18 agosto 2009

DINHEIRO NA MÃO É VENDAVAL




.........Naquela noite, o show de baixarias entre as duas emissoras de maior audiência desse meu sofrido e fantasioso país, deixou-me definitivamente marcado por uma decepção profunda e irreparável. Foi tremenda a tristeza que invadiu a minha alma, quando assisti ao espetáculo degradante sob o comando do Canal da Televisão que um dia imaginei que pudessse existir algo de transcendente, algo de Divino em que me agarrar para não cair nas garras do monstro midiático que manda e desmanda, ditando regras de um viver fútil, denominado “padrão global de qualidade”.

Tentei dormir nessa noite, e o sono por fim chegou, mas de um modo superficial e cheio de interrupções. Para não dizer que a noite fora de toda má, sonhei.

No sonho, fui transportado para a arena de um teatro de terceira categoria, a fim de assistir ao drama “O Vendedor de Amuletos”, como anunciava um cartaz em letras garrafais. O teatro iria fechar as suas portas, e aquela seria a última peça a ser apresentada em seu recinto. Estava sentado numa poltrona, quando repentinamente, ouvi um enorme estrondo; concomitantemente, vi bem a minha frente, um poderoso tufão arrancar do chão enormes catedrais, elevando-as no ar, e delas saíndo uma quantidade enorme de dólares, que parecia mais uma chuva de papeis picados, flutuando no ar. Depois vi aparecer um esguio senhor, meio calvo e corcunda, por entre as ruínas dos templos que o poderoso vendaval destruíra, Notei que ele tinha um ar pesadão de quem acabara de sofrer uma grande decepção. Trajava uma longa túnica vermelha acetinada, semelhante às vestes dos sacerdotes de antigamente, e carregava em suas mãos um punhado de notas de dólares salpicadas de lama; pude inclusive perceber o odor pútrido que exalava do dinheiro. O que me fez ficar intrigado no sonho foi o fato do solitário senhor, depois de toda aquela catástrofe, ainda encontrar forças para segurar um monte de notas de dólares enlameadas, como a temer que ali por perto, estivesse alguém à sua espreita para roubá-lo. Observei bem quando o homem solitário deu três passos em minha direção, e falou: “Pode me olhar nos olhos, sem medo!”. E o que vi? Vi apenas um par de olhos esmaecidos, sem vida, como que refletindo uma grande e interna solidão.

Despertei afinal, e a zonzeira que ainda me aturdia, não me deixou raciocinar para entender que as minhas lucubrações noturnas se relacionavam com os últimos acontecimentos, concernentes à lavagem de roupa suja entre duas grandes redes de Televisão.

Teria sido aquilo um sonho mesmo, ou teria sido o eco de minha indignação que me fez imaginar dormindo, tudo o que o coração desejava para por fim a uma pervertida e melancólica epidemia neo-pentencostal que nos últimos anos vem assolando o país de ponta a ponta?

Por um instante, cheguei a pensar que os elementos do dramático sonho que eu tivera naquela aflita noite, poderiam simbolizar a esperança que eu tanto almejava de que o comércio das coisas sagradas tivesse um dia o seu fim.

Quando o dia amanheceu, veio a minha lembrança os fragmentos de um velho samba de Paulinho da Viola, que fala sobre dinheiro e vendaval. Corri rápido para a internet, a fim de saber se a letra do samba poderia ter alguma relação com o meu sonho. Surpreendi-me ao constatar que a composição musical, realmente, tinha tudo a ver com o recente escândalo resultante da mistura explosiva entre fé e dinheiro, desde que se fizesse uma simples modificação na letra do samba, trocando a palavra "sonhador" por "pregador".

Confira caro(a) leitor(a), o belo e emblemático samba do Paulinho, que o meu sonho foi buscar lá nos cafundós do meu inconsciente, e que tem por título: "Pecado Capital"



Ensaio-ficção por Levi B. Santos
Guarabira, 18 de agosto de 2009

3 comentários:

Prof. Francivaldo Jacinto disse...

Caríssimo Levi Bronzeado, a paz do Senhor.

Obrigado pela autorização.

Seu blog a cada dia fica mais espetacular.

Quem gosta do moderno com qualidade, seu blog é a melhor indicação.

Forte abraço.

Francivaldo Jacinto

guiomar barba disse...

Sem comentários...
Publiquei no noso blog "Dinheiro na Mão é Vendaval".

Meu abraço de gratidão.

Anônimo disse...

Grande Levi, e ainda linkasses na época o mesmo vídeo que eu postei agora. Parabéns pelo ensaio. Um abraço.