Dentre
os mecanismos psíquicos de defesa desenvolvidos por Freud um, muito
usado, para defender ou escamotear interesses individuais e de grupos que se sentem
em posição desconfortável, é a racionalização,
geralmente, bem articulada em forma de discurso.
O
discurso, quase em tom de desespero, do sociólogo e ex-presidente da
república, FHC, realizado recentemente em forma de carta (dia 20), se
enquadra muito bem nessa categoria freudiana. Na verdade, esse tipo de discurso de última hora, quando o barco está a naufragar, tem,
por incrível que pareça, a função de proteger a pessoa declamante
ou o grupo com o qual se identifica. Não é à toa que a
psicanálise reza que no lado avesso do discurso elaborado sob forte
ressentimento(a carta de alerta dirigida aos eleitores) reside o medo
do autor perder algo de si ou para si que ele considera de crucial
valor ou importância.
Em
meio ao pedido de socorro vindo de altos escalões de nossa
república, alguns, de forma escancarada (em nome de uma suposta
paz), incitam a renúncia de um dos dois principais postulantes ao
cargo de presidente da república, como a melhor das soluções.
Dizem até: a pátria em situação de extrema gravidade está a
exigir o sacrifício de um dos que estão em primeiro lugar nas
pesquisas. Aqui, é bom que se ressalte: o mecanismo de defesa
psíquica interessa ou favorece mais ao autor da carta de alerta fora
de tempo, movido, pelo menos inconscientemente, por um sentimento de
culpa.
Freud
descobriu a nascente desses mecanismos de defesas: eles têm origem
na infância e perduram por toda a idade adulta. Foi a partir do pai
e contra ele (como autoridade patriarcal) que a criança em tenra
idade iniciou o desenvolvimento de todos os tipos de defesa, como:
introjeção ou recalque, negação, projeção, reação e a tal
racionalização. Desde a aurora de nossas vidas fazemos uso desses
mecanismos de defesa que, da instância do Superego (Pai simbólico
ou imaginário), nos ameaça punir com a culpa diante das astúcias
do ego.
A
expressão popular ―
“discurso da boca para fora” ─,
em ocasiões sombrias, quando o jogo jogado se encontra aos 40
minutos do segundo tempo, tem lá a sua razão de ser dita. “Os
humanos têm uma forte necessidade de viver em grupos, próximos um
dos outros. Mas essa necessidade entra em conflito com sua
agressividade inata e seu desejo de se satisfazer egoisticamente.
[..] Para muito de nós, a tentativa de reduzir a culpa,
evitá-la ou expiá-la é um importante motivador” (Michael
Kahn – “Freud Básico” – Editora Civilização Brasileira).
Como
a História é cíclica, basta dirigir o olhar para trás, a fim de
perceber que não só em nossos adversários, como em nós mesmos, e
entre nossos amigos, esse fenômeno chato e doloroso está
repetidamente sendo recriado. Interessante, é que dois dias após sua carta-discurso, FHC veio a público afirmar pelo Twitter que sua carta tinha sido dirigida ao
povo, e não aos partidos (às cabeças pensantes responsáveis pela
sopinha de letras que inunda o país). E aí, a emenda saiu
pior do que o soneto, pois, o sociólogo incorreu em mais dois
mecanismos de defesa muitíssimo estudado por Freud: o de negação
e o de projeção. O tom da carta deu a impressão de uma mera forma de negar (junto às altas
cúpulas) ser responsável pela atual situação vexatória; situação que, ao contrário de sua argumentação de fundo defensivo, foi obra executada em seus minimos detalhes, de cima
para baixo. Pasmem: através do mecanismo de projeção pôs
toda a culpa na conta do povo, com essa infeliz frase, endereçada aos
eleitores: “Ainda há tempo para deter a marcha da
insensatez”
Faltam
poucos minutos para o término da partida: agora, é só esperar,
para ver o resultado daquilo que foi plantado entre nós. Espernear não adianta. O choro
pelo descaso e a indiferença para com o sofrido povo,
inevitavelmente, não vão trazer de volta o leite derramado.
Por Levi B. Santos
Gurabira, 23 de setembro de 2018
OBS:
Imagem do Topo: "O Inconsciente é a Verdadeira Realidade Psíquica" ― Sigmund Freud (1856 - 1939) ― O Livro da Psicologia ― GloboLivros
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