Parece até um delírio psicológico e filosófico discorrer sobre a mente de Deus, se mal conheço as entranhas do meu inconsciente. É claro que quando falo da “mente de Deus” eu a estou traduzindo de acordo com a minha realidade intrapsíquica.
Mas, foi observando com calma a dinâmica de um quebra-cabeça chinês, que pude ver com clareza a história da FALTA que põe em movimento o moinho dos ANSEIOS HUMANOS, tão bem descrito nas irretocáveis metáforas do prólogo bíblico do Gênesis.
Todos nós conhecemos o jogo do quebra-cabeça chinês: um pequeno quadrado, em cujo interior ficam letras ou números estampados em quadradinhos móveis. Nele existe um lugar VAZIO que permite movimentar as peças uma após outras, com o intuito de formar uma palavra ou compor uma ordem numérica. É graças a essa AUSÊNCIA, VAZIO OU FALTA, que o jogo pode então começar. Sem esse VAZIO o jogo não funciona.
Da mesma forma que o jogo chinês, assim funciona a nossa vida. Temos um VAZIO, algo que nos falta e que, na ânsia de preenchê-lo, apenas o mudamos de lugar. O VAZIO não desaparece, ele sempre está se encontrando em uma outra parte de nossa trágica e jubilosa vida, como no quebra-cabeça chinês.
Não é o VAZIO do estômago que, por exemplo, nos faz sentir o DESEJO denominado FOME? O desejo pelo PÃO de cada dia?
É por isso que no meio cristão é comum cantar em versos, hinos que sempre falam em um vaso VAZIO, a ser preenchido, como, por exemplo, essa estrofe retirada do hinário “Harpa Cristã”:
“O Senhor precisa de vasos para encher
Mas VAZIOS vasos que irão conter
Toda a sua graça, brasa do altar
Para o fogo espalhar.”
Quando decidimos nos juntar em uma confraria virtual, é porque antes, fomos movidos pela sensação da “FALTA” de um outro - que estimula a BUSCA pelos encontros interpessoais. Sentados ao redor de uma “farta mesa virtual” damos vazão ao desejo de repartir o PÃO uns com os outros, mas esse desejo nunca se completa, porque sempre haverá uma cadeira VAZIA. Em nossa trajetória existencial empre haverá uma 'cadeira vazia' no meio desse estranho caminho carregado de Desejos Humanos na eterna BUSCA da completude inalcançável.
Diz a História, que Napoleão Bonaparte teve um encontro com o Czar soviético para debater sobre o futuro da relação entre a França revolucionária e a Rússia. O Czar, em determinado momento, horrorizado com a “gula de poder” do seu amigo, então disparou: “Eu luto pela honra, e vejo que o senhor luta por dinheiro.” Ao que Napoleão teria respondido: “Cada um luta pelo que não tem”.
Aqui, eu acrescentaria: “Cada um luta pelo que não tem, ou pelo que se perdeu (no emaranhado do inconsciente)”
Se não houvesse uma casa vazia, as peças do jogo chinês não se movimentariam para dar início à peleja. Assim é a nossa vida, cuja verdade por ser nômade e não FIXA, precisa dos espaços VAZIOS para ser também lida nas entrelinhas do nosso périplo existencial.
Como uma galinha que instintivamente agasalha seus pintinhos debaixo das asas, assim o “Filho do Homem” em sua rápida trajetória, DESEJOU ardentemente, ou seja, lutou até o fim procurando juntar seus filhotes debaixo de suas asas, ou seja, de forma metafórica, unir-se à sua outra parte que havia se perdido lá no Gênesis da história divina do homem. É Dele essa frase:
“Eu vim buscar o que se havia perdido.” (Jesus Cristo)
Ensaio por Levi B. Santos
Guarabira, 13 de Outubro de 2010
12 comentários:
Oh Mestre Levi!
Li o seu brilhante texto.
Gostei muito da analogia do jogo chinês para mostrar essa “ausência” no âmago da existência humana.
Seu texto é irretocável.
Numa interpretação psico-análitica do Genesis eu acrescentaria:
A bíblia começa dizendo:
“No principio criou Deus o céu a e terra”.
Mas veja que logo a seguir diz: “E a terra tornou-se (veio a ser) sem forma e vazia.
Acho que esse texto já é uma prévia da condição humana, em algum momento a nossa existência algo aconteceu, abriu-se um vazio, mas me parece que temos a sensação que em algum momento não era assim....
Será que esse momento era o útero materno...
É meu amigo há muitos mistérios que nos rondam...
Abraço
J. Lima
É um prazer tê-lo aqui de novo comentando.
Sua inserção veio acrescentar um valioso subsídio ao ensaio postado, mostrando o VAZIO caótico de onde viemos.
Creio que aprenderemos muito mais sobre nós mesmos, se olharmos o prólogo do Gênesis como metáfora de nossa origem psicobiológica.
Como a Bíblia é o livro metafórico por excelência, eu diria que Gênesis 1: 2, remete-nos à vida intrauterina (rssss):
“ E o Espírito de Deus se movia sobre a face das águas”, que traduzido ficaria assim:
“ O feto (ser latente) se movia sobre as águas aminióticas”.
