21 outubro 2018

VIAGEM IMAGINÁRIA AO IMPÉRIO DO MEDO



Quadro “O Grito” de Edward Munch


Enquanto escrevo essas linhas, jornalistas da Globo News no programa “Central das Eleições” discutem, alvoroçadamente, sobre a pesquisa mais recente do “Datafolha”, contendo dados estatísticos sobre o medo de implantação de uma futura ditadura no Brasil. A pergunta feita ao eleitor foi essa:

Qual a chance de haver uma nova ditadura no Brasil?

A resposta mostrou o país rachado: 50% tem medo de que a ditadura volte.

Em época que a mídia trata de explorar o medo entre os eleitores, nada melhor que recorrer ao sociólogo, Zygmunt Bauman, e refletir um pouco sobre o que ele diz no trecho, abaixo, de sua obra Vida Liquida”:

a vida na sociedade líquido-moderna é uma versão da dança das cadeiras, jogada para valer. O verdadeiro prêmio nessa competição é a garantia (temporária) de ser excluído das fileiras dos destruídos e evitar ser jogado no lixo”.

Ainda, no tocante ao medo, gostaria que respondessem a essa pergunta:

Vocês sabem por que o filme Titanic atraiu tanta gente, chegando na época a superar todos os recordes anteriores de bilheteria? Na verdade, quem pergunta e ao mesmo tempo responde, em forma de metáfora, é Jacques Attali:

O Titanic somos nós, nossa sociedade triunfalista, autocongratulatória, cega e hipócrita, sem misericórdia para com seus pobres uma sociedade em que tudo está previsto, menos os meios de previsão… Todos imaginamos que existe um iceberg esperando por nós, oculto em algum lugar no futuro nebuloso, com o qual nos chocaremos para afundar ouvindo música… .
Attali, identificou vários icebergs: financeiro, nuclear, ecológico, social e o proveniente do fundamentalismo religioso,” (Zygmunt Bauman – Medo Líquido).

Não poderia, de maneira alguma, deixar de trazer à tona o maior pensador e dramaturgo do século XX, o alemão Bertolt Brecht. Ele diz algo que vem bem a calhar com o sentimento de medo que, por ora, domina os corações da geração dos ex-colonos de Portugal. Da sua memorável comédia “De Nada, Nada Virá” , trago um trecho que,(quem sabe?), pode funcionar como um calmante ou antídoto contra a neurose coletiva que domina atores de diversos escalões da sociedade:

O PENSADOR:
Vou pensar alto, o que querem representar, se isso não atrapalhar o meu próprio pensamento?

OS ATORES:
Vamos apresentar a vida dos homens entre os homens

O PENSADOR:
O que querem provar com isso?

OS ATORES:
Não sabemos, o que você acha que poderá ser provado, se apresentarmos a vida dos homens entre os homens?

O PENSADOR:
De Nada, Nada Virá.

OS ATORES:
???

Podem até considerar que o que eu vou dizer aqui é coisa de louco. Mas, como é livre a expressão do pensamento, quero dizer ao nobre leitor(a), que o meu pessimismo parece, hoje, ter dado lugar a um incipiente otimismo (o otimismo dos atores da comédia de Brecht – rsrs).
Mas não ria não! Console-se. Pensando bem, vejo que os navios de grande calado, hoje, bem mais reforçados do que os de 1964 navegam pela mesma rota que passou o velho Titanic, sem, no entanto, correrem o perigo de se desmancharem frente a choques de média intensidade (Marolas ou marolinhas, na linguagem do velho timoneiro, Lula).

Ademais, não custa lembrar que, logo logo, chegará o Natal, depois vem a festa do reveillon, e mais um pouco a frente, o Carnaval. Por esse tempo todo, podem ficar certo, não haverá grandes navegações em alto-mar, pois, os navegadores (comandantes) estarão todos gozando férias prolongadas. Ou não estão lembrados que o Brasil, como é de costume, só começa a funcionar depois da Páscoa?. Até lá, não vai haver perigo de afundamentos de navios nem afogamentos de passageiros. Haverá, sim, por esse período de tempo, uma acomodação geral e irrestrita. Nesse ínterim, os derrotados de ontem se abraçarão com os vitoriosos de hoje em Copacabana na festa de fogos, ou mesmo na Sapucaí. E o povão, feliz da vida, poderá ver pela TV os componentes dos blocos partidários (ou sopinhas de letras) a torcer, efusivamente, por suas escolas de sambas financiadas com dinheiro público.

