No
momento em que a sociedade, especialmente na figura dos três Poderes
da República, exibe uma confrontação na “base
do quem pode mais?”,
nunca é demais lembrar uma
emblemática invenção
ocorrida no
século XVII:
“Se
hoje comemos com facas de ponta arredondada —
e um dia ela já foi pontiaguda —,
devemos isso ao cardeal Richelieu. Ele mandou arredondar a ponta das
facas para que os nobres participantes dos banquetes não se
cutucassem indevidamente”.
Dois
grandes
banquetes
acontecerão
em nossa
republiqueta:
Um na quarta-feira (dia 11) no palco do STF, e outro na quarta-feira
seguinte (dia 18) na Arena do Senado. Há quem acredite que o
espírito do cardeal Richelieu vai
baixar nas duas mega-atrações gastronômicas. O nó é que no país
“eminentemente cristão”, como acontece
sempre
nos grandes embates futebolísticos, se espera que Deus dê uma
mãozinha ou vitória para um dos lados.
Um
argumento do rabino, Nilton Bonder, da congregação Israelita do
Brasil, cai bem nesses tempos agudos
de
guerra de egos. Ele dizia que o Triunfo representava
a mais efêmera das seguranças. Baseando-se nos embates dos judeus
com assírios, gregos, romanos, bizantinos, cruzados e otomanos,
concluiu
que a vitória é uma metáfora recorrente de que o vencedor de hoje
é
o derrotado de amanhã.
“Não
haverá paz enquanto ambos, ou melhor, todos os lados interessados
não forem derrotados. Uma
derrota na expectativa de triunfo de todos é a única esperança.”
—
finalizou,
de forma contundente, o rabino em
seu ensaio - “Tolerância e o Outro”. [Judaísmo
Para o Século XXI – Jorge Zahar Editora]
Mas
voltemos a nos deter sobre a metáfora —
“faca
pontiaguda”
—,
dos banquetes recém-encomendados
em nosso efervescente mundinho político. Essa expressão metafórica
me trouxe a lembrança uma gíria, hoje, muito usada nas redes
sociais; trata-se
do termo “lacrar”.
Para os internautas, essa
expressão
representa
a última fala ou a última palavra a ser dita para lacrar ou fechar
determinada discussão ou debate. O
que o ente virtual das redes talvez não saiba é que a
estocada da faca pontiaguda, provavelmente, não será fatal, pois,
sobre o que for decidido, o tempo logo se encarregará de cicatrizar
a ferida narcísica. Isso significa que nenhum
debate/embate
pode ser encerrado por força de um argumento; ainda
mais quando se sabe que em tempos de contaminação ideológica, esse
vírus cerebral endêmico, anda a invadir as cabeças dos
mais destemidos baluartes de
nossa “democracia
tupiniquim”.
Para
o psicanalista Jacques Lacan, há sempre um furo, da ordem do
indizível, naquilo que se declara como verdade, ou seja, “quanto
mais o sujeito tenta resgatar a si mesmo, buscando a verdade de sua
conduta, mais depara com algo não seu, que vem do outro”.
Pensando
bem, é em momento de severas crises ou de graves tensões, que
poderosas influências ou ressonâncias vindas dos recônditos do
nosso aparelho psíquico, afluem para o terreno escorregadio da
consciência, como se estivessem a desmentir a nossa lógica comum de
que somos seres imparciais.
Ainda
divagando sobre a metáfora “faca
pontiaguda” (ou
espada), nunca é demais lembrar o
mitólogo americano, Joseph Campbell
que,
embasado na psicologia junguiana resumiu
tudo o que aqui escrevi, de uma forma
maravilhosamente
cristalina:
“No
Reino humano, abaixo do solo do comparativamente ordeiro e
pequeno recanto que chamamos consciência,
encontram-se insuspeitas cavernas de Aladim”.
Por
Levi B. Santos
Guarabira,
09 de outubro de 2017
Site da Imagem:eventbrite.com.br/blog/pre-evento/mais-estilos-de-montagem-para-seu-evento
2 comentários:
Caro Levi,
Confesso que ainda estou me esforçando para compreender melhor as metáforas que escolheu.
Mas confesso que de tempos em tempos, as pessoas sentem falta das facas pontiagudas capazes de causar ferimentos sangrentos.
O problema é que o "sangue" não satisfaz. Pois hoje, mesmo com tantos corruptos indo em cana pela caneta dos juízes da Lava Jato, o brasileiro continua desejando mais.
As colocações do rabino são bem sábias. E os que se julgam acima da moral, deveriam também se reconhecer corruptos ao invés de projetarem apenas sobre os políticos e os criminosos aquilo que há em todos.
Sedo seres parciais e oscilantes, nossas escolhas nunca serão perfeitas porque o desejo inconsciente e mal trabalhado de tirar vantagem pessoal muitas das vezes cega o entendimento de modo que a grande maioria continua sendo um bando de orelhas secas.
Infelizmente, parece ser a regra: A sociedade está sob a égide do mais forte.
Não sei se alguém se lembra da propaganda do cigarro Vila Rica, que ficou conhecida entre nós, como a Lei do Gerson: A grande estrela do futebol de tempos atrás dizia com sorriso, de canto a canto da boca, na TV: “Faça como eu, que gosto de levar vantagem em tudo”. Um arquétipo demasiadamente instintivo (rsrs)
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