28 maio 2020

Quando o Nome de "Deus" é Envolvido em um Conflito Político-Ideológico





Este breve ensaio, bem que poderia ter o título, abaixo:

'Uso e Abuso do Nome de Deus para Fins Eleitoreiros'. [“Este povo me honra com os lábios, mas seu coração está longe de mim” Mateus 15:08]

Possuidora de uma vasta obra, entre as quais se destaca o antológico livro ─ “Adão, Eva e a Serpente”, a professora, de História da Religião na Universidade de Princeton, Elaine Pagels, foi partícipe da tradução de rolos encontrados em um vaso no subsolo do deserto da cidade egípcia de Nag Hammadi (provavelmente datados do século II d. C).

Em seu fenomenal livro ─ "As Origens de Satanás" ou “Um Estudo Sobre o Poder que as Forças Irracionais Exercem na Sociedade Moderna”, a historiadora faz referência a uma significante passagem destacada e traduzida desses rolos encontrados em 1945 no deserto de Nag Hammadi:

Conta-se que um cristão anônimo foi perguntado por um de seus discípulos sobre o que quisera dizer o grande apóstolo Paulo, quando advertira que ‘nossa luta não é contra o sangue e a carne, e, sim contra os principados e potestades, contra as forças espirituais do mal nas regiões celestes’ (Efésios 6:12). O mestre responde criando uma revelação secreta, intitulada ‘A Realidade dos Governantes’, a qual diz, eu enviei desde que perguntastes sobre a realidade dos governantes (cósmicos)”. Por causa de seu poder, ignorância e arrogância ele disse

Estás enganado Samael, isto é, “Deus dos Cegos”…

Elaine Pagels, ao tratar do “erro induzido por governantes sobrenaturais malignos, que se faziam passar por Deus neste mundo”, faz, acima de tudo, uma profunda reflexão sobre a ironia da condição humana, e seu intrigante legado de “amor” e ódio.

Toda vez que se envolve o nome de Deus numa luta Político-Ideológica entre irmãos com pensamentos diferentes ou opostos na perspectiva de que um destrua ou elimine o outro, como sobejamente a história ambivalente das religiões "monoteístas" tem demonstrado, o final desse enredo é sempre trágico. Quanto a esse anseio narcísico de irmãos querendo derrotar e menosprezar irmãos, já dizia o rabino e sociólogo Nilton Bonder, líder da congregação israelita no Brasil, em "Judaísmo para o Século XXI": "Não haverá paz, enquanto ambos, ou melhor, todos os lados interessados não forem derrotados. Uma derrota na expectativa de Triunfo de todos os lados é a única esperança da Paz. Sempre foi."

Em Resumo: É muito difícil negociar uma questão básica de ordem psicológica, quando se trata de saber qual dos dois filhos Deus gosta mais. Na história da divina e trágica comédia político-religiosa quando um deus (ou um messias) é manipulado e engodado pelo vil metal a ficar do lado de sua angélica e sanguinária militância, o do outro lado, por mais que se mostre capaz e não alienado, vai ser sempre rotulado de falso.


Para o antropólogo, Roberto Redfield,a visão mundial de muitos povos consiste em essência de dois pares de oposições binárias: ‘humano/não humano’ e ‘nós/eles’. A distinção entre ‘nós’ e ‘eles’ surge já em nossa mais remota evidência histórica em antigas tabuinhas sumérias e acadianas.


Uma sociedade não descobre simplesmente seus outros, ela os fabrica.” (Elaine Pagels)


Por Levi B. Santos
Guarabira, 28 de maio de 2020

21 maio 2020

“DUDU” ― O Presidente Urucubaca



Marechal Hermes da Fonseca – Revista Nossa História nº 32


Passados sessenta dias de uma Quarentena que teve dia marcado para começar, mas não para terminar, resolvi revisitar a minha coleção da Revista mensal ― “Nossa História” ― Editora Vera Cruz. Talvez condicionado pelo pandemônio político da atualidade, me ative à edição n° 32, de junho de 2006, que trata das peripécias do Marechal Hermes da Fonseca, nosso 8º presidente da república.

Em seu artigo ― “O presidente Urucubaca” ―, Nívea Pombo, mestre em História Social pela Universidade Federal Fluminense, faz um passeio, ao mesmo tempo real, trágico e risível sobre o personagem que em campanha explorou o mote “política das salvações”, cujo símbolo era uma vassoura para varrer a roubalheira dos civilistas. No dizer de muitos daquela época, a morte prematura do ex-presidente, Afonso Pena, em 1909 (dois anos antes do término de seu mandato) teria sido consequência de uma grande contrariedade que teve com Hermes da Fonseca, em uma tensa discussão. Devido a esse entrevero, o marechal ficou conhecido popularmente como “o presidente urucubaca”.