Abraços
Levi B. Santos
Vazio e Desejo. Mas disse DEus "haja luz" sobre as águas aminióticas e ilumine o ser que dela sairá para a ausência de ter perdido para sempre o útero protetor.
ensaio maravilhoso.
Mestre Levi..
Parabéns pelo maravilhoso ensaio!
Realmente a vida é como um jogo-chinês..se não existe o vazio, não nos locomovemos em busca de completar este vazio..
Mas mesmo completando este vazio momentaneamente,em algum momento, perceberemos que ainda existe um outro vazio..
Ou seja, somos feitos de Matéria, Alma, Desejo e vazios...rss..
Beijos!
Eduardo
O ensaio fala de um VAZIO como metáfora da PULSÃO dos desejos.
O Grande Oleiro criou o VASO (homem) com suas mãos em torno de um vazio. E é em torno do VAZIO do homem e do VAZIO do mundo que a nossa trama existencial se articula. Ou não? (rsss).
Divagando, divagando a gente chega lá... (rsss)
Paulinha
Bendito VAZIO que estimula a produção de encontros.
É graças a esses encontros mediados pela palavra, que se forma a dinâmica do desejo.
Um lugarzinho vazio na alma não faz mal, é sempre bem-vindo, para que possamos estar sempre grávidos de desejos.
Abçs,
Levi B. Santos
Levi, é isso mesmo. O vaso é criado vazio mas é criado para ser enchido (desejos?). Eu divaguei sobre a luz divina(inconsciente/consciente?) que já possuímos e que nos direciona para o enchimento do vaso de forma mais autêntica possível.
viajei demais...? rsss
Caro(conterrâneo) Levi Bronzeado, sou o editor do Blog Recortes (http://recortecotidiano.blogspot.com), há algum tempo idealizei uma "seção" chamada Amigos Blogueiros, cuja intenção era conhecer melhor as pessoas que estão por trás dos discursos, além de estabelecer um diálogo construtivo e agradavel entre os demais que interagem por meio dos comentários. O Amigos Blogueiros consiste numa série de perguntas quanto ao blogueiro e ao blog, tudo começou como uma grande brincadeira, mas os leitores apreciaram, assim como os demais participantes. Da C.P.F.G participaram Eduardo Medeiros, Isa Medeiros (por indicação da amiga Adriana) e Hubner Braz e seu nome foi cotado para ser o próximo a nos honrar, na verdade, eu mesmo já havia pensado em convidá-lo, mais ainda com os comentários da última edição (falou-se até em abaixo assinado) e resolvi arriscar o convite para uma participação mais que especial, se estiver interessado deixe um comentário no Blog com o endereço de email e aguarde as perguntas (que dessa vez, por sugestão da Dianne, serão feitas pelos demais blogueiros). Para saber um pouco mais sobre o "quadro" e conhecer os demais participantes, acesse o link: http://recortecotidiano.blogspot.com/search/label/Amigos%20Blogueiros
Aguardando seu retorno. Muito grato.
Mas ai é que tá, ao buscarmos preencher e saber o que ha, o que é o que falta, apenas estamos saído de um ponto de saciedade para chegar em outro, empurrando e tirando de um para colocar em outro, sem se conformar que vazio é vazio e não a nada a saber ou resolver e encontrar.
Na realidade você falou de tal forma que eu apensa repeti, e só podemos repetir, você fechou a questão em si, tirou todas as respostas e contribuições do assunto de nossas bocas e nos deixou (vazios) sem muito o que comentar.
GRESDER
Por pouco tempo nos vemos saciados ou apaziguados. Por isso, é que temos de fazer três refeições por dia para preencher o vazio do estômago.
No entanto a sensação de FALTA sempre reaparece. Quando depois de saciados, ALGO nos vem de novo a faltar, retornamos aos nossos textos, e neles encontraremos não a paz total, mas ao menos uma bagagem para retornamos o caminho, animados por alguma questão que nos deixe menos tenso (rsss).
LEVI
Seu texto é fantástico...concordo com o GRESDER, que não há mais nada a ser dito que já não tenha sido completamente dito brilhantemente por você.
Eu então caminharei, não no mesmo caminho que você trilhou, porque não há mais nada a si trilhar, mas antes, por um caminho paralelo ao que você traçou....
Não seria também necessário para o pensar, o vazio???
Pois só aprendemos quando não sabemos, ou seja, quando nossa mente esta vazia da temática que vamos ponderar, é que verdadeiramente refletimos, pois uma mente que já esta entupida de conteúdo e informação, não há espaço para se pensar.
Abraços
MÁRCIO
“Não seria também necessário para o pensar, o vazio???”
Essa sua pergunta é cabível, pois o pensamento, ou o ato de pensar é uma espécie de BUSCA.
Somos vasos vazios do que se perdeu, e, sem sabermos de maneira palpável o que foi que perdemos, buscamos às cegas o incerto.
Se antes, no jardim de nossa existência, éramos inconscientes, hoje como seres conscientes, só podemos buscar algo que está perdido em nós, ou seja, em nosso assombroso porão – o inconsciente. Quando achamos, achamos só ENÍGMAS. Se o que buscamos ou desejamos já ERA, andamos em um círculo na direção do ponto de partida que também é o da chegada.
Abçs vazios
Levi B. Santos
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