‘Odi profanum vulgus et arceo’ ─ ‘Os que odeio conservo longe de mim’, cantou Horácio alguns anos antes do Nascimento de Jesus. Aristóteles também confirmou esse sentimento, quando falava do homem ideal: ‘Ele é franco porque ama o DESDÉM’.
Ontem, aqui nesse recanto, fiz menção a duas CAVERNAS. Na última Caverna, no sentido simbólico/metafórico, me reportei a que deu início a era Cristã que, continua a emanar seus eflúvios ainda hoje na contemporaneidade.
Tomando emprestado de G. K. Chesterton, assim escrevi, ontem:
“o sentimento de algo desprezado e de algo temido. A CAVERNA, sob um aspecto, é apenas um buraco ou um canto para o qual são varridos como lixo os excluídos; no entanto, sob outro aspecto, é um esconderijo de algo precioso que os TIRANOS estão procurando como tesouro”. Há nessa Divindade enterrada uma ideia de ninar o mundo; de sacudir as torres e os palácios desde suas bases; exatamente como HERODES, o grande REI, sentiu aquele terremoto sob seus pés e oscilou com seu OSCILANTE PALÁCIO”.
O pensamento assassino/destruidor de Herodes Antipas se espalhou pelo Sinédrio, a ponto de dizerem, à boca pequena, a respeito de Cristo: “Se O deixarmos seguir livre, todos acreditarão Nele, e então virão os romanos e tomarão nossos CARGOS”. (João 11:48).
A Pandemia infernal que já dura mais de um ano, e agora se torna mais aguda, trouxe à tona a BANALIZAÇÃO das MORTES, como remédio ácido/amargo para acalmar a TURBA.
Impossível, deixar de lado o Calvário de Cristo sem citar o desmantelamento do grupo composto pelos seus 12 discípulos. Como ocultar através de manobras politiqueiras da época o não mencionamento do sanguinário Herodes Antipas, mais conhecido através dos relatos do Novo Testamento, por seu papel nos eventos que levaram a previamente articulada defenestração e morte de João Batista e Jesus de Nazaré?
Mas isso não é nenhuma novidade. Como ocorreu no longínquo passado e ainda ocorre em todos governos de cunho autoritário, o ENREDO construído para maquiar banalizar as mortes e os mortos é o mesmo do tempo de Cristo, sem tirar nem por.
Nesta Páscoa, há os que pelejam incessantemente a fim de tornar menos visível e mais palatina para a maioria do povo, a maior tragédia sanitária da história brasileira; tragédia que, pasmem, virou uma macabra estatística. A escalada sinistra deu conta, em apenas 24 horas, da passagem de 3.600 vítimas fatais para 4.000. Ah, mas o número absoluto de mortos não representa nada, são os números relativos que interessam! ─ bradam os ‘otimistas estatísticos’. Por outro lado, entendo que a escolha, em parte inconsciente, de dourar um pouco a realidade dura e dolorosa frente a uma verdade desconfortável, às vezes requer, aqui ou acolá, esse tipo de recurso defensivo em prol de nossa estabilidade psíquica.
O sábio Salomão, com sua célebre afirmação ─ “Nada há de novo debaixo do Sol!” ─ já sinalizava o ENREDO construído para banalizar as calamidades, as guerras e os mortos de seu tempo, o qual, iria ser o mesmo do tempo de Cristo, e dos dias atuais.
Não querendo me tornar cansativo, sirvo-me, novamente, de G. K. Chesterton, para encerrar o breve ensaio dessa Quinta-Feira da Páscoa:
“A história de Cristo (e sua páscoa) é a história de uma JORNADA, quase na forma de uma marcha militar. É uma história que começa no PARAÍSO da Galileia, uma terra pastoril e pacífica que realmente sugere de algum modo o ÉDEN - e vai aos poucos galgando o interior que se eleva até as montanhas mais próximas das nuvens tormentosas e das estrelas, como se fosse uma MONTANHA do PURGATÓRIO”.
Levi B. Santos
Guarabira, 1º de Abril de 2021
Um comentário:
Caro Levi,
Essa é sem dúvida uma tragédia histórica que o Brasil e o mundo vivem e estamos mostrando o quanto falta ao nosso povo (e às autoridades) ética e respeito pela vida. Na verdade, a vida no Brasil nunca foi valorizada. Todos os ciclos econômicos da colonização até à República foram manchados de muito sangue de cativos e o trabalhador de hoje ainda é visto como peça de uma engrenagem. A maior prova disso é o fato dos transportes estarem andando super lotados, tornando-se um dos maiores focos de contaminação nas cidades. Falta um auxílio emergencial digno que incentive o brasileiro a permanecer em casa sendo que os governantes não incentivam isso. Uns se declaram contra o afastamento social e muitos outros somente fingem combater a pandemia.
Ainda que a banalização da morte possa ser uma defesa psicológica inconsciente para não enlouquecermos no meio dessa tragédia sem fim, o pior de tudo é o uso intencional para justificar a necessidade das pessoas se exporem num modelo obsoleto de trabalho.
Em todo caso, a pandemia é uma páscoa, uma passagem que a humanidade precisa trilhar em sua caminhada coletiva em que precisaremos nos adaptar, criar meios de trabalhar e de nos comunicarmos, novas maneiras de convivência e, inclusive de cultuar o sagrado entre os seguidores da mesma crença. Logo, trata-se de um deserto que atravessamos e que, mesmo dolorosamente, transformará a humanidade de maneira inevitável, o que não significa necessariamente a elevação ético-espiritual de todos.
Forte abraço e feliz Páscoa extensivo aos seus.
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