08 janeiro 2014

A Era do “Homus Ciberneticus”




A internet veio para ficar. Veio para moldar e alterar definitivamente a vida das pessoas. De tão invasiva, parece até que ela tomou para si a máxima divina da cristandade: “...E estarei convosco até a consumação dos séculos”. No entanto, algumas dúvidas sobre possíveis efeitos adversos da evolução tecnológica cibernética estão a nos incomodar:

●Será que algum dia os computadores substituirão os professores, na tarefa de formar e informar seus alunos?

●Será que nos tornamos dependentes dos manuais de informação para tudo quanto é área do conhecimento?

●Será que a enorme gama de “pratos feitos” no espaço cibernético não vai, um dia, provocar uma indigestão cerebral incurável, com a nefasta conseqüência: a de castrar a nossa capacidade de pensar e concatenar nossas próprias idéias?

As descobertas e informações ocorrem numa velocidade tão intensa, que num futuro próximo, talvez não haja mais o que se debater ou escrever, pois tudo já estará registrado nos bancos de dados do espaço virtual. Ou seja, tudo o que viermos a pensar ou imaginar, já foi pensado e escrito nos sites de pesquisas, como o do gigantesco Google. Parece que chegou o tempo em que meditar, refletir e examinar as coisas demorada e minuciosamente passaram a ser operações mentais ultrapassadas. Os bancos de dados disponíveis nos computadores estão aí, a exercer forte atração sobre as pessoas, estimulando-as a um simples toque digital resolverem de forma rápida ou instantânea o que pede a mídia tecnicista.

É do conhecimento de todos que os novos meios interativos de comunicação, como nunca, vêm investindo na área infantil. Crianças de três anos de idade já manejam seus tablets com uma agilidade comparável a de um exímio pianista dedilhando as teclas de seu instrumento. Empresas como a “Kidscom”, por exemplo, em seu questionário faz uma fatídica pergunta, a ser respondida por meninos e meninas: “Quem você quer ser quando crescer?”. “Quando se trata de atitudes e opiniões das crianças, anuncia o folheto de propaganda dessa empresa, a Kidscom tem as respostas” ― assim, escreveu Russel Jacoby, no sexto capitulo, sob o título ― “Sanidade a Varejo e Loucura por Atacado” ― do seu livro, “O Fim da Utopia (Editora Record).

O livro, Drop Dead Healthy” (Morto de Saúde), editado em 2012 nos EUA, mostra a que ponto chegou a obsessão cibernética. “A. J. Jacobs, de 45 anos, tomou a iniciativa de ser o homem mais saudável do planeta: Primeiro construiu um pedômetro, destinado a contar seus passos nas caminhadas. Depois inventou uma pulseira para registrar as suas atividades físicas rotineiras, como lavar louças. Uma faixa presa a cabeça para coletar as ondas cerebrais, e enquanto dorme, registrar a qualidade de seu sono. Baixou vários aplicativos de smartphone com o qual mede as calorias consumidas num único dia[...]. Com isso conseguiu emagrecer sete quilos, controlou seu colesterol e ficou com uma saúde de ferro. Porém, no fim do experimento, percebeu que estava dando pouco tempo e atenção a sua família, quase virando um paranóico”. (Vide reportagem “A Tecnologia Que Vestimos” ― Revista VEJA – Edição 2353).

Outro crítico e escritor ― o estadounidense, Sven Birkerts ―, explica bem os efeitos deletérios da cybercultura, ao dizer: “trocamos a reflexão sobre um problema pelo acúmulo de informações a respeito [...].Quando o impulso eletrônico é que manda, quando a psique é condicionada a trabalhar com dados, a experiência do tempo profundo torna-se impossível. Sem tempo profundo não há ressonância; sem ressonância não há sabedoria.”

Ainda sobre a Sociedade Cibernética, o renomado psicanalista, Joel Birman, segue o mesmo diapasão critico, em seu livro, “Estilo e Modernidade em Psicanálise” (pág. 218): “A linguagem na era cibernética não quer dizer mais nada e não implica num pacto sagrado entre os sujeitos [...]. Revela-se assim a impossibilidade de qualquer encontro, mesmo no momento crucial da morte. Esta não é mais um espaço possível para comunhão humana [...]. Nem a morte pode mais os reunir, pois eles se transformaram em autômatos no seu autocentramento narcísico, aprisionados nas suas invenções tecnológicas desvitalizantes”.

Será que, inapelavelmente, estamos todos condenados a nos transformar em uma nova classe ― a do “Homus ciberneticus” ― aquela formada pelos que já vivem em clausura de frente para a telinha, e já não mais sente o cheiro do outro nem o arquejar de sua respiração, tornando-se imune ao olhar e ao toque do seu semelhante?


Por Levi B. Santos
Guarabira, 08 de janeiro de 2014

Site da Imagem: filosofiacienciaevida.uol.co

10 comentários:

Dilmar Gomes disse...

Pois é, parece que a humanidade está entrando num caminho perigoso.
Um abraço daqui do sul do Brasil.

Arivanio disse...

Caminhando hoje a tarde nas várias
trilhas do Jardim Botânico, pudemos sentir, o contrário de tudo isto: a
Natureza !

Arivanio disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
fransciscosolangefonseca.blogspot.com disse...

