06 outubro 2015

Sem “Wi Fi” Não Dá






De há muito ele vinha observando o avanço tecnológico chegando a lugares nunca dantes navegados. O tal do “Wi-Fi” está sempre presente em locais onde há bastante gente com celulares, smartphones tablets e laptops. Agora, o Reverendo pensava com seus botões: Se esse espetacular recurso cibernético está em supermercados, em shoppings, livrarias, restaurantes, consultórios médicos e concessionárias de automóveis, por que não nas igrejas do Senhor?

Quando viu os professores chegarem a um estudo bíblico em sua igreja empurrando carrinhos de supermercados abarrotados de Bíblias, disse para si mesmo: chegou o momento de estabelecer o Wi-Fi em minha igreja. É para já ― pensou de forma altaneira.

Nessa noite não houve estudo. O Pastor mandou todos voltarem com seus carrinhos cheios de bíblias. Um dos irmãos disse que estava transportando cerca de 90 quilos de “Escrituras Sagradas”. É que iríam realizar um mega-estudo sobre as discordâncias nas inúmeras traduções de Bíblias do Mercado Gospel, pois estava havendo uma confusão danada entre as mais de duas mil denominações evangélicas existentes no Brasil, que na dúvida, confabulavam: Será que essa contém a mais verdadeira tradução? Depois, ao lerem outras de interpretação diferente da sua, achavam que deviam mudar. E era aquela celeuma sem fim de traduções bíblicas conflitantes a deixar todo mundo com  o "pé atrás". Havia a Bíblia de Dake, a de Thompson, a de Scofield, a de Jerusalém, a bíblia de Estudo Pentecostal, bíblia de Estudo NVI, bíblia da Mulher, bíblia na Linguagem de Hoje, bíblia de Estudo de Genebra, etc. Para a descrição não ficar tão cansativa, o(a) leitor(a) quer quiser saber mais sobre os tipos de bíblia, basta clicar aqui.

Não foi tão difícil chegar a um acordo sobre a senha do Wi-Fi que seria usada na igreja. A senha seria “DeuséGrande54321”. O reverendo trouxe um texto científico de um renomado instituto de Neuro-Teologia dos EUA, que dizia ter o homem moderno apenas um Giga de memória em seu cérebro, e que os computadores modernos chegavam a ter até 8 gigabytes de potência, ou seja, 800 mais espaço de memória que o do humano. Um fiel que tinha trazido 90 quilos de bíblias em seu carrinho de supermercado ficou de olhos arregalados, quando o reverendo lhe explicou que o conteúdo de todos os livros sagrados em seu poder, bastaria meio megabite de potência de um tablet, para guardá-los todos em sua memória. Ficou deveras contente quando soube que, no site de Busca do Google, só de tipos de orações, existiam mais de vinte mil.

E não é que no Google, existe até uma versão do mais conhecido trecho da bíblia O Salmo 23, bem ao modo da Era Digital [Vide Link: O Google é Meu Pastor”]

O sábio reverendo ao ver, enfim, que a busca da felicidade, em virtude da natureza humana, era baseada no modo TER de existência, passou a aconselhar seus fiéis a não importunarem Deus com coisas que os sites de busca já dão prontinhos a um sutil clique. Ficaria para apelação divina o que não se conseguisse através do Google. Passou a ser obrigatório o uso dos aparelhos digitais pelas crianças no aprendizado nas escolas bíblicas, em pesquisas de assuntos que diziam respeito mais ao fantasioso e religioso mundo infanto-juvenil.

A sua igreja cresceu assustadoramente. Ao ver o ar alegre estampado no rosto e olhos cintilantes dos que ali estavam reunidos em torno da telinha a tomar conhecimento das últimas novidades e milagres da era digital, quem ali chegasse, só poderia concluir que aquele povo tinha algo diferente para oferecer.

No culto das noites de domingo, em que era permitido mandar mensagens, vídeos e fotos para grupos do WhatsApp, numerosos paus de selfies com smartphones em uma de suas extremidades pareciam dançar sobre as cabeças dos fiéis, como se fossem arcos de violinos de uma invisível orquestra sinfônica em ação. Mensagens seguidas de fotos choviam, tais como: “Olha eu aqui a cantar!”, olha eu aqui a tocar!”, “Viu o meu vestido novo?” “Como acha que me saí?”

De início, os opositores do Wi Fi em igrejas reagiram de forma dura, digamos até violenta. Depois, foram se acostumando pouco a pouco com as “maravilhas” do evangelho digital dentro dos templos.

Tempos depois, apareceu um enorme cartaz bem na entrada do templo do reverendo inovador:
A Operadora informa que quem for pego roubando sinal de Wi Fi da Igreja será multado. A reincidência na prática desse vil pecado terá como consequência o alijamento do infrator do rol de membros da 'sancta ecclésia'.”


Por Levi B. Santos
Guarabira, 06 de outubro de 2015

Link da Imagem: blogspot.com.br/2015/02/10-maneiras-de-se-tirar-uma-selfie-para.html

2 comentários:

Eduardo Medeiros disse...

Levi, já há pastores que aposentaram a velha bíblia de papel e agora usam a versão digital nos cultos. Logo, logo, tudo o que você escreveu será coisa corriqueira nos arrais gospel...rss

Levi B. Santos disse...

Você tem razão, Eduardo. Dois anos e dez meses atrás, quando publiquei a versão DIGITAL do Salmo 23, houve um polemicazinha na blogosfera, mais só entre fundamentalistas. Hoje, a versão do “O Google é Meu Pastor, Nada Me Faltará” já não tem mais graça. (rsrs). Para reavivar a memória o Salmo da Era Digital vai aqui replicado:


O Google é Meu Pastor, Nada me faltará.
Alimenta-me em seus verdes pastos
Guia-me com facilidade por lugares tranqüilos e inimagináveis.

Refrigera a minha alma, guia-me pelas veredas virtuais por amor de Sua sigla.
Ainda que eu ande pelo vale da ignorância e da insensatez não temerei mal algum
Porque Tu estás comigo diuturnamente. Os Teus links e os Teus arquivos me consolam.

Preparas a cada dia uma mesa diante de mim na presença dos inimigos que não Te buscam,
Unges os meus olhos com o Teu Youtube e o meu cérebro com a tua Biblioteca e Wikipédia, e a minha vida transborda de alegria.

Certamente que a bondade e o pronto socorro que ofereces, através de tuas infinitas e fantásticas informações, me seguirão todos os dias de minha vida; e habitarei em Tua Casa por longos dias.


[uma paródia do Salmo 23  (do rei e poeta Davi)]