E o Império do Medo, então, se transformará em Império da Alegria. Os de togas, os de paletós e os vestidos de roupas de militares sairão de braços dados com os fantasiados portando armas de brinquedos, numa algazarra, aos olhos de muitos, irracional. Foliões, desfilando com máscaras de todos os que concorreram à Presidência da República, se deleitarão num clima de pacificação jamais visto nas terras de Santa Cruz.

Falou o profeta, que hoje, se encontra sem medo e de bom humor.

Despeço-me, não sem antes, a título de alerta, deixar aqui para cristãos e não cristãos, uma máxima do apóstolo Paulo, considerado o fundador do cristianismo: “Queres tu, pois, não ter medo da autoridade? Faze o bem...” (Romanos 13: 3)


Por Levi B, Santos
Guarabira, 21 de outubro de 2018


3 comentários:

Rodrigo Phanardzis Ancora da Luz disse...

Caro Levi,

Tomara que esteja certo se, na hipótese do coiso ganhar, toda essa polarização política agora exaltada dissolva-se num maravilhoso samba. De preferência com bastante maracatu...

Entretanto, vejo que serão quatro anos de conflitos e o próprio Carnaval, nos anos seguintes, com a aprovação de uma nova lei orçamentária para 2020, tende a ser menos animado já sem o Ministério da Cultura e menos recursos vindos do governo federal.

Porém, passada a Páscoa de 2019 e chegando o dia 1º de maio, já teremos os primeiros movimentos de trabalhadores reivindicando melhores condições ou se opondo a alguma reforma impopular (coisa que os governantes fazem logo no início). Inclusive no toante aos servidores federais. Com mais de 100 dias governando, já terá sido terminada a lua de mel entre o eleitor e o coiso.

Paralelamente, veremos conflitos sendo criados quanto à "ideologização" nos ambientes públicos e de ensino, através da "escola sem partido". Índios e quilombolas enfrentarão dificuldades para demarcarem as suas terras, assim como outros grupos minoritários da sociedade estarão também reclamando.

Em um ano, é possível que a popularidade do coiso esteja abaixo dos 50%. Ou, se depender de uma lenta recuperação da economia e havendo supressão de direitos, a aceitação dele ficaria menor ainda.

Sendo bem otimista, vejo que, em outubro de 2020, poderemos ter um indicativo de que o povo já estará arrependido das suas escolhas quando novos prefeitos das capitais brasileiras forem eleitos com uma provável vitória da esquerda em São Paulo. E, se isso acontecer, o coiso já não terá mais condições de implantar uma ditadura e a tendência será a perda do governo federal em 2022.

É certo que, na atualidade, tudo pode mudar com grande rapidez e para alguém implantar uma ditadura tem que contar com um amplo apoio dentro da sociedade. Hoje, com uma provável vitória do coiso, não haverá essa necessidade. Se ele perder, aí temo uma reação dos seus apoiadores que não aceitariam os resultados nas urnas considerando que teria havido fraude na votação.

De qualquer modo, sempre devemos ficar atentos visto que ainda não sabemos como será o governo do coiso. Se ele se mostrará um direitista conservador e democrático ou se irá armar algum golpe lá na frente. Porém, como aposto num desgaste de seu governo, penso que ele não terá o apoio necessário, valendo lembrar que a composição atual do Congresso, apesar das bancadas da Bíblia e da bala, será um impedimento para se mudar o Estado. Somente deverão dar governabilidade.

Levi B. Santos disse...

Mas Rodrigão, Você precisa entender que o "Coiso" não foi uma criação do povo. Foi sim parido pelos poderosos chefãos do sistema partidário atual,dentre eles FHC, Alckimin, Lula, e os do centrão (que agora já demonstram paixão pelo "Coi$o")

Veja o que diz Tasso Jeressaiti, ante a recusa do convite ao diálogo feito aos donos do PT, antes do primeiro turno:


O PT, porém, optou pela soberba. Arrogou-se senhor da razão em vez de reconhecer seus imensos erros na economia, na falta de condenação da opressão na Venezuela e na opção pela política de balcão" .

Leia, abaixo, na íntegra, o oportuno texto de Marcos Lisboa:


"ESNOBARAM O CONVITE AO DIÁLOGO"


Tasso Jereissati fez o gesto que o PT não quis entender



"Tasso Jereissati estendeu a mão. Pouco antes do primeiro turno, fez o que se tornou produto raro no debate público brasileiro: reconheceu erros.

Para quem é do ramo, o gesto deveria ser óbvio. Em tempos de polarização, ele convidou o PT ao diálogo.

Vale lembrar que se tornou governador ao derrotar os velhos coronéis do Ceará e fez uma gestão admirável, iniciando uma sequência de administrações que, décadas depois, conseguiu alguns avanços importantes em um país carente de bons exemplos.

Tasso, de fala mansa e convicções firmes, foi fundamental para a aprovação de muitas reformas no começo do governo Lula. Apesar de estar na oposição, jamais compactuou com a miudeza da política de ocasião que tem como objetivo único derrotar o adversário.

O primeiro Lula reforçou a política de estabilidade econômica e aperfeiçoou a agenda social iniciada por FHC. Ele teve o mérito adicional de, por meio do seu discurso, trazer os grupos mais vulneráveis, incluindo as minorias, para o centro da política pública.

Paulatinamente, porém, o governo deixou de dialogar com a oposição, optando pela aliança com pequenos partidos em troca de cargos. Sabemos das consequências.

Para piorar, a partir de 2008 resgatou o nacional-desenvolvimentismo tentado por Geisel e que nos levou à severa crise dos anos 1980.

O resultado com o PT não foi diferente. Fracassaram quase todos os grandiosos projetos iniciados sob a euforia do pré-sal, ainda na década passada. Apesar disso, lideranças do partido insistem em atribuir a crise recente aos erros cometidos após 2013.

A intervenção do setor de óleo e gás começou com Lula, assim como a expansão do crédito subsidiado e as medidas para estimular setores como a indústria naval. O fracasso imenso custou caro. Não se despreza a incompetência incomparável da gestão Dilma, mas Lula iniciou a agenda equivocada.

Em 2014, o governo abusou da expansão dos gastos públicos em meio a uma campanha eleitoral em que demonizou a oposição e prometeu uma coisa para depois fazer outra. O resultado foi uma ruptura que inviabilizou a reconciliação política e a reconstrução da economia.

Por tudo isso, surpreendeu a generosidade de Tasso ao estender a mão em um país dividido, onde ambos os lados têm medo da alternativa por boas razões.

O PT, porém, optou pela soberba. Arrogou-se senhor da razão em vez de reconhecer seus imensos erros na economia, na falta de condenação da opressão na Venezuela e na opção pela política de balcão.

Tasso fez o gesto que o PT não quis entender. Recusar o seu convite ao diálogo foi mais um exemplo da pequenez que nos trouxe a essa polarização disfuncional e preocupante."



[Marcos Lisboa
Presidente do Insper, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda (2003-2005) e doutor em economia].

LINK do Artigo:

https://www1.folha.uol.com.br/colunas/marcos-lisboa/2018/10/esnobaram-o-convite-ao-dialogo.shtml

RODRIGO PHANARDZIS ANCORA DA LUZ disse...

Concordo com a análise. O problema é que as consequências agora serão catastróficas para a política e para a área social. Interessante é que, em 2008, quando os EUA esteve em crise, nós passamos bem pelas dificuldades enfrentadas pelo mundo. Mesmo assim considero que erros já estavam sendo cometidos ali, mas que só tiveram consequências bem depois.