21 dezembro 2010

NATAL: É Tempo de Rever “Nossos Anjos”


A história dos anjos se confunde com a história humana, estando, ao mesmo tempo, relacionada ao nosso lado profano e ao nosso lado divino. A presença dos anjos no universo se confunde com o universo de nossos sentimentos, ambições, virtudes e falhas. Uma história igualmente repleta de contradições. E isso pode ser verdadeiro, desde que se faça uma abordagem desses seres angelicais sob o pano de fundo da psicanálise.

Quem não se lembra de Erich Von Daniken, autor do best-seller. “Eram os Deuses Astronautas?”, que nos anos 70 promulgava que os anjos eram seres reais, porém, com origem extraterrestre, que interferiam em nossa evolução de uma forma ou de outra?!
O autor de “Anjos — A Historia” (David Albert Jones) diz que os anjos retratam a nossa ambivalência: “Anjos vivem entre dois mundos: entre o céu e a terra, entre a vida e a morte. Os anjos, assim como os adolescentes vivem em um espaço intermediário entre a infância e a idade adulta”.

Hoje, na era do cientificismo, se sabe que “anjos” nada mais são que representações simbólicas de nosso inconsciente. Apesar de não serem homens nem deuses, dizem muito de nossa natureza humana.

Joad Raymond, especialista na obra de John Milton (autor do best-seller - Paraíso Perdido), sobre anjos, assim fala: “Os anjos continuam sendo um meio útil pelo qual pensamos nosso mundo, uma maneira de dar significado à nossa existência e às nossas atitudes do dia a dia”.

Procurar padrões e figuras para unir ou diferenciar os seus afetos mais profundos, foi sempre uma preocupação do ser humano, e nessa inquietação atávica ele procura dar ordem ao caos, pois esse mundo impenetrável lhe produz assombros. Os “anjos-mensageiros” como complexos do “inconsciente/divino” estão sempre a revelar mensagens originadas no nosso lado obscuro. Nos moldes de nossa cultura e do nosso tempo, eles se apresentam como “imago-expressão” de nossas verdades e anseios primitivos.

Santo Tomás de Aquino (1225 – 1274) estudou os seres angelicais com mais profundidade, chegando à conclusão de que eles eram seres puramente espirituais, aproximando-os, dessa forma, dos conceitos de pensamentos e estados psíquicos.

Na modernidade, o psicanalista Carl Gustav Jung, com a descoberta dos “arquétipos”, conseguiu analisar a função religiosa da psique, transpondo o abismo entre ciência e religião. Compreendeu, enfim, que as afirmações, revelações e dogmas são padrões ordenados do que ele denominou “Inconsciente Coletivo”.

Segundo Gregório — o Taumaturgo, o anjo Gabriel conversa com a virgem Maria, para que a serpente (anjo mau) não possa mais conversar com a mulher. Jung, vê nisso, o estabelecimento de um vínculo psicológico entre duas imagens, tanto por contraste como por similaridade. A obediência de Eva a serpente e a obediência de Maria ao anjo da Anunciação são eventos paralelos ou opostos, constitutivos de nossa psique.
O amor de Deus e a ira de Deus, sua luz gloriosa e seu fogo ardente pertencem inseparavelmente um ao outro e são a razão de nossa ambigüidade. Esses pólos aparentemente opostos aparecem no nosso imaginário como anjos de luz e anjos da escuridão, em consonância com o que está escrito em Isaias 45, 7: “Eu crio a Luz e crio a Escuridão. Eu, o Senhor, faço todas as coisas.”

O Natal — é a época propícia na qual a figura dos anjos é usada exaustivamente nos diversos meios de comunicação. Há “anjos de luz” portadores de mensagens que simbolizam a mais elevada espiritualidade, no sentido de oferecer consolo e paz, e há “anjos das trevas”, que aparecem como seres inspiradores do reino daqui de baixo, impulsionadores das vendas estratosféricas de presentes a serem trocados entre os familiares. Esses últimos, são anjos que atiçam o nosso instinto de consumismo desenfreado, responsável por um coroamento recorde de vendas, a cada Natal que passa. O estribilho de sua música preferida é esse: “muito dinheiro no bolso, saúde pra ‘dar’ e vender”.

E por falar em anjos, não poderia deixar de registrar aqui, “A Hora do Angelus (anjo em grego) ou Toque da Ave-Maria”, que é executada às 18:00 horas, na passagem da luz do dia para a escuridão das trevas, e traduz no dogma cristão, o momento da Anunciação — feita pelo anjo Gabriel a Maria — da concepção de Jesus Cristo. Gabriel, em psicanálise, significa a síntese entre os nossos “anjos de luz” e os nossos “anjos da escuridão”. Nele estão representados os nossos afetos ambivalentes. Ele sintetiza a nossa sombra acolhedora e paradoxal; simboliza, ao mesmo tempo, os nossos sentimentos de esperança e de nostalgia em épocas de mudanças ou crises existenciais.

Toda vez que ouço a prece musicada desse anjo simbólico, invade-me um misto de melancolia e paz. Trata-se da “Ave Maria de Schubert”, que eu ouvia emocionado todo cair da tarde, pelos alto-falantes colocados em pontos estratégicos de minha cidade, nos meus tempos de menino.

P.S.:
Só poderia ser mesmo um anjo, o autor da magnífica sinfonia erudita (do vídeo abaixo), que nas cordas de um plangente violino conseguiu realizar um dos maiores milagres cósmicos: “tocar o lado divino da alma humana”.

Por Levi B. Santos
Guarabira, 21 de dezembro de 2010

4 comentários:

Eduardo Medeiros disse...

Levi, de fato, é claro que anjos existem...

teu texto me fez ver como de fato nossas ambiquidades estão manifestas simbolicamente nesses seres. a sinfonia da ave maria ao final fechou com chave de ouro.

gosto também de ouvir o agnaldo rayol cantando a ave maria com aquele vozeirão que ele tem.

ah, claro que quero as dicas para papais de primeira viagem...rsss

o eduardinho já saiu da uti e já está mamando no seio. graças aos anjos...

abraços

Esdras Gregório disse...

Levi nem sempre posso comentar discutir nas mesmas estruturas de pensamentos e informações que você, mas tenho uma pergunta que pode ter alguma relação ao texto.

Por que durante meu estado pleno de consciência eu sou totalmente convicto e sem nem um tipo de medo, mas em estado sonolento de sonos maus dormidos eu tenho sentimentos de medos e angustias de almas piedosas?

Exemplo: esta noite durante o sono, senti algumas sensações fundamentalistas e pietista do tipo de um misto de segurança em Deus ao mesmo tempo tristeza por estar a mercê do capricho divino que arbitrariamente nos deixa em suspense? Coisa que já senti a muito tempo!

O que é isso sendo que no estado pleno de consciência nada disso me ocorre, mais um alto estima imperturbável e um otimismo realista em relação coerência da vida natural, contaria a dependência melancólica às vontades insondáveis de Deus.

Responda-me, é o material colhido do passado pelo inconsciente criando essas sensações?

Levi B. Santos disse...

GRESDER

O homem quando sonha, fica afastado do mundo da consciência de vigília.

No sono, quando o “vigia” chamado “censura” relaxa, o que temos de afetos primitivos que estavam aparentemente esquecidos nos arquivos de um porão denominado inconsciente, vêm à tona sob a forma de lembranças, imagens, desejos ambíguos.

A função simbólica juntamente com a memória inconsciente elaboram percepções de nosso passado e de nossa história relacional. Que seríamos nós sem esse imaginário que nos sustenta através de fantasias e recordações que aliviam a perda da onipotência de nossos pais?

Que seríamos nós se não pudéssemos sonhar com o leite que secou do peito da bondosa mãe?

É nos sonhos que a nossa “racionalidade vira pó”, por que a razão não suporta o absurdo de nos rendermos a uma PRESENÇA inefável do invisível.

O que fazer, se não podemos deletar o “sentimento religioso” que foi lentamente cultivado de forma fundamentalista no tecido virgem do nosso cérebro?!

Quando estamos acordados, podemos através de racionalizações sepultar, transitoriamente, esse nobre sentimento, mas ele tende sempre a aparecer, como a ponta de um iceberg, que por não ser levado a sério, tem afundado muitos Titanics por aí afora.

RODRIGO PHANARDZIS ANCORA DA LUZ disse...

"Não são todos eles espíritos ministradores, enviados para serviço a favor dos que hão de herdar a salvação?", assim definiu o autor anônimo de Hebreus. E Gabriel foi, sem dúvida, um porta-voz da esperança anunciando a vinda do Salvador Jesus Numa época de grande opressão, Maria conseguiu escutar a voz desse bondoso ser e louvou a Deus declarando o fim do trono dos poderosos e a exaltação dos humildes, conforme podemos ler no Magnificat (Lc 2:52-53).

Vivendo no tempo que se chama hoje e não nos esquecendo que, por intermédio de Jesus, todos os que creem são feitos filhos de Abraão, devemos ter em nós a mesma chama de fé que um dia incendiou os corações de Maria e de Zacarias. Enquanto os telejornais vomitam notícias trágicas de filhos assassinado os pais, ladrões incendiando as vítimas porque não tinham dinheiro suficiente, a matança de civis na Síria, homens bomba se suicidando em Israel nos seus ataques terroristas, estadistas que não estão nem aí para o meio ambiente, pacientes sofrendo nas filas dos hospitais públicos brasileiros e um monte de jovens alienando-se com o uso de drogas, como nos posicionamos diante da dura realidade?

Penso que não devemos focar nos acontecimentos negativos do mundo, mas, sim, nos nutrirmos de ânimo, quer vendo anjos ou não, porque há um processo de libertação em curso. A longa noite de trevas espirituais pela qual passou a humanidade nesses últimos milênios já se vai e eis que estamos diante do amanhecer de um novo tempo. Tronos de opressão devem ser derrubados para que reinem a justiça e a santidade através da direção que recebemos do Senhor.

Portanto, creiamos mesmo contra os fatos, sabendo que Deus permanece conosco todos os dias até à consumação dos séculos, e nos juntemos ao coro celestial que celebrou o nascimento do Messias Jesus:

"Glória a Deus nas maiores alturas,
e paz na terra entre os homens, a quem ele quer bem."
(Lc 2:14)

Abração e FELIZ NATAL ao amigo bem como aos seus familiares.