24 dezembro 2007

PAI E FILHO DÃO UMA "ESPIADA" NUM NATAL DO 3º MILÊNIO

.................. O Natal na Praia de Guarujá- São Paulo (2007)




O Supremo Oleiro criador do mundo, juntamente com seu Filho, resolve dar uma olhadela no mundo do terceiro milênio. Escolhe uma cidade ao acaso para observar como estariam vivendo os homens, criaturas suas, dois mil anos depois que Ele decidira enviar o seu único Filho para tirá-los das trevas da ignorância. Deu São Paulo no sorteio que fizeram. Pai e Filho saíram dos seus aposentos sagrados para abrir uma das janelas do céu, aquela que dava para as bandas da América do Sul.

O dia 24 de Dezembro de 2007 iniciara com uma manhã de sol escaldante. O Pai pede a seu Filho que comece a sua minuciosa observação pela periferia dessa grande cidade (a mais populosa do continente sul-americano), justamente na hora do grande “rush”, em que intermináveis filas de automóveis engarrafados nas diversas estradas, se movem à passos de tartaruga em direção as poucas praias já entupidas de gente, do litoral paulista.

O Pai nota o cenho franzido do filho, um sinal de desaprovação pelo que estava presenciando, e pergunta:

─ Diz-me a razão de tua brusca mudança de semblante, meu Filho?

─ Meu Pai, vou lhe dizer uma coisa: nem durante a minha estada na terra eu vi coisa igual. Vejo pais desesperados, ao volante dos seus carros. Muitos com as faces avermelhadas e molhadas de suor. Filhos chorando, agoniados com o calor infernal, as mãos a tapar os ouvidos para amenizar a barulheira das buzinas a todo volume. Ali mais na frente, posso ver um desastre horrível com muito feridos e mortos. Um pouco mais adiante, vejo quatro casais sendo assaltados; um ao reagir, foi morto na hora, em frente a três filhos menores de idade. Meu Pai, isso é um caos. Observo que as outras pessoas que vêm logo atrás em seus carros, parecem não se incomodar com a gravidade dos acidentes, passando pelas vítimas sem fazer alarde como se a violência presenciada diuturnamente tivesse arrancado de si a sensibilidade. Agora eu lhe pergunto meu querido Pai: Por que tanta correria e agonia, como se o mundo fosse acabar de uma hora para outra?

─ Ah Meu filho, toda esta confusão e correria louca é para comemorar o teu Natal, o teu aniversário.

─ Quer dizer meu Pai, que eu sou a causa de todo este caos? ─ pergunta resignadamente o filho.

─ Não! De maneira alguma! Logo que saíste da terra, o Diabo se pôs a distorcer a nossa mensagem de redenção para o homem. A tua pungente trajetória na terra, onde não tivesse nem onde repousar a cabeça, deu lugar a este patético festival de deleites que menosprezam o espírito.

─ Esse tal de aniversário, eu não conheço. Desde que eu me entendi de gente, não me lembro de ter tomado parte em uma comemoração dessa natureza. Engraçado! Estou vendo agora, um grande templo muito bem ornamentado, com árvores reluzentes, muita gente bem vestida, uma estrebaria eletrônica com uma bela criança em um luxuoso berço, animais artificiais se mexendo automaticamente. Tudo muito belo e arrebatador. Tudo diferente do que o meu pai e minha mãe me contaram, quando eu tinha cinco anos de idade. Eles me falaram que eu tinha nascido em uma paupérrima cocheira, em meio às fezes de animais. Lembro-me do que meu pai José falou, que não havia nem água potável por perto para fazer a higiene minha e a de minha mãe. Lavaram-me com a água barrenta de um velho e sujo poço que os animais usavam para matar a sede. Algumas pessoas que passavam pela estrebaria na ocasião do parto, disse-me minha mãe, não deram a mínima para o que estava ocorrendo.

─ O que vês agora? ─ pergunta o Pai para o seu Filho debruçado sobre o parapeito da janela celeste, que se abrira.

─Vejo um imenso prédio(um shopping) de muitos andares, superlotado de gente carregando embrulhos de variados volumes, envolvidos em papeis de sedas multicoloridas. Vejo também muitos velhinhos de barbas longas e muito brancas, trajando roupas vermelhas com gorros em suas cabeças. Cercados de crianças e adultos, eles distribuem objetos, ao som de violinos e sinos. Quem são estes meu Pai?

─Desde os tempos de Moisés, meu filho, eu luto para não criarem uma imagem de mim, pois toda imagem será sempre uma idéia falsa do que represento para a humanidade. Duzentos e oitenta anos após a tua morte, filho, um tal de São Nicolau que ajudava os pobres deixando saquinhos de moedas nas chaminés das casas, tomou o meu lugar. No teu Natal filho, tudo agora gira em torno desse homem, de vestes escarlates e de saco vermelho em punho. É este “Papai Noel”, que inteligentemente usado pela “mídia comercial”, engana pais incautos que deixam os seus filhos acreditar na maior mentira já exposta na data magna da cristandade. Aliás, a data do teu nascimento não foi 25 de Dezembro. Neste dia se celebrava a maior festa pagã do mundo greco-romano. Resolveram fundir o profano e o sagrado em uma só data para satisfazer interesses espúrios do Império.

─ Peço que continues descrevendo o que mais contemplas nessa metrópole, que é uma das maiores do mundo em número de “cristãos” ─ insiste o Pai ante o Filho sobressaltado.

─Estou vendo agora um gigantesco prédio com uma grande placa no alto: “INCOR”. Chegam a todo o momento, carros de cor branca com sirenes ligadas. Nesses automóveis vejo pessoas estiradas em macas, sendo apressadamente levadas por “homens de branco”, para dentro do prédio.

─Ah, deixe eu lhe explicar ─ diz o Pai interrompendo a narração do Filho. Esses carros brancos de sirenes estridentes chamam-se ambulâncias, e os homens de branco a carregar macas, são médicos e enfermeiros levando os enfermos da “Síndrome Natalina” para o que eles chamam de Hospital. Normalmente são atendidos neste lugar cerca de dez a quinze enfartados por dia. Só que no dia do teu Natal, a média é de oitenta a cem atendimentos desse tipo de urgência. Tudo isso é resultado da falta de paz, aliada aos prazeres praticados em excesso, que estouram veias e arrebentam corações.

O ar do Filho era de intensa tristeza ao ver tanta deturpação da mensagem de Boas Novas que Ele ensinara com tanto amor, acolhendo em sua árdua missão todos como irmãos, da mesma forma que uma galinha junta os seus pintos. Não fora para aquilo que estava agora a ver, que ele doara todos os seus anos na Terra.

A noite caía sobre a grande metrópole quando Pai e Filho decepcionados decidiram não assistir as cenas das ceias de Natal nas residências. Fecharam então a janela que dava para o Brasil, e se recolheram aos seus aposentos celestes. Ficaram a olhar um para o outro, por longo tempo, numa silente linguagem. Em dado momento, o Pai coloca a sua mão direita sobre o ombro esquerdo do Filho, e fala impetuosamente:

─ O nosso projeto continua de pé, meu Filho!. A esperança de que a verdadeira LUZ afugente de vez as trevas da ignorância não morrerá nunca.

Lá embaixo, na grande cidade, o borbulhar do mar de luzes e cores cintilantes a brilhar na noite fria, executava um espetáculo inesquecível para os olhos. Dentro das casas, após a tradicional comemoração do Natal, as almas se recolhiam silenciosas ao vazio existencial de sempre.


Ensaio por: Levi B. Santos

Guarabira, 25 de Dezembro de 2007

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Um comentário:

Unknown disse...

Mudaram a verdade de Deus em mentira e honraram e serviram mais a criatura do que o criador,por isso estão colhendo como fruto essa SOLIDÃO e esse VAZIO sem fim...É isso aí!!!