27 novembro 2014

Objeto Vivo



Dizia Weber: “o desempenho de cada indivíduo é matematicamente medido, cada homem se torna uma engrenagenzinha da grande máquina e, ciente disso, sua única preocupação é saber se poderá tornar-se uma engrenagem maior.”

O escritor e poeta americano, Thomas Stearns Eliot (1888—1965), em “O Coquetel”, trata da coisificação do homem. Como peça de uma grande engrenagem, o indivíduo, enquanto durar, está fadado a exercer o seu papel, quer nas fábricas, escolas, órgãos do governo, tribunais, presídios, igrejas, lojas, corporações militares, hospitais, etc. Como no mito do herói grego Sísifo, o ser humano está sentenciado a carregar, diuturnamente, a grande pedra até o cume do monte, mesmo sabendo que após seu árduo trabalho, pela força da gravidade, ela retornará ladeira abaixo. O mito nos mostra que a tarefa dolorosa de subir a montanha com o fardo e ter alívio na descida, é uma constante. Freud, por certo, deve ter retirado dessa história, subsídios para formular a teoria ou conceito de “princípio do prazer” versus “princípio da realidade”.

O trecho poético de “O Coquetel”, de Eliot, através de uma situação crítica, nos oferece um exemplo contundente de como o homem da vida moderna se sente despersonalizado ou reduzido a uma coisa:

“...tomemos uma operação cirúrgica.
Na consulta com o médico e o cirurgião,
Ao ir para a cama na casa de saúde,
Ao falar com a enfermeira-chefe, você ainda é sujeito,
O centro da realidade. Mas, estirado na mesa,
Você é um móvel numa oficina
Para aqueles que o cercam, os atores mascarados;
Tudo o que existe de ‘você’ é seu corpo
E  o “você” é retirado.
Há uma perda da personalidade;
Ou melhor, você perdeu o contato com a pessoa
Que supunha ser. Já não se sente tão humano,
Você fica reduzido à condição de um objeto —
Um objeto vivo, porém não mais uma pessoa.
Isso está sempre acontecendo, porque se é tanto um objeto
Quanto uma pessoa. Mas a gente se esquece disso
O mais depressa que pode. Quando você se veste para uma festa
E vai descendo a escada, com tudo a seu redor
Arranjado para sustentá-lo no papel que você escolheu,
Às vezes, ao chegar ao último degrau,
Há um degrau além do que seus pés esperavam,
E você vem abaixo num solavanco. Por um momento,
Você teve a experiência de ser um objeto
À mercê de uma escada malévola.


Yannis Gabriel, em “Freud e a Sociedade”, disse: “Poucas pessoas avaliaram tão bem quanto Eliot, o sofrimento dos indivíduos em sua vida pública e em suas relações pessoais”.


“...Aprendem a evitar as expectativas exageradas,
Tornam-se tolerantes com eles mesmos e com os outros,
Dando e recebendo, nas ações costumeiras,
O que há para dar e receber”. (Eliot. T. S.)

“O homem se transformou num autômato” — disse Erich Fromm. “O homem virou uma coisa” — acrescentou Marcuse. Será que existe uma fórmula diferente da fornecida acima por T. S. Eliot, para se conviver pacificamente em uma sociedade tecnicamente globalizada e despersonalizada?




Por Levi B. Santos
Guarabira, 27 de novembro de 2014

Site da Imagem: Ibahia.com

3 comentários:

RODRIGO PHANARDZIS ANCORA DA LUZ disse...

Caro Levi,

Como vai o companheiro?

Acredito que talvez não existam "fórmulas" contra a coisificação do ser humano. Hoje a economia e a massificação dos serviços prestados nos transformam em coisas ou números. Mas sempre sentiremos certo vazio pela despersonalização do indivíduo dentro da cultura na qual nos achamos inseridos.

Ao lidar com necessidades, de fato o gestor precisa ter ambas as percepções. Ainda assim, mesmo diante da massificação dos serviços, há que se ter a devida cautela para ouvir cada anseio que é trazido. E aí penso que saber ouvir seja um ingrediente fundamental que tem faltado em nossa sociedade. Principalmente por parte das nossas autoridades.

Desde o começo do século, costumo utilizar-me dos canais de atendimento da ANATEL para resolver os meus problemas com as companhias telefônicas e tenho reparado que até nesse serviço somos coisificados. As demandas são automaticamente encaminhadas para a prestadora do usuário, mas nunca tratadas especificamente pelos funcionários da agência reguladora. Então indaguei como que a ANATEL atuava e soube que isso só ocorria quando o sistema acusava uma considerável reincidência quanto a um tipo de problema classificado. E até uma parte do call center já se achava terceirizado...

Num mundo em que é preciso conciliar agilidade de produção com a oitiva dos anseios das pessoas, deve-se buscar sempre mecanismos em que esta necessidade fique satisfeita. No exemplo sobre o tratamento médico, penso que um contato humano entre o profissional de saúde e o paciente fará grande diferença, mesmo que, na sala de cirurgia, a pessoa assistida já anestesiada pareça ser somente um corpo. E aí, nesta e em todas as circunstâncias da vida, faz-se necessário lembrar que estamos lidando com gente. Do contrário, a vida torna-se monstruosa.

Um abraço e bom descanso semanal.

Levi B. Santos disse...

É isso aí, Rodrigão

Estou sendo tratado como um objeto pela operadora OI. Quanto a manutenção do meu telefone fixo , que se encontra mudo há 20 dias, os funcionários só fazem fornecer o protocolo com promessa de conserto em 48horas.
Já reclamei uim montão de vezes, e sempre me dão um prazo de 48 horas para solucionar o caso. Já me passaram duas ordens de serviços e nada de aparecer técnico em minha residência.
Amigos meus da cidade, informaram-me, que estão cobrando cerca de 120,00 reais para realização do serviço.
Perguntei aos agentes da OI se, os funcionários que executam o serviço de manutenção das linhas telefônicas residem aqui em Guarabira. E eles disseram que sim.
E eu fiquei pensando com os meus botões: “será que tenho que pagar propina a OI para sanar os problemas na minha linha"?

RODRIGO PHANARDZIS ANCORA DA LUZ disse...

Bom dia, Levi!

Algo semelhante ocorreu comigo no começo do ano passado quanto ao funcionamento do VELOX, serviço pelo qual contratei no finalzinho de fevereiro e só passei a acessar em maio. Cheguei a ingressar com ação judicial no JEC e pressionar a operadora através da ANATEL. Entretanto, a intimação judicial chegou depois da solução do problema só quando eles resolveram atender minha reclamação sendo que a ID na agência reguladora de pouco adiantou senão para eu produzir uma prova e depois ganhar uma indenização de parcos R$ 1.000,00 recebidas mais de doze meses após ter ingressado com o processo no Juizado Cível. Acho que deve, como se diz no popular, "procurar seus direitos" ainda que os órgãos de defesa do consumidor não atuem de maneira tão satisfatória como gostaríamos que fosse.

Um abraço e ótima semana!