Ela,
a sempre Neurociência, não cessa de escavar os nossos cérebros na tentativa de
desvendar o porquê de certas atitudes
e comportamentos que adquirimos durante nossa trajetória existencial.
E
não é que, recentemente, neurocientistas andam a conjecturar sobre a existência
dos genes da ideologia?
O
antropólogo e evolucionista americano, Avi Tuschman — autor de "Nossa Natureza Política: A Origem Evolutiva do Que Mais Nos Divide" — disse, em uma entrevista nas páginas amarelas da revista Veja da semana passada, "que
cientistas pesquisadores da Universidade College London, escanearam cérebros de estudantes através da ressonância
magnética e, pelas imagens obtidas, conseguiram prever quais alunos eram mais
conservadores e quais eram mais liberais. Aqueles identificados com os valores
de direita possuíam uma área do cérebro, amígdala cerebelosa direita mais desenvolvida[...]. Já aqueles estudantes que se identificavam com valores relacionados à esquerda apresentavam
outra região cerebral mais desenvolvida — o córtex cingulado anterior”.
Quanto a esses fenômenos, seria importante esclarecer o que é causa, e o que é consequência, em analogia à velha pergunta: "Quem veio primeiro, o ovo ou a galinha?"
Neurocientistas trabalham com a hipótese de
que o alinhamento ideológico(conservador e liberal) seria conseqüência ou decorrência de uma diferença estrutural cerebral existente em cada
um dos grupos. E se a maneira de ser do indivíduo adulto forjada lá na sua tenra infância, pesando nisso a sua formação ambiental, paterna, cultural ou mesmo de fundo religioso forem a causa, e não consequência, de tais modificações em
determinadas áreas do cérebro? Segundo Freud, a carga afetiva e reações psíquicas
defensivas da criança nos seus quatro ou cinco primeiros anos de vida são
cruciais para a formação de sua personalidade. Por essa época, tanto a
submissão quanto a rebeldia a uma autoridade exercem um fascínio incomum sobre
o infante. O rebelde de ontem não seria o rebelde e liberal de hoje? O submisso e medroso de ontem não seria o precavido
e conservador dos dias atuais? Ou o que denominamos "ser liberal" e "ser conservador" são fases que se intercalam, ao sabor das circunstâncias, em nosso caminhar existencial? No
clássico, “Os
Irmãos Karamazov”, Dostoiévski mostra que a contradição
faz parte da natureza humana. O filósofo e ensaísta, Luiz Felipe Pondé,
fazendo uma abordagem sobre a obra desse autor russo, chegou a afirmar: “Não é possível descrever o ser humano,
categorizá-lo, prendê-lo; só se pode ouvi-lo.”
“O que é você? Uma conservadora? Uma Liberal?" — perguntou, certa vez, um entrevistador a famosa e polêmica filósofa política de origem judia, Hannah Arendt, naturalmente, querendo saber de que lado ela militava. “Não sei. Eu realmente não sei e nunca soube. Você sabe que a esquerda pensa que sou conservadora, e os conservadores às vezes pensam que sou de esquerda” — respondeu, de forma desconcertante e lúcida, a entrevistada.
“O que é você? Uma conservadora? Uma Liberal?" — perguntou, certa vez, um entrevistador a famosa e polêmica filósofa política de origem judia, Hannah Arendt, naturalmente, querendo saber de que lado ela militava. “Não sei. Eu realmente não sei e nunca soube. Você sabe que a esquerda pensa que sou conservadora, e os conservadores às vezes pensam que sou de esquerda” — respondeu, de forma desconcertante e lúcida, a entrevistada.
“Freud
chegou à Ciência como um rebelde — ainda que fosse, politicamente moderado, liberal, ligeiramente conservador e não tivesse simpatia por
bandeiras vermelhas e barricadas” — afirmou Zigmunt
Bauman, para realçar a ambivalência reinante em nossas decisões (Modernidade
e Ambivalência — Editora Zahar). O homem é ambivalente porque apesar de
latejar em si o ideal liberal, não deixa de sofrer influência de seu lado conservador
inconsciente e reprimido.
“Um superego amistoso, benevolente e útil,
seria a solução ideal, como contraponto ao superego que age de forma tirânica e
ameaçadora”— fez ver Freud, com relação ao
teimoso liberal e ao passivo, temeroso e subserviente.
Em
suma, a psicanálise e a neurociência não são totalmente inconciliáveis, apesar
de divergirem em suas abordagens. Não podemos negar que existe certo consenso
entre esses dois campos científicos, que exploram os nossos afetos ambivalentes:
“Há uma tendência de nos tornamos mais
conservadores à medida que envelhecemos” — concluiu, Avi Tuschman, em sua
entrevista à revista Veja —, em consonância com a frase atribuída ao grande
estadista e médico francês, George Clemeceau, contemporâneo de Émile
Zola:
“Um homem que não seja comunista aos
20 anos não tem coração e um homem que permaneça comunista aos 40 não tem
cérebro.”
Por Levi B. Santos
Guarabira, 22 de janeiro de 2015
Site da Imagem: fotosearch.com.br
2 comentários:
“Um superego amistoso, benevolente e útil, seria a solução ideal, como contraponto ao superego que age de forma tirânica e ameaçadora”— fez ver Freud.
Enxergo o sentido nestas palavras de Freud como solução aos movimentos socialistas que paradoxalmente desandam para a repressão.
Caro Gabriel Correia
Todo engajamento político vai contra a ética da psicanálise.
Tomar partido significa, mais do que tudo, se identificar com um dos pólos dos nossos desejos ambivalentes, em detrimento do outro lado (que passa a ser reprimido)
A psicanálise não promete essa tal felicidade (política) centrada no princípio do prazer. Os discursos de direita e esquerda têm a mesma matriz — eles ressoam em nós a ambivalência produtora de conflitos. Conflitos esses, experimentados pela primeira vez em tempos imemoriais, quando afetos de amor e ódio, eram exteriorizados frente a nossos coleguinhas, mestres e pais, em nossa tenra infância.
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