01 novembro 2014

Os Mortos de Javé e Alah em Véspera de Finados



O bloqueio da Esplanada das Mesquitas efetuado pelo governo de Israel, ontem (dia 31) ―, o primeiro em 14 anos, foi motivado pela morte do Yehuda  Glick ― profeta das hostes javelianas que liderava um movimento pela reconstrução de um novo templo judeu nesse local "sagrado". 

Do lado ocidental é assim: os cristãos vêem a reconstrução do Templo de Salomão como um sinal inequívoco da volta do Messias (que dizem ter ressuscitado há quase dois mil anos), para arrebatar a sua igreja. Quanto mais quente for o conflito e quanto mais gente morrer defendendo os seus deuses mais os fundamentalistas cristãos, de braços erguidos e olhos arregalados para as nuvens, dizem em êxtase: “Ora vem Senhor Jesus!”

O “Céu” e o “Inferno”, como placas tectônicas, estão sempre em atritos nessa região. Nessa véspera de Finados, a luta insana ou louca dos deuses, por ora, resultou em uma morte para cada facção divina. Poucas horas depois de ser morto o judeu que pregava e sonhava  com a reconstrução do Templo de Jerusalém no local da Mesquita muçulmana, o palestino Moataz Hejazi foi assassinado, de acordo com preceito da Torah, que preconiza o “olho por olho e dente por dente”. Foram duas vítimas na véspera de finados: tomara que fique só nisso. Mas, segundo o que se noticia, as tensões podem se agravar no final de semana.

A Folha de São Paulo, de ontem, dá uma sucinta explicação para se entender o conflito imaginário entre os deuses Javé e Alah na mente dos neuróticos de um lado e de outro:

“A Esplanada é gerida desde as cruzadas por religiosos muçulmanos. Israel que ocupa Jerusalém Oriental desde 1967 controla o acesso ao local, mas mantém um veto a manifestações religiosas a todos os não muçulmanos, como medida de segurança”.

Vale salientar que o último fechamento da esplanada foi devido à visita do profeta e ministro de Javé, Ariel Sharon, que em setembro de 2000 invadiu o local sem ter conversado com Alah.

Para complicar ainda mais o imbróglio sagrado-infernal, o monte Moríá, onde no século VII foi construído o Domo da Rocha ― a Mesquita de Al-Aqsa ―, segundo a análise de Diogo Bercito, é local considerado sagrado pelos judeus. É que a tradição sugere que foi ali que Abraão se dispôs a sacrificar seu filho, no que seria o primeiro infanticídio em nome de Javé. Diogo Bercito é jornalista da Folha, formado em Filosofia, Letras, e estudioso de línguas orientais.

Quem tiver um pouco de inteligência, sem dúvida, irá concluir que toda essa ação montada não passa de uma jogada política, para que se concretize a hegemonia de Israel na região, e se cumpra os vaticínios vétero-testamentários de destruição dos que não seguem o deus único e verdadeiro da tradição judaico-cristã. Javé e Alah, nas mentes dos fundamentalistas, continuam a se digladiarem no sentido de fazer ver qual deles vai levar a melhor. (rsrs)

Segundo, Nilton Bonder, líder da Congregação judaica no Brasil, todo este conflito fabricado tem na praga do convencimento, a sua raiz. Diz ele:
“A idéia que norteia nossa civilização ocidental é que para um lado ter razão o outro tem que necessariamente, estar errado. [...] A luta pela afirmação de uma nação judaica vai contra a maioria das correntes no seio do judaísmo [...]. Paradoxalmente é em Israel que a visão sionista está tendo o custo mais alto, por um processo típico do retorno do recalcado”.

Bernardo Sorj, formado em História pela Universidade de Haifa, PhD em Sociologia pela Universidade de Manchester, diz algo extramemente duro, em seu livro “Judaísmo para o Século XXI”:

O Judaísmo moderno acabou, mas não sabemos como enterrá-lo. [...] A imposição de uma língua única, o esforço, em boa medida fracassado, de criar uma cultura judaica secular “naturalista” e o desapreço pela diáspora como fonte de valores e de vivência criativa foram elementos constitutivos do esforço normatizador e disciplinador da ideologia e do sistema educacional que se implantou em Israel”.

A Esplanada da Mesquita e das ruínas do templo de Salomão tem sido palco da luta ente o bem e o mal. Cada facção, ver Satã na outra que professa o deus de nome diferente. Na verdade, ele projeta o “satã” que habita em si próprio. Plagiando Nilton Bonder, “Satã não seria tão importante e não causaria tantas mortes se as questões que ele traz à luz na mente de cada fundamentalista não fossem as grandes questões humanas.”

Que os exércitos de Javé e de Alah façam uma pausa nesse dia de Finados e reflitam sobre os seus desejos de destruição que tantas vítimas fizeram e ainda fazem: justamente àquelas que não professam o mesmo deus. Acabem de uma vez por todas com a história de que só o seu deus salva, e que o do outro é que leva a perdição.  O maior mal da humanidade é o desejo de triunfo teológico que, ainda em plena pós-modernidade, infelizmente, vem marcando grandes conflitos; guerras, que certos religiosos, em sua imaginação, percebem como se fossem ordens emanadas de seus deuses vingativos e sanguinários.


Por Levi B. Santos

Guarabira, PB


Site da Imagem: culturabrasil.org

4 comentários:

RODRIGO PHANARDZIS ANCORA DA LUZ disse...

Enquanto os religiosos fundamentalistas fazem guerras pelos seus templos, esquecem de cuidar do verdadeiro templo onde Deus habita - o ser humano.

Lamentavelmente essa "guerra dos deuses" (que nada mais é do que guerras de ideologia política com fortes razões econômicas) tem feito muitas vítimas ao redor do mundo. Não apenas judeus e muçulmanos entram em conflito, como também assistimos constantemente a brigas entre católicos e protestantes na Irlanda do Norte. Aliás, não só neste pedaço do Reino Unido como no Brasil também em que diversas igrejas evangélicas têm se equivocado na busca da territorialização cultural ao invés de focar mais no despertamento das consciências.

Que Deus nos conceda dias de sobriedade iluminando o coração e a mente da humanidade.

Um abraço

Levi B. Santos disse...

Só falta mesmo surgir um enquete na internet:

" Jerusalém, minha ou sua?"? - para ver quem ganha. (rsrs)

"Mais importante é saber que quem produz um vencido, se coloca na cadeia sucessiva e interminável da violência". [Nilton Bonder em - Jerusalém e o Triunfo"]

RODRIGO PHANARDZIS ANCORA DA LUZ disse...

Concordo com a citação do rabino e acho que, neste ponto, a Dilma e o PT foram sábios após a vitória nesta última eleições. Ao invés de festejar triunfantemente, a presidenta propôs-se a dialogar. Já o Aécio mostrou-se antecipadamente triunfante pelos milhões de votos que teve quando retornou ontem ao Congresso, pois anunciou uma prematura oposição ao invés de dizer sim à proposta de diálogo. Afinal, poderemos ter em 2015 um governo novo com ideias novas, mesmo com a Dilma. Tudo só depende de nós todos...

Levi B. Santos disse...

Não sei não Rodrigo. Tenho a impressão de que a Dilma e o PT querem um diálogo, desde que não interrompa o seu projeto de se eternizar no poder. 24 anos sob a égide de uma dinastia não é bom para nenhum país.