24 fevereiro 2013

Sobre Duas Renúncias Recentes




Ontem (dia 23), Lula, não sei se pressionado, diante da presidenta e três cardeais petistas, renunciou sua candidatura à presidência em 2014, praticamente iniciando a campanha de sua apadrinhada, vinte meses antes da eleição. (Vide artigo de Luis Nassif no jornal Estado de S. Paulo).

O sugestivo título do ensaio − A Arte de Ser “Ex” − de Roberto Pompeu Toledo, na última página da revista VEJA desta semana, surpreendentemente, levou-me a fazer um paralelo entre a renúncia de Bento XVI e a do ex-presidente nordestino, de Garanhuns – PE.

O texto do jornalista é um exercício de ficção sobre a situação do poderoso Papa, supostamente enclausurado após sua renúncia ao trono. Diz, Pompeu Toledo, a certa altura do ensaio: “Imaginemos, no entanto, que, não tarde muito, o ‘ex’ se entedie da nova vida. Resolve então fundar um Instituto. ”Dá-lhe o nome de Instituto Bento XVI e nele montará um escritório, no qual se ocupará de uma densa agenda: audiências a bispos e cardeais, bem como a leigos de diversa extração (até mesmo chefes de estado); publicações de folhetos sobre as excelências de sua administração sobre os rumos da Igreja e a sorte dos povos, [...] o que alimentará o rumor de que o ‘ex’ continua a exercer direta influência nos rumos da instituição”.

 Lendo bem a vagar o trecho acima, o leitor(a) não precisa fazer grande esforço para ver que há pontos em comum entre a renúncia de Bento XVI e a de Lula em ser candidato em 2014.

Lula, ao escolher o seu Instituto no bairro de Ypiranga ― São Paulo, para anunciar a sua renúncia em ser candidato a presidente, às avessas, evoca D. Pedro I e seu grito ensaiado ― às margens do rio Ypiranga. Não tão bobo quanto o antigo imperador, o grito de Lula para Dilma e a trindade cardinalícia que o acompanhavam na reunião, deve ter soado diferente, tipo: “Dependência ou Morte!” ―, ao invés de “Independência ou Morte”.

Perguntas emblemáticas que o jornalista deixa no ar em sua obra de ficção, a meu ver, se encaixam bem nas duas renúncias, ou seja, podem perfeitamente transitar tanto em Roma de Bento XVI quanto no Brasil de Lula, se não vejamos:

O que faz um ex- Papa?

● Conseguirá ele “desencarnar” do cargo?

● Sentirá saudade do tempo em que reinou?

● Quererá influenciar o governo do sucessor?

● Abrigará o secreto (ou nem tão secreto) desejo de voltar ao posto?

Por Levi B. Santos
Guarabira, 24 de fevereiro de 2013

Site da Imagem: topicos.estadao.com.br

14 fevereiro 2013

Suicídio de Ex-Combatentes Assombra os EUA




A reportagem, “A Dor Não Acaba Nunca”, de Nathalia Watkins, na    Revista Veja desta semana,  traz estatísticas alarmantes sobre a vida dos militares americanos egressos dos campos de batalhas do Afeganistão e do Iraque nos últimos doze anos.

As estatísticas são realmente de arrepiar: Segundo a pesquisadora e jornalista do semanário Veja, “em 2012, o número de suicídios de militares atingiu uma taxa de 29 suicídios para cada grupo de 100.000 veteranos. Se considerado apenas o contingente na ativa do Exército, foram 177 suicídios ― um a mais do que os mortos em combate no Afeganistão no mesmo ano.”

Em 1916, Freud, já analisava os casos de neurose traumática pós-guerra. Ele dizia que “esse quadro psicótico era decorrente de uma fixação dos acidentes traumáticos que ficavam sendo reeditados através dos sonhos e na forma de ataques que parecem transportar o sujeito para a situação do trauma.”  (Vide livro TRAUMA – de Ana Maria Rudge – página 40)


Os Psiquiatras dizem que as reações aparentemente inexplicáveis de ex-combatentes, tais como − irritabilidade, insônia, pesadelos, aumento da agressividade e pensamentos de acabar com a vida −, aparecem como se a pessoa estivesse numa situação em que a guerra ainda acontecesse.


O psiquiatra, Shad Meshad (criador da Fundação Nacional dos Veteranos de Guerra), consultado pela jornalista da revista Veja, disse: “Esse fenômeno só é comparável ao que os Estados Unidos enfrentaram nos anos 70, após a Guerra do Vietnã.”

“Foi após a Guerra do Vietnã, onde havia muitos jovens imaturos de 18 e 19 anos lutando em selva fechada, que surgiu um novo ramo da Psiquiatria moderna ― aquela dedicada aos distúrbios de ansiedade adquiridos nos campos de batalha. A Associação Americana de Psiquiatria, em 1980 catalogou em seus manuais esse “novo” distúrbio psíquico ― rotulando-o de stress pós-traumático.”

Recentemente, nos EUA, foi largamente difundida pela imprensa internacional uma manifestação dos veteranos de guerra do Iraque e do Afeganistão. Homens e mulheres, de diferentes ramos das forças armadas norte-americanas fizeram uma dramática declaração ao mundo ― sinal de que estão revoltados com o descaso e insensibilidade das autoridades governamentais dos EUA que não prestam assistência psicológica devida a seus companheiros; muitos, com problemas de ordem física e psíquica decorrentes das atrocidades a que foram submetidos numa guerra insana e injusta.

Cerca de 50 veteranos norte-americanos da guerra do Iraque e do Afeganistão, em maio de 2012, numa manifestação em Chicago - Canadá, arrebanharam mais de 10.000 pessoas aos gritos de “Não à Guerra!!!”. Cada um dos veteranos subiu ao palco para contar a história das atrocidades que foram obrigados a cometer. Jogaram fora as medalhas recebidas por um falso heroísmo, após darem seus comovedores testemunhos. Na ocasião, um dos recrutas em lágrimas deu um depoimento contundente:

“Nós não podemos mudar o passado, mas queremos que outras pessoas saibam que esta guerra precisa ser parada. Nós temos uma guerra aqui mesmo para levar estes políticos à justiça. Eles são criminosos de guerra. As forças armadas mentem aos soldados e dão-lhes medicamentos que podem ser piores que as drogas de rua, e dizem que matem quem virem. Muitos soldados têm cometido suicídio porque nós temos uma consciência.”  (Clique aqui para ler mais depoimentos)

“Um soldado mata a sua mulher e se mata. Outro veterano de guerra se enforca, desesperado. Um terceiro coloca a arma na cabeça e puxa o gatilho em um posto de gasolina. Suicídios cometidos como os descritos acima, não chocam mais a maioria das comunidades nem o Comando do Exército norte-americano.”

“Os Homens e mulheres, depois de estarem em uma guerra, têm as suas vidas alteradas de uma maneira ou de outra. Alguns aprendem a lidar com seus pesadelos e flashbacks sobre o que viram e fizeram quando estavam lá. Outros, no entanto, não conseguem deixá-los para trás. Infelizmente para esses homens e mulheres que não conseguem deixá-los para trás, o suicídio é uma das maneiras que escolhem para lidar com a vida após a guerra”. (James Cogan ― ao  World Socialist Web Site).

Parece-me que ninguém, mesmo em guerra, pode matar impunemente. No fragor da luta no campo de batalha, os soldados nem sequer imaginam o que acontecerá com eles após a volta para casa. Na volta ao lar, o reconhecimento representado pelos discursos solenes de elogios, a emoção pelo recebimento das medalhas e seus efeitos, duram pouco, duram até o aparecimento dos sintomas do stress pós-traumático de guerra − situação em que os ex-combatentes são tomados pela forte percepção de que as suas vidas se transformaram em um intolerável e pesado vácuo.

P.S.:
No vídeo abaixo,  o enorme peso de uma emoção que vai além das palavras, está presente no  depoimento de um veterano marcado na alma pela insana guerra do Iraque:



Guarabira, 15 de fevereiro de 2012

Site da Imagem: vivamelhoronline.com

11 fevereiro 2013

...E o Papa Resolveu Sair




A notícia da renúncia do Papa Bento XVI chegou ao país em pleno Carnaval, tomando as redes sociais em meio ao fuzuê dos desfiles das Escolas de Samba do Rio de Janeiro e a nudez de suas celebridades.

Após a quarta-feira de cinzas, o conclave da escolha do próximo Papa será assunto dos jornais e telejornais do mundo inteiro. Aqui, em nossas terras, a audiência televisiva do “profano” dará lugar à audiência do “sagrado”.

Com certeza, muitas histórias e especulações surgirão para explicar a saída do Papa. Diante de surpreendentes casos como esse, alguns poderão, na dúvida, perguntar: Terá havido ou não uma conspiração? Bento XVI estaria gravemente enfermo mesmo? Quem viver verá.

A fala resignada do Papa veiculada pela imprensa, já é do conhecimento de todos. Disse ele: “Depois de ter examinado repetidamente a minha consciência, cheguei à certeza de que as minhas forças, devido à idade avançada, já não são idôneas para exercer adequadamente o ministério Petrino. Estou bem consciente de que esse ministério, pela sua essência espiritual, deve ser cumprido não só com as obras e as palavras, mas também e igualmente sofrendo e rezando".

O jornalista Ricardo Noblat do Jornal “O Globo”, em seu artigo, republica um texto da edição de 15 de abril de 2012 do Jornal “O Público”, de Portugal,  em que se retrata o clima de fim de pontificado: “A Cúria Romana tornou-se um monstro ingovernável, e que o próprio Papa, de perfil, sobretudo intelectual e acadêmico, já não consegue controlar”. (vide Blog de Noblat)

O site da revista Veja Internacional de 04 de janeiro de 2013 exibiu uma matéria dando conta de que Bento XVI vinha enfrentando problemas com o Banco Central da Itália ― uma importante fonte de renda do Vaticano. Segundo a reportagem, “o Banco Central Italiano vetou todas as formas de pagamento eletrônico na cidade do Vaticano por causa da falta de transparência com as normas bancárias. A decisão foi um grande obstáculo a uma das maiores fontes de renda da igreja, porque impede turistas de fazer pagamento com cartões de crédito ou débito”.

 Bento XVI sofreu o ano passado um grande abalo: O seu fiel mordomo, Paolo Gabriele, foi detido por posse ilegal de documentos confidenciais encontrado em seu domicílio no Vaticano. Nesse mesmo dia o presidente do Instituto das Obras de Religião (IOR), o banco do Vaticano, foi forçado pelo Conselho de Supervisão a demitir-se ― Notícia que foi veiculada e comentada no site  “Associação Rumos”

Parece que mais coisas virão à tona sobre o pontificado de Bento XVI e sua renúncia, antes que a fumacinha branca indique qual foi o cardeal escolhido para substituí-lo.

Numa entrevista dada hoje ao Jornal Zero Hora, Leonardo Boff, afirmou que Bento XVI foi um Papa muito rígido, que entendeu a igreja como uma fortaleza cercada de inimigos”. Ao ser perguntado sobre o que ele esperava do Novo Papa, assim respondeu: “A esperança, agora, é que venha um Papa que refaça a atmosfera fraterna da Igreja que foi rompida em uma igreja cheia de tensões, brigas e acusações”.

Guarabira, 11 de fevereiro de 2013

    Site da Imagem: sudoestehoje.com

09 fevereiro 2013

Sobre o "Samba do Crioulo Doido"




Como estamos iniciando o período momesco, nada melhor do que trazer para o momento, algo risível e emblemático de nossa história carnavalesca, que consagrou a expressão “Samba do Crioulo Doido”, criada por Sergio Porto (1923 ― 1968). O cronista sempre assinava suas crônicas com o pseudônimo, Stanislaw Ponte Preta. Esse samba, composto em 1967 e gravado em 1968 (anos de chumbo) fez a sua fama, que já era grande, repercutir estrondosamente pelo país inteiro. Foi no ano de 1966 que lançou o antológico livro  "Febeapá: Festival de Besteira que Assola o País",  o qual versava sobre os causos rizíveis da "Redentora" (como ele denominava a Ditadura Militar).

No fundo o que Stanislaw queria com seu "Samba do Crioulo Doido", era ironizar a ditadura militar e seu exagerado e obtuso nacionalismo. A letra do samba é toda sem sentido, como que para demonstrar a confusão político-militar reinante na época.

A atitude excêntrica dos que organizavam a vida social era totalmente tresloucada ― um total paradoxo com o que se tinha, anteriormente, como habitual no Brasil.

O samba sem pé nem cabeça do satírico autor, afinal, refletia a louca conjuntura ditatorial que ele considerava carnavalesca ―, subentendido na “história de um compositor que durante muitos anos obedecia ao regulamento...”.

Nas estrofes dessa samba-enredo perfilam-se celebridades históricas totalmente destituídas do seu contexto histórico, um embaralhamento estapafúrdio no que concerne a cronologia e a lógica dos fatos. Então, no samba doido, Tiradentes, o herói da Inconfidência, seguia planos de Chica da Silva, que depois se casaria com a princesa Leopoldina.

Inclusive, como acréscimo ao brilhante ensaio da doutora Berenice Cavalcanti (Professora de História da PUC) na revista "Nossa História" (outubro de 2004) -, garipamos  dois elementos preciosos que destacam o gênio e a sutileza de Sérgio Porto: Quando ele se refere ao sobrenome "SILVA", faz alusão ao Presidente da República, Artur da Costa e Silva, que não por acaso, foi escolhido para governar o país em pleno carnaval de 1967. Para avivar a nossa memória, foi da pena desse General que saiu o famigerado AI.5 que, praticamente, pôs fim a liberdade de imprensa no país.

"Joaquim, que era também da Silva Xavier, queria ser dono do mundo, e se elegeu D. Pedro II. Da união deles foi proclamada a escravidão".

Mas esse fenomenal samba encerra uma moral: "D. Pedro se transforma em uma estação e D. Leopoldina vira trem" A gozação chega ao máximo na parte final da melodia, que assim diz ― “O Trem tá atrasado ou já passou”.

O leitor pode conferir abaixo o vídeo do “Samba do Crioulo doido”, gravado originariamente pelo Quarteto em Cy, interpretado aqui pelos “Demônios da Garoa”.


FONTE: Revista Nossa História – Ano 1/ n° 12

Site da Imagem: devign.com.br