos libidinosos que tinha com relação a mãe, desde que foi impedido de mamar em suas deliciosas tetas. E não é que em algumas noites chegava a sentir uma sensação extremamente gostosa, quando em sonhos sugava vorazmente enormes peitos, lambuzando-se de leite num prazer incontido e inigualável, que a velha “chupeta” jamais o tinha proporcionado.

Um belo dia, o menino já bem crescido, ouviu no colégio uma palestra de um professor de Ciências, na qual ele explicava que aquela sensação do filho para com a mãe, que mais tarde se estenderia para as professoras, era coisa normal de todo menino em passagem para a idade adulta. Foi então, que na sua cabeça, repentinamente, passou um pensamento: “ora, se sou um menino crente, ‘criado na igreja’, vou é tirar as minhas dúvidas com o professor de minha classe, na escola dominical, pois é ele que tem toda autoridade divina para me dizer a verdade”.

Certa noite, na igreja, um reverendo vindo dos EUA, PhD em “Demonologia Sexual” abordou o tema: “Como livrar-se do demônio da libido, em 7 aulas”; e o menino da história, que não me lembro se era Joãozinho ou Pedrinho, para não perder nenhum dos pormenores, sentou-se na primeira fileira da nave do templo. A perplexidade que o tomou com o sermão do pastor, deixou-o paralisado na cadeira por cerca de uma hora e meia. Para surpresa sua, saíu de lá pior do que entrou, pois, não conseguia entender por que ele, tido por todos na igreja como um menino santificado, deixava-se arder pelo demônio de uma paixão ilícita, nas suas noites insones. Nunca tinha ouvido falar que existia esse tal demônio do sexo, mas aquele pastor gospel renomado, segundo a platéia, tinha sido enviado por Deus para especialmente, expulsar os capetas dessa área carnal, que, no dizer dele, desde cedo vinham se infiltrando nas mentes dos meninos e das meninas do rebanho do Senhor.

Foi por esse tempo, que ele começou a orar e jejuar dia sim, dia não, para ver se aquela casta de demônios desaparecia de dentro dele. Dizia “casta”, por que já não estava só apaixonado pela mãe, como também, pela empregada, pela professora, e pela filha da vizinha, entre outras. Perdera bastante peso com os jejuns prolongados; mesmo com a carne fraca, era só pegar do sono após uma ou duas horas de oração ao pé da cama, que logo, logo, os sonhos eróticos trazidos pelos “demônios” o apavoravam. Várias vezes ele se surpreendeu gritando: “está amarrado em nome de Jesus!”.

Esse menino, agora adulto, continua freqüentando esporadicamente a igreja, mas, durante a maior parte do seu tempo, demonstrando que a ambivalência é coisa intrínseca do sujeito e não pode ser exorcizada, se desnuda por completo, mostrando ao mundo virtual cibernético o que está por trás dessa palhaçada infernal de “demônios”, que maneja a máquina da repressão dos instintos humanos em nome de deus.

Ele diz que amadureceu, mas, o fato é que ainda não consegue se desvincular da “imago materna”, pois, quando a nostalgia dos seios fartos em que se amamentou lhe assoma com muita veemência, ele pega sua bíblia surrada junto com a harpa cristã e corre rápido para a igreja. É lá, que o Pedrinho ou Joãozinho da história apazigua seus deuses e demônios interiores. Lá, os seus demônios da lascívia ficam adormecidos, até que o culto termine e ele desperte de novo para a rotina de sua realidade existencial.


P.S.: O ensaio postado, bem que poderia ter este título: “Uma Doce Nostalgia”



Guarabira, 09 de Agosto de 2010

06 agosto 2010

“Ensaios & Prosas” Faz Quatro Anos


Foi no dia 06 de agosto de 2006, que resolvi adentrar no mundo da internet. Substituí o papel por uma tela de computador, e a minha caneta troquei por um teclado. De lá para cá, já se vão quatro anos que vivo engolfando a minha alma nesse recanto cibernético. É de frente a uma telinha luminosa que eu me exercito na arte de escrever como também na arte de ouvir, e, enquanto passam as páginas cinzentas dos dias e as páginas negras da noite, vou interagindo com uma grande rede de amigos virtuais, com os quais me identifiquei, talvez por terem histórias muito parecidas com a minha.

Talvez, quem sabe, esse desejo impulsivo de Ler — Escrever — Ler — Escrever... que me anima, seja um reflexo dos meus treze e quinze anos de idade, quando encolhido sob as tábuas de um banco de minha velha mãe, comercializava roupas e tecidos na Grande feira de Sábado em Alagoa Grande (PB). Era nos intervalos entre as vendas que eu me escondia a fim de matar a fome de leitura.

Lembro-me daquela época como se fosse hoje. E não é que pareço sentir o júbilo incomum que tomava conta de mim, quando esparramado no chão de cimento e pedra lia com avidez incomum, velhos jornais e revistas semanais, como O Cruzeiro e Manchete, que eram usadas como papeis de embrulhos para as roupas comercializadas. Recordo que recortava secretamente, com todo esmero, os artigos de Rachel de Queiroz, de Mário de Moraes e de David Nasser, para guardá-los em casa a sete chaves, no fundo de uma mala, sem saber que naquele solitário e nobre ato, estava inaugurando a minha primeira e rústica biblioteca. Passam na minha mente, agora, as grandes coleções de ensaios e crônicas do cotidiano daquela época, que se perderam, decerto, nas arrumações de casa efetuadas de tempos em tempos. Por achar que todo aquele monte de papeis velhos e encardidos de nada valia, alguém, provavelmente, deve ter jogado fora todo o meu acervo literário dos tempos de minhas primeiras incursões no mundo fantástico das letras.

Hoje, embora sentindo o peso da idade, posso assegurar que não desvaneceu a chama que me queimava o peito nos tempos de outrora. Nesse intercâmbio virtual intermediado pela PALAVRA, tenho feito muitas amizades. São inúmeros os amigos com quem troquei idéias e confidências, a maior parte deles está no quadro de seguidores no topo do blog. Entre os seguidores amigos, destaco Leonardo Gonçalves, Danilo Fernandes e Luis Paulo que foram os primeiros da blogosfera a me incentivarem, republicando com coragem e ousadia diversos ensaios “heréticos” de minha autoria em seus blogs de Apologética.

A todos que nesses quatro anos, interagiram aqui no “Ensaios & Prosas”, especialmente os amigos do peito da "Confraria dos Pensadores Fora da Gaiola"[C.P.F.G.], da qual faço parte, dedico-lhes a minha primeira postagem publicada em 6 de agosto de 2006.


............. CONTOS ESCONDIDOS

..........

.........Ah! Se realmente soubesses...

.......A minha alma empolgada

.......Embebida nos teus contos.

..........Seria aquilo inveja?

.......Versos enfim escondidos

........Por não saírem de mim?



........Se foi inveja escondida,

......Hoje o que agora escrevo

........É fruto de tua escrita

.....Pois ela encontrou guarida

.......Fez ninho, gerou, nasceu

........No coração deste velho

........


........Me deste total apoio

....Ao leres meus pensamentos,

......Que p’ra contê-los teria

.....Que negar a própria fonte,

.Que por ser tua e também minha

.......Quis jorrar esta poesia.


Guarabira, 06 de agosto de 2010

Agora, ouça o editor do blog no seu velho piano alemão, tocando "Feira de mangaio" do saudoso sanfoneiro paraibano Sivuca.