Após a campanha eleitoral muito acirrada entre civilistas e militares. Hermes, enfim, derrotou seu opositor, Rui Barbosa e governou o Brasil de 1912 à 1916. Segundo a autora do texto, “o presidente mal despiu a farda foi acusado de vencer graças às fraudes eleitorais.” Se hoje, com urnas eleitorais eletrônicas digitais, ainda há quem advogue que as eleições podem ser fraudadas, avaliem como eram apuradas e contabilizadas as cédulas de votação depositadas em pequenos sacos de lona, antes do ano 2000?

Logo no começo de seu artigo, a historiadora cita alguns dados peculiares desse personagem:

Baixo, gordo e calvo. Hermes da Fonseca era dono de traços físicos pouco atraentes. Pesava ainda sobre o presidente a fama de ser indeciso, ignorante e pé-frio. Durante todo o seu governo, a opinião pública o azucrinou. Pela sua presumida ignorância foi apelidado de ‘Dudu’. Na imprensa, as caricaturas e paródias faziam mais sucesso do que suas ações administrativas, o que fez dele a maior vítima presidencial de chacotas.[...]Pouco afeito aos estudos, foi expulso após brigar com três colegas e rasgar a batina de um padre”.

O Rio de Janeiro, como ainda hoje acontece, era sempre o epicentro dos pandemônios políticos das mais variadas magnitudes. No que diz respeito ao popularmente cognominado,“Dudu”, diz a escritora e mestre de nosso enredo político-social:

a antiga capital da república ficou oito meses em estado de sítio, o que minou sua tênue base política e foi um prato cheio para as críticas civilistas. Eram os primeiros indícios de que a gestão do marechal seria turbulenta e azarada”. Mesmo com seu filho Mário Hermes com quem andava colado e, muitas vezes, mais atrapalhava do que o ajudava, construiu várias vilas operárias, como a de Sapopemba, hoje bairro de marechal Hermes. Em sua vida palaciana gostava de magnas festas e saraus. Os rega-bofes eram tantos, que o velho Rui Barbosa, apelidou o Catete de “Versailles do século XVII”, aludindo a famosa corte francesa. Sobre as farras palacianas, assim escreveu, Nívea Pombo:

Nenhum evento causou tanto ‘frisson’ quanto o sarau ‘Corta-Jaca’. Considerada chula e pornográfica, a composição era um dengoso maxixe de Chiquinha Gonzaga. Tudo foi motivo para mais caricaturas e canções irreverentes:

O Dudu sai a cavalo
O cavalo logo empaca
E só recomeça a andar
Ao ouvir o Corta-Jaca”.


Depois de um governo com muitos empréstimos internacionais a pagar e quase nenhuma de suas promessas messiânicas realizadas, com exportações despencando e crise severa na produção de borracha na Amazônia, o marechal Hermes da Fonseca entrega ao seu sucessor, Wenceslau Braz, um país extremamente endividado.

Sobre o triste fim do presidente Urucubaca, conclui a mestre em História Social, Nívia Pombo:

Com o fim do mandato recolheu-se em Petrópolis e passou a fazer móveis e casinhas para passarinhos. Dois anos depois, foi preso pelo envolvimento numa conspiração militar contra o presidente Epitácio Pessoa. Em liberdade e doente, voltou a Petrópolis onde faleceu de um ataque cardíaco em 09 de setembro de 1923. Seu último desejo foi ser enterrado em trajes civis, dispensando as honras militares”.


Por Levi B. Santos
Guarabira, 21 de maio de 2020

Fonte Consultada:
Revista Nossa História Ano 3 / nº 32 – junho de 2006

13 maio 2020

O PSIQUISMO EM TEMPOS DE PANDEMIA ― BREVES CONSIDERAÇÕES




É na linguagem apreendida desde os meus primórdios que hoje, no ocaso da vida, ainda me ancoro. O que faço com as pulsões, fantasias, astúcias e finezas do meu tempo pueril, senão, dia a dia revolvê-las, reciclá-las ou adorná-las com as plumagens esmaecidas do presente?

Quando as trevas do mundo se me apresentam com toda sua dureza, acossado por uma pandemia horrorosa e mortal de um vírus que escolheu justamente os idosos com suas comorbidades para estabelecer a seleção “natural” mais drástica da pós-modernidade, só me resta empreender uma autoanálise. Então, à guiza de recolher algumas pérolas envido esforços na tentativa de ver, mais de perto, fantasmas escondidos nas profundezas de meu obscuro oceano psíquico, instância essa, denominada por Freud, “O Inconsciente”.

Sob o império das necessidades inerentes ao momento extremamente difícil da atualidade que, no meio religioso, já se nomeia como “o fim dos tempos”, nessa quarentena resignei-me a tatear por dentro de casa, vendo paulatinamente, as páginas cinzentas dos dias tombarem sobre as páginas negras da noite, ante meu débil olhar embaciado pela idade avançada.

Nas noites intercaladas por momentos insones, ainda tenho alguns sonhos de esperança. Ainda sonho me vendo criança, colhendo fragmentos do Jardim do Éden nos idos de 1946, quando em Alagoa Grande nascia eu para a linguagem. Os meus pais, ainda tão jovens e imaturos, saídos de uma curta adolescência, usaram o VERBO, e o DESEJO Paterno/Materno para encarnar-me. Fui o primogênito, e como tal, honrado com o título de provedor da família, como bem simboliza o nome Levi, de origem hebraica, que hoje me faz jus, em todos os aspectos.
O psicanalista francês, Jacques Lacan, que promoveu a releitura das obras de Freud, fazia em seus seminários referências ao “Nome-do-Pai”, junto com a tríade do “simbólico, do real e do imaginário” ─ arquétipo introjetado pelo pai no psiquismo do filho. Mesmo já adulto, quando esse filho dá uma ordem, é a voz ancestral do Pai que fala através dele.

Um DESEJO, Uma PALAVRA, um dia nos fundou. Somos filhos das PALAVRAS. Elas permanecem lá, inscritas em nosso corpo. As ruínas dos castelos que imaginariamente construímos na infância, com certeza, estão arquivadas em nosso cérebro, Para não sermos consumidos, em tempos sombrios como esse que estamos atravessando, ressonâncias se deslocam dos alicerces movediços de nossas lembranças, para amenizar nosso sofrimento.

Embora tendo em mim os sinais físicos da fraqueza inerente à idade, não posso demonstrar abatimento espiritual. Às vezes, me quedo rindo por dentro, ao ouvir da esposa, dos filhos e netos a consoladora frase: “Ele está com aparência melhor!”. Na primavera, quando as belas flores de variadas cores dos boungavilles se derramam sobre os muros do meu quintal, o desânimo dá lugar a rasgos de esperança de novos tempos, novos ânimos, novos ares de felicidade.

Mas a felicidade, cantada em versos pelo nosso poetinha, Vinícius de Moraes, é fugaz, “como uma gota de orvalho numa pétala de flor/Brilha tranquila/Depois de leve oscila/E cai como uma lágrima de amor”.

Não sou senhor de mim, mas também não sou completamente incapaz de me reconhecer na criança que um dia fui. Não posso refletir sobre esse mundo complexo e ilógico que me escorrega entre os dedos, mas posso enxergar o material de que fui forjado para ser, com todas as vicissitudes e ambivalências, o que hoje sou.

Quando eu denomino esse mundo atual de complexo, ilógico e escorregadio, quero com isso dizer, que essa grave pandemia de coronavírus e a consequente banalização da morte em tempo real pela Televisão, está deixando, não só a mim, quanto aos outros inundados de ansiedade e reféns do desamparo. Cada um inquirindo a si mesmo, se será ou não a próxima vítima desse potente e imbatível vírus.

Como seres forjados para a angústia, de certa forma, o desamparo que experimentamos hoje, pode ser entendido, psicologicamente, como uma repetição ou eco do primeiro desamparo: a nossa expulsão violenta do aconchegante ninho materno ─ o Útero ─, quando, mediado pelo choro, passamos a viver em um mundo cruel e inóspito. Talvez, em nível inconsciente, o desamparo primevo, tenha algo a ver com a exacerbação dos sentidos que, agora, frente a uma Pandemia, se mostra quase que incontrolável.


09 maio 2020

A TERRÍVEL LÓGICA BOLSONARIANA





No dia 14 de abril de 2020 o Jornal Italiano "Correio dela Serra" fez uma análise da postura dos líderes dos principais países do mundo, quanto ao combate do Coronavírus. A nota 2, a mais baixa, coube ao negacionista Jair Bolsonaro. 

Desde o começo da pandemia, aqui no Brasil, o presidente, mesmo sofrendo pressão interna da população, vem atuando contra os protocolos da OMS, e do Ministério da Saúde, ao defender a abertura prematura do comércio em plena ascensão da curva de infecção pelo Covid-19. 

Uma reportagem da revista Britânica,"The Economist", em sua última edição, afirma que o presidente Jair Bolsonaro está isolado em seu discurso contra o novo Coronavírus, o que poderia marcar "o começo do fim de sua Presidência"

A fim de passar uma imagem de que "tudo não passa de uma gripezinha" o presidente, de forma maldosa, passou deliberadamente a incentivar a população a desobedecer às normas do isolamento social. As aglomerações arquitetadas pelo governo e  seus militantes, sem nenhum cuidado preventivo, passaram a ser rotina nos finais de semana em Brasília, somando-se a isso as carreatas com apelações antidemocráticas, tipo "Intervenção Militar com Bolsonaro no Poder, inclusive fazendo alusão à volta do AI-5.

Foi por essa época que o presidente aumentou o tom de desdém contra a Pandemia de Coronavírus, com asneiras do tipo: 
Assim como uma gripe, outra qualquer leva a óbito (frase proferida em 17 de março de 2020).

O povo vai saber que foi enganado pela crise do coronavírus. (frase proferida em 23 de março de 2020). 

Qual seria a estratégia inclemente do presidente, senão a de desejar uma curva de infecção vertical, com a rápida contaminação de todos, visando um suposto encurtamento do tempo da pandemia?
Como todos sabem, o maior mandatário da república nunca deu o mínimo de atenção para a gravidade que sua atitude impensada está, em consequência, levando o sistema hospitalar rapidamente ao colapso total. Ele nunca titubeou, por diversas ocasiões, em demonstrar que desejava proteger muito mais o Mercado do que as vidas humanas. De forma hiistérica, sem o mínimo de tirocínio, soltou pérolas do capitalismo selvagem, como essas:  

O Vírus tá aí, vamos ter de enfrentá-lo, mas enfrentar como homem, pô, não como moleque! (frase proferida em 29 de março de 2020)

Alguns vão morrer? Vão, ué, lamento. É a vida. Você não pode parar uma fábrica de automóveis só por que há mortes todos os anos na estrada! (frase proferida em 27 de março de 2020).

70% da população brasileira vai ser contaminada pela Covid-19. Não adianta. Se não for hoje, vai ser semana que vem, mês que vem, é uma realidade. (frase proferida em 18 de abril de 2020).

Na sua lógica capitalista selvagem, existe somente a mão única: a da salvação da Economia, não importando a falência da Saúde nem tampouco a quantidade tremenda de mortos veiculadas diariamente pelos meios de comunicação. De forma exaltada e desumana, em sua ótica avessa e perversa, joga sobre a turba ensadecida indigestas indiretas dirigidas aos familiares que perderam seus pais e avós devido ao Covid-19. No dizer inumano dele: 

"O que são milhares de idosos com comorbidades, diante de uma recessão econômica?"

O presidente negacionista vem, semanalmente, protagonizando patéticos espetáculos na frente de seus extremados seguidores, numa espécie de maniqueísmo raso, visando unicamente o boicote às medidas de isolamento social; medidas adotadas em todo o mundo pela OMS com o objetivo de retardar a progressão da infecção pelo Covid-19 e, consequentemente, evitar o colapso do sistema hospitalar. 
O propósito do desalmado presidente, como o de querer que todos peguem a doença de forma rápida, supondo que o país ficaria livre logo da pandemia com todos voltando a trabalhar normalmente, é uma amostra de que se encontra totalmente perdido em suas racionalizações desordenadas. A insensibildade de um governante xenófobo, vai, com certeza, levá-lo, futuramente, a ser cobrado pela vida de muitos. 

Para o sistema, aqueles que passaram dos 65 anos de idade são, hoje, nada mais que estorvos a serem eliminados. Em suma, o que mais se deseja é a lógica de MERCADO, onde termos como INVESTIMENTO e DINHEIRO são os que mais contam, como mostra a mensagem do novo ministro da Saúde e empresário/consultor da área médica, Nelson Teich, cujo pensamento coaduna muitíssimo bem  com a lógica terrível do temível presidente:

E, se tem uma outra coisa que é fundamental, é que como você tem dinheiro limitado, você vai fazer escolhas. Então você vai ter que definir onde você vai INVESTIR. Então, sei lá, eu tenho uma pessoa que é uma pessoa mais idosa, que tem uma doença crônica, avançada, e ela teve uma complicação. Para ela melhorar, eu vou gastar o mesmo DINHEIRO que eu vou gastar para INVESTIR num adolescente, que tá com um problema. O mesmo DINHEIRO que eu vou INVESTIR lá é igual. Só que a pessoa é um adolescente que vai ter a vida inteira pela frente, e o outro é uma pessoa idosa, que pode estar no final da vida. Qual vai se a sua ESCOLHA?”. (Nelson Teich - em um vídeo polêmico de 2019)

Enquanto digito meu ensaio, essa exata lógica mercantil do Nelson Teich que o insensato presidente exalta em meio a gargalhadas, está acontecendo em várias UTIS do Brasil. Hoje, dia 09 de maio de 2020, no Rio de Janeiro, pasmem, 336 pessoas estão na fila por um leito de UTI.

Para quem, como o nosso presidente da república, desdenhou da pandemia e passou a vida inteira conclamando a população a não obedecer o isolamento social, essa tragédia ficará registrada nos anais da história mundial como a maior mortandade a cair no colo de um mandatário da nação.


Por Levi B. Santos
Guarabira, 09 de maio de 2020


Imagem do Topo: kikacastro.files.wordpress.com/2020/04/duke-eday.jpg

02 maio 2020

O QUE HÁ POR TRÁS DO ─ “QUEM MANDA SOU EU!”




Essa frase ameaçadora faz parte do arsenal de jargões usados recentemente pelo presidente da república. Na verdade, esse grito ameaçador só pode partir de quem gostaria de MANDAR, mas não tem a mínima estatura moral para tal feito.

Aliás, se o presidente tivesse um pouco de tirocínio, iria entender que ele é um servidor público e, como qualquer funcionário público tem o dever, não de MANDAR, mas de SERVIR ao povo brasileiro. Portanto, ele é SERVO e não SENHOR, e estamos conversados.

A dupla da MPB, Baden Powel e Vinícius de Morais, cantando um de seus memoráveis sambas, já frisava ─ “o homem que diz sou, não é” ─, até porque aquele que é poderoso não precisa alardear aos quatros cantos que é ele quem manda, o que, definitivamente, não é o caso do neófito que está desonrando a cadeira presidencial com suas asneiras expostas diariamente nos meios de comunicação. A cada declaração estapafúrdia que o insensato faz, é um tiro que dá no próprio pé, e tome crise atrás de crise no auge de uma Pandemia que ele nega e boicota, incitando a população a não reconhecer como verdadeiros os protocolos médicos do Ministério da Saúde e da OMS. Por sua vez, os ativistas que se submeteram a uma lavagem cerebral sem precedentes, de forma histérica e idólatra o aplaudem e o adoram como se ele fosse o valioso Bezerro de Ouro erigido no deserto do Sinai pelo desobediente e frustrado povo Hebreu.

O que leva o presidente a usar com frequência o brado “Quem Manda Sou Eu!”, senão o desejo insano de fazer do palácio da Alvorada um puxadinho de sua casa. Indubitavelmente, a mistura maléfica do público com o que é privado se constitui uma das práticas criminosas que está levando o governo à decadência moral. A cadeira presidencial não pode ser trocada por um sofá presidencial para acomodar seus inconvenientes filhos, ainda mais na condição de investigados por promotores e Congresso.

Recentemente, o ex-ministro da Justiça, Sérgio Moro, foi pressionado pelo presidente para trocar o superintendente da Polícia Federal, Maurício Valeixo, por outro policial federal mui amigo de balada de seus intragáveis filhos (alvo de inquéritos em andamento na corporação). Moro, ao argumentar que o que o presidente estava propondo ali era uma interferência política, recebeu na cara, de forma ríspida e descarada um: é isso mesmo!”, expressão, que não deixa de ser um derivativo do surrado bordão “Quem Manda Sou Eu!”.

Segundo o professor e psicanalista, Mário Corso, as reações exacerbadas do presidente são consequência de uma fragilidade. O sujeito se sente inferiorizado e ataca. Sai em ataque de tudo, mas justamente pela fraqueza intelectual dele. Quando não tem argumento, troca de assunto chutando canelas do adversário. Ele não tem discussão nenhuma. Só ataca o adversário porque ele é consciente da sua fragilidade intelectual”.

Quando o presidente lança na cara do interlocutor o tradicional “Quem Manda Sou Eu!, está agindo em defesa de seu próprio EGO, ou seja, ