03 novembro 2008

LÍRIOS PARA MORTOS E VIVOS



Dia de Finados. A nossa principal praça amanhece multicolorida de flores, contrastando com vestes de cores variadas de pessoas que se espremem, a fim de adquirir ramalhetes destinados a ornamentar os túmulos dos entes queridos que hoje vivem em um outro mundo totalmente desconhecido de nós, os ainda vivos.

As flores que eu vejo nesse dia são flores mortas, de pétalas com pálido brilho, cujo viço artificial é mantido por gotículas de água jogadas de instante a instante por ávidos vendedores. Flores que foram arrancadas cuidadosamente de seus caules para serem trocadas por moedas, que por sua vez serão transformadas no pão farto do mês de Novembro, na mesa dos ambulantes desse mercado espetaculoso de variadas cores e suaves perfumes.

Não sou adepto das flores ornamentando ritual de festa fúnebre. Acho que as flores nasceram para serem apreciadas no seu próprio habitat, que são os campos. Lá, elas são mais vivas, são mais belas, mais misteriosas, mais inspiradoras. O Mestre dos Mestres apreciava mais os lírios, não atados com fitas, nem enfeitando túmulos. Observando atentamente os lírios no campo, Ele foi inspirado a construir uma metáfora, que passados dois mil anos, ainda repercute entre nós, de maneira marcante. Metáfora esta, que serviu de tema a Érico Veríssimo no seu inesquecível livro, “Olhai os Lírios do Campo”.

Dia de Finados é um dia triste, mesmo tendo monte de lírios e muita gente ao redor. Na minha mente um contraste fala mais alto, pois vejo na imaginação, Cristo,tendo ao seu lado uma multidão, e logo ali a sua frente uma plantação de lírios até se perder de vista, no horizonte. Vejo-O parando e observando meticulosamente os lírios flutuantes ante o sopro de uma brisa suave. Vejo-O observando também a multidão preocupada com o que havia de vestir. Vejo-O respirando fundo e falando poeticamente:
“Aprendei com os lírios do campo, como crescem, não trabalham e nem fiam. E, no entanto, eu vos asseguro que nem Salomão, em toda sua glória, se vestiu como um deles”.

Dei uma última olhada na praça de minha cidade e saí para minha casa, deixando atrás uma multidão bem vestida, tendo às mãos flores em sua maioria brancas, que bem poderiam ser, quem sabe, “lírios do campo”.
Mais tarde, tive a impressão de ver muitas pessoas cabisbaixas balbuciando preces inintelegíveis, enquanto outras impassíveis e com o olhar vazio, contentavam-se em observar ramos de lírios murchos deitados sobre uma lápide fria.



Ensaio por: Levi B. Santos
Guarabira, 03 de Novembro de 2008

3 comentários:

Ane Amaral disse...

Caro Irmão te agradeço pela tua visita ao meu blog e parabéns pelo teu trabalho, que Deus te abençoe. Ane.

Prof. Francivaldo Jacinto disse...

Caro Levi

Parabéns por esse marvilhoso texto.

Um abraço!

Prof. Francivaldo Jacinto disse...

*maravilhoso