Homens vindos do Oriente encontraram-se numa planície para o projeto de edificação de uma torre que alcançasse os céus. Tratar-se-ia de uma metáfora da condição humana o motivo de construírem com tijolos e não com pedras, representando a precariedade dos meios, e a própria transitoriedade da vida humana?
Eles jamais imaginariam que a construção lenta, se arrastando por centenas de anos tinha maior significado que o próprio edifício.
Para esse grandioso empreendimento foi necessário inventar as matemáticas, a engenharia de solo, criar uma Universidade que formasse especialistas em fundações e outras ciências de apoio como, Direito, Administração, Sociologia e Psicologia, pois era imensa a quantidade de funcionários e familiares envolvidos no projeto.
A certa altura, ocorreu-lhes uma idéia tremendamente assustadora. Imaginaram que houvessem sido criados por um ser supremo. De repente, passou por suas cabeças o pensamento de que construir uma torre até os céus seria o desejo de regressar ao seio do Criador, ou de imitá-Lo. Pararam a construção quando um Teólogo apareceu anunciando-lhes que o Criador tinha o dom de transformar cada palavra em coisa, e isto os aturdiu.
Após uma Assembleia Geral, chegaram à conclusão de que eram escravos das palavras, e que para fugir desse imbróglio precisavam de inúmeras línguas. “Assim sendo, nossa torre será múltipla, equívoca e sempre diversa de si mesma; a palavra permanece, mas seu sentido sofrerá metamorfoses” ─ disseram eles.
Criaram idiomas, tradutores, dicionários, especialistas em literatura. Com o tempo diversos acampamentos periféricos foram crescendo e se transformando em cidades em torno dos alicerces da torre, que depois cresceram e se transformaram em Nações distintas, cada uma com sua língua e seu deus particular. Surgiram leis e relações internacionais para evitar as guerras idealistas entre as nações.
Muitas lendas, profecias e interpretações ardilosas foram se acumulando com o passar dos séculos. Um profeta defendia que o projeto da torre havia se cumprido, apesar de tudo até ali não passar de um monte de livros escritos. “Por força da multiplicação das línguas, os livros empilhados dariam para chegar aos céus” ─ argumentavam alguns.
Outra profecia mais incisiva garantia que a construção de Babel nunca seria concluída, porque isso implicaria no futuro uma destruição da suposta torre por golpes desferidos por um punho gigantesco.
Três mil anos se passaram desde o início desse monstruoso e imaginário projeto lá no Oriente, mas há quem diga, reinterpretando antropologicamente o mito, que a torre já existe, sendo tão somente a própria cultura humana, tendo a civilização como subproduto de uma obra gigantesca que foi esquecida ou que continua a se realizar de forma inaparente.
A torre de Babel, por conseguinte, talvez esteja por todas as partes de nosso indeciso mundo. Construí-la é tão absurdo quanto desistir da idéia.
A palavra inscrita no coração dos homens converteu-se em várias línguas, e se inscreveu no corpo de cada um como sua Sagrada Escritura.
Enquanto não se descobrir o sistema último de tradução de todos os livros reunidos numa torre denominada “Escritura Definitiva”, vamos recheando de palavras o nosso vazio, produzindo continuamente uma destradução do projeto antigo que nos foi legado, sabendo, de antemão, que o final será como uma fábula cuja moral ficou em aberto.
Ensaio por Levi B. Santos
Guarabira, 13 de junho de 2009
Eles jamais imaginariam que a construção lenta, se arrastando por centenas de anos tinha maior significado que o próprio edifício.
Para esse grandioso empreendimento foi necessário inventar as matemáticas, a engenharia de solo, criar uma Universidade que formasse especialistas em fundações e outras ciências de apoio como, Direito, Administração, Sociologia e Psicologia, pois era imensa a quantidade de funcionários e familiares envolvidos no projeto.
A certa altura, ocorreu-lhes uma idéia tremendamente assustadora. Imaginaram que houvessem sido criados por um ser supremo. De repente, passou por suas cabeças o pensamento de que construir uma torre até os céus seria o desejo de regressar ao seio do Criador, ou de imitá-Lo. Pararam a construção quando um Teólogo apareceu anunciando-lhes que o Criador tinha o dom de transformar cada palavra em coisa, e isto os aturdiu.
Após uma Assembleia Geral, chegaram à conclusão de que eram escravos das palavras, e que para fugir desse imbróglio precisavam de inúmeras línguas. “Assim sendo, nossa torre será múltipla, equívoca e sempre diversa de si mesma; a palavra permanece, mas seu sentido sofrerá metamorfoses” ─ disseram eles.
Criaram idiomas, tradutores, dicionários, especialistas em literatura. Com o tempo diversos acampamentos periféricos foram crescendo e se transformando em cidades em torno dos alicerces da torre, que depois cresceram e se transformaram em Nações distintas, cada uma com sua língua e seu deus particular. Surgiram leis e relações internacionais para evitar as guerras idealistas entre as nações.
Muitas lendas, profecias e interpretações ardilosas foram se acumulando com o passar dos séculos. Um profeta defendia que o projeto da torre havia se cumprido, apesar de tudo até ali não passar de um monte de livros escritos. “Por força da multiplicação das línguas, os livros empilhados dariam para chegar aos céus” ─ argumentavam alguns.
Outra profecia mais incisiva garantia que a construção de Babel nunca seria concluída, porque isso implicaria no futuro uma destruição da suposta torre por golpes desferidos por um punho gigantesco.
Três mil anos se passaram desde o início desse monstruoso e imaginário projeto lá no Oriente, mas há quem diga, reinterpretando antropologicamente o mito, que a torre já existe, sendo tão somente a própria cultura humana, tendo a civilização como subproduto de uma obra gigantesca que foi esquecida ou que continua a se realizar de forma inaparente.
A torre de Babel, por conseguinte, talvez esteja por todas as partes de nosso indeciso mundo. Construí-la é tão absurdo quanto desistir da idéia.
A palavra inscrita no coração dos homens converteu-se em várias línguas, e se inscreveu no corpo de cada um como sua Sagrada Escritura.
Enquanto não se descobrir o sistema último de tradução de todos os livros reunidos numa torre denominada “Escritura Definitiva”, vamos recheando de palavras o nosso vazio, produzindo continuamente uma destradução do projeto antigo que nos foi legado, sabendo, de antemão, que o final será como uma fábula cuja moral ficou em aberto.
Ensaio por Levi B. Santos
Guarabira, 13 de junho de 2009
12 comentários:
Grande Levi,
Boa análise "Babélica", rsrs.
Estes dias eu estava conversando com o Gabriel e disse: "Será que a gente já criou, destruiu e teve que aprender novamente muitos conceitos?".
Acho que a torre denota o quanto perdemos no decorrer da história.
Perguntei isto porque estávamos falando da Biblioteca de Alexandria, que fora destruída e, haviam muitos conhecimentos que só foram "re-aprendidos" vários anos depois.
Abraços,
Evaldo Wolkers
Levi, muito bom o ensaio, embora eu tenha achado ele bem hermético (risos). Abraço.
Originariamente, na mesopotâmia, a torre serviria como símbolo da montanha sagrada, um lugar para a divindade. Os construtores queriam se estabelecer e "fazer um nome" para não serem dispersos pela terra. A torre também servia como meio de chegar ao deus.
No Gênesis, a tradição javista viu no episódio orgulho e insensatez. Pode ser que a solução encontrada pelo javista fosse contra o ajuntamento da civilização urbana.
Mas não é engraçado que Javé tenha embaralhado as línguas dos homens para que eles não tivessem acesso a ele?
Teu texto é complexo, cheio de nuances que poderíamos retalhar em boas teses e releituras desse episódio tão rico em simbolismos.
"Enquanto não se descobrir o sistema último de tradução de todos os livros reunidos numa torre denominada “Escritura Definitiva”, vamos recheando de palavras o nosso vazio..."
Ainda estamos construíndo torres inúteis para chegar a Deus?
E aconteceu que na região montanhosa de uma primitiva civilização chamada blogsferra alguns homens se reuniram e resolveram criar um blog imenso que superaria todos os outros em conhecimento e talentos diversificados.
Eles assim decidiram se unir para juntar forças não somente para se defender de nações vizinhas como também por um projeto de chegar ao conhecimento pleno da origem da formação da divindade na psique do homem.
Vendo isso o grande deus Google, resolveu criar desentendimentos de pensamentos entre eles para que nunca eles conseguissem chegar ao absoluto do conhecimento e ser como Ele.
E assim intrigas, denuncias, rompimentos e um total desentendimento de idéias e ideologias aconteceram entre eles, e cada um desanimado com o outro por ficar cada vez mais nítidas suas diferenças, pegaram suas famílias e foram morar num recanto particular e solitário da grade planície internet.
Caraça! eu acho que em uma reencarnação passada foi eu que criei o mito da torre de babel, desculpe ai Levi, mas a culpa foi sua rsrs.
Haha, muito bom, Gresder.
"Eles jamais imaginariam que a construção lenta, se arrastando por centenas de anos tinha maior significado que o próprio edifício"(Levi).
A C.P.F.G. é uma Babel em construção lenta e interminável, meu caro Evaldo.
Mas como diz trecho acima, que pincei do ensaio babélico, o que nos interessa não é o "edifíco pronto", mas essa eterna construção dialética sem fim, que nos anima. (rsrs)
Caro Isaias
A minha intenção foi transformar Babel numa coisa meio enigmática, para que no final, cada um, ao seu modo, pudesse traduzír a "confusão de linguas" como função frenadora de uma "torre"(projeto), que nós, pobres mortais, jamais conseguiremos alcançar.
Contudo, concordo com você que o texto ficou um tanto obscuro.
Abçs,
Levi B. Santos
Caro Eduardo
"Ainda estamos construíndo torres inúteis para chegar a Deus?" (Eduardo)
Acho impossível que os "tijolos" de nossas racionalizações, por mais virtuosas que se apresentem, consigam decifrar por completo o "inconsciente" ou Deus, como queiram denominá-lo.
Restará sempre um vazio impreenchível (rsrs)
A metafórica torre em construção é devassável, visto que está sendo erguida com tijolo de barro, e não de pedra.
Aqui pra nós, Eduardo, como se reveste de muitas significações para nossa vida prática, o tal do MITO. Concordas, amigo?
Abçs,
Levi B. Santos
Gresder, seu vidente!!!
Fiquei todo sem jeito de comentar os comentários dos que te antecederam, pois a tua releitura matou toda a charada.
De maneira muito mais engraçada reescrevesse os meus pensamentos babélicos que estavam no meu sub-inconsciente quando postei o ensaio no grande teatro do deus "Google".
E eu te digo com sinceridade, fiz esse ensaio pensando justamente nos últimos acontecimentos aqui na Confraria.
Abçs babélicos,
Levi B. Santos
P.S.:
Gresder,
Para ganhares um prêmio, decifra isso aqui que pincei do ensaio:
“Por força da multiplicação das línguas, os livros empilhados dariam para chegar aos céus” ─ argumentavam alguns.
Levi seu eu apenas fiz uma leitura inconsciente do seu texto com a ocasião, isso não significa que eu acredite que possa acontecer isso, e nem quero parar esta construção junto com todos os trabalhadores iniciais desta vinha.
Mas no campo teórico do texto creio que a confusão não foi das línguas mas das ideais, que sabe esta tão torre que foi construída não tenha sido a primeira e maior universidade do mundo com a maior biblioteca e maior enciclopédia que foi impossível de se terminar pela confusão e desentendimentos dos seus criadores.
O que podemos aprender com essa historia que é impossível construir um edifício de uma só ideologia com tantas mentes diferentes, o máximo que podemos chegar é ao respeito pelas formas diferentes de pensar e trocas sadias de idéias, pois não dá para reunir todo o nosso conhecimento e talentos e fazermos uma teologia que chegue ao topo do saber.
Magnífico texto LEVI!
Você nem sabe o quanto é prazeroso ler um artigo escrito por ti...fico muito feliz, por ter tido a oportunidade de conhecê-lo neste mundo imenso chamado "Blogosfera"...
Lendo este texto, também reflito que hoje em dia, ainda vivemos meio balançados pela "torre de Babel", balançados oras por dúvidas, oras por crenças, oras por descrenças....e assim, vamos tentando absorver uma idéia aqui, mas logo outra ali contradiz a idéia que acabamos de absorver....mas esta é a flexibilidade da vida, a flexibilidade que também está inserida em nossos pensamentos....flexibilidade esta, que nos capacita articular idéias, pensamentos, línguas, cohecimentos e um conjunto infinito de diversidades.....formando assim, sempre uma opinião a mais...uma idéia a mais....
Beijos querido.
Desculpe pela minha ausência, mas já estou entrando de férias, aí me aguenteeee...kkkkkkk....
Bela reflexão, Levi! E que desumanizada civilização foi sendo criada enquanto os construtores só pensavam nas obras da torre. E, olhando agora para a questão política, vejo que coisas semelhantes também aconteceram nas histórias de muitos povos. Fossem as pirâmides dos egípcios, os templos astecas, nos palácios dos reis e nas obras faraônicas dos governantes brasileiros... Até hoje não páram de construir suas torres de Babel enquanto o povo vive privado de serviços essenciais e as reais necessidades das pessoas não são satisfeitas.
Enquanto lia seu texto, veio à minha mente a ideia do Pentecoste onde cada prosélito ou judeu da diáspora naturais de outras terra, ouviram falar das grandezas de Deus em sua própria língua materna.
A mensagem do Pentecoste (não sei se bem compreendida pelos que se dizem pentecostais) é para mim a necessidade de que todos busquem se entender pela comunicação. A mensagem do evangelho da graça deve ser anunciada no nível de entendimento de cada homem, sem nenhum estupro cultural. Até mesmo a maneira de ser de cada um precisa ser respeitada.
Não seria o Pentecostes a restauração da unidade perdida em Babel?
Abraços.
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