Francisco Solange Fonseca Levi o meu medo é que daqui alguns anos, nao muito remoto, seja criado um mundo de neuróticos. a iternet nos está distanciando de maneira assustadoura, não há mais dialogo entre as pessoas, os visinhos, a propria familia que é a base da sociedade será que o mundo está caminhando para uma loucura coletiva?

Matheus De Cesaro disse...

Nobre Amigo Levi,

Muito pertinente seu artigo, parabéns. Uma abordagem extremamente ligada a realidade que estamos vivendo nestas duas primeiras décadas do Século XXI. Mas o que me chamou a atenção em seu texto foi as fontes utilizadas, que me parecem ser todas americanas. Isso torna a situação ainda mais preocupante, pois foram os americanos que alavancaram a tecnologia, e a colocaram como uma grande "benção divina" que estão demonstrando uma preocupação em relação as consequências sociais que surgem por meio da má utilização da tecnologia. Mas vou me deter as três questões que você levantou no seu artigo.

"Será que algum dia os computadores substituirão os professores, na tarefa de formar e informar seus alunos?"

Eu espero que não. Mas com certeza, mesmo que não sejam substituídos (professores), serão pouco utilizados. E assim ainda mais desvalorizados.

"Será que nos tornamos dependentes dos manuais de informação para tudo quanto é área do conhecimento?"

Na verdade sempre fomos. O que mudou, foram as técnicas, os meios, e principalmente a velocidade com que adquirimos e encontramos informações.

Será que a enorme gama de “pratos feitos” no espaço cibernético não vai, um dia, provocar uma indigestão cerebral incurável, com a nefasta conseqüência: a de castrar a nossa capacidade de pensar e concatenar nossas próprias idéias?

Sobre isso, no século XIX onde os livros eram o grande 'aham' do conhecimento e em grande parte disponível somente as classes burguesas, Schopenhauer em "A Arte de Escrever" já demonstrou tal preocupação, imagine agora, onde em um piscar de olhos se produzem especialistas em tudo. Estamos sim sujeito a uma produção de pseudo especialistas do conhecimento, e a mercê desta tal indigestão cerebral.

Abraço Levi.

Eduardo Medeiros disse...

Levi,

cada época tem seus desafios. O nosso ao que parece, será como disse o Matheus, "não morrer de indigestão cerebral" devido à grande quantidade de informação a qual estamos expostos, e por ser uma quantidade quase ilimitada, não temos mais tempos para refletir sobre.
Por outro lado, isso é uma verdadeira revolução. O conhecimento pode estar a apenas um clique de quem souber usar bem a rede.
As crianças de 3 anos de hoje, sinto que são mais inteligentes que às de tempos atrás.
Meu filho com dois anos já se interessava em mexer no computador e hoje, com 3 anos, aprendeu sozinho os números de 1 a 10 e o alfabeto em inglês...tudo por que ele mesmo achou vídeos que ensina inglês para crianças no Youtube.
Quando que eu, aos 3 anos, saberia dizer o alfabeto em inglês? Ora, nem em português...rsss

Enfim, a reflexão deve ser contínua; não podemos deixar que a enxurrada de informação nos leve a calma e o tempo que a reflexão requer e nem que o intermediário virtual nos leve o contato humano cara a cara.

Levi B. Santos disse...

Francisco Solange, Edu e Matheus


É preciso muito equilíbrio para não nos tornarmos dependentes demais desse dedilhar fantástico que nos proporciona prazer ao mínimo esforço.

Um dia desses, fui almoçar na praça da alimentação do Manaíra Shopping de João Pessoa, que estava com suas mesas quase que totalmente ocupadas. Em conversa com minha esposa, pedi para ela dar um a olhada ao redor. E não é que em todas as mesas, sem exceção, havia dois ou três jovens com os olhos e os dedos em seus tablets ou smartphones, perto, porém completamente distantes de alguns parentes que trocavam palavras, ao lado. Alguns, enquanto comiam não se desgrudavam do celular, ao invés de colocá-lo ao lado do prato. Algumas mães de olho nas minitelinhas e outras com fios nos ouvidos nem ao menos prestavam atenção na algazarra de suas crianças.

E, eu, saudosista, do tempo em que jogava conversa fora nessas ocasiões, me senti triste e escanteado. É, talvez eles estejam certos, e eu seja mais um daqueles antiquados que não entende o mundo de agora. (rsrs)

RODRIGO PHANARDZIS ANCORA DA LUZ disse...

Boa noite, Levi!

Muito bom o tema!

Como disse o sábio Albert Einstein, "eu temo o dia em que a tecnologia ultrapasse nossa interação humana, e o mundo terá uma geração de idiotas".

Será que esse futuro prodigioso já não chegou?!

Eduardo Medeiros disse...

Levi, esse talvez seja o lado negativo de toda essa onda; é a ditadura do "estar online". Esses dias mesmos vieram aqui para casa alguns sobrinhos da minha esposa e três deles estavam com seus tablets. Os demais, que não possuem essa telinha mágica, se aglomeravam ao redor dos três tentando a oportunidade de dar também umas dedadas na telinha ("dedada" soou mal, né? kkkkkk)
E eu, passando e vendo aquilo, pedi: gente, desliga um pouco os tablets e vão brincar! rss

Levi B. Santos disse...

Eduardo, o seu comentário foi nota dez.

O Título desse ensaio deveria ser, como você escreveu: "A Ditadura do Estar Online" (rsrs)