Estamos numa época em que escabrosos escândalos estão a macular de forma tremendamente vergonhosa as nossas instituições políticas. Em pleno século XXI, podemos concluir que nada mudou debaixo do sol, parafraseando o Rei bíblico Salomão. Um acontecimento irrefutável, de mais de dois mil anos, se torna necessário vir à tona em momentos cruciais como o que estamos a vivenciar. Assistimos, cabisbaixos, a desmoralização da casa que deveria ser a mais sólida trincheira em defesa da ética e da moral.
Marco Túlio Cícero (101 A .C.), o maior dos oradores políticos romanos, fez um discurso memorável contra “Catilina” (personagem do Senado Romano que prevaricava contra a Lei). Esse ignóbil senador da república, através de manobras clandestinas no momento em que as coisas em Roma andavam confusas, tramava de maneira infame contra as leis de sua própria República.
Faltavam sessenta e dois anos, para o início da Era Cristã, quando Cícero fez o emblemático discurso, que nos impressiona pelo que tem de comum com a nossa história política atual.
Eis alguns trechos do brilhante discurso proferido por aquele corajoso senador romano:
“Oh deuses imortais! Em que País do mundo estamos nós, afinal? Que governo é o nosso? Em que cidade vivemos nós? Estão aqui dentro do nosso número, venerandos senadores, neste Conselho, mais sagrado e mais respeitável da face da terra, aqueles que tramam a morte de todos nós, aqueles que trazem no pensamento a destruição desta cidade, e até a do mundo inteiro. É a estes, que eu como Cônsul tenho a minha frente, e lhes peço conselho acerca dos interesses do Estado, a eles que deveriam ser passado o fio da espada, é que eu nem com a palavra dirijo ainda”.
“E agora, que vida é esta que levas Catilina? Desejo neste momento falar-te de modo que se veja, que não sou movido pelo rancor que eu te deveria ter, mas por uma compaixão que tu em nada mereces. Entraste a pouco neste senado. Quem, dentre esta tão vasta assembléia, dentre todos os teus amigos e parentes, te saúda? Se isto, desde que há memória dos homens, a ninguém aconteceu, ainda esperas que te insultem com palavras, quando te encontras esmagado pela pesadíssima condenação do silêncio”?
Hoje, quando um mar putrefato de sórdidos procedimentos invade com tamanha força as nossas instituições políticas, para nossa reflexão, faz-se necessário relembrar aqui, trechos de um discurso proferido no Senado Federal, em 1914, por aquele que foi um dos maiores oradores de nossa história, “Rui Barbosa”:
“A falta de justiça, Srs. Senadores, é o grande mal de nossa terra, o mal dos males, a origem de todas as nossas infelicidades, a fonte de todo o nosso descrédito é a miséria suprema desta pobre nação”.
“A injustiça, Senhores, desanima o trabalho, a honestidade, o bem, cresta em flor o espírito dos moços, semeia no coração das gerações que vem nascendo a semente da podridão, habitua os homens a não acreditar senão na estrela, na fortuna, no acaso, na loteria da sorte, promove a desonestidade, promove a venalidade, promove a relaxação, insufla a cortesania, a baixeza, sob todas as suas formas”.
“De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver se agigantarem os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto.”
Este discurso, hoje, bem que poderia estar afixado com letras garrafais em uma enorme placa na entrada do nosso Congresso Nacional.
Um comentário:
Mais de dois mil anos se passaram do Senado Romano à nossa República, e "tudo continua como dantes no quartel de Abranches".
Foi genial a colocação deste discurso de Cícero(62 A.C.)no seu ensaio. Dá a impressão que foi proferido hoje.
PARABÉNS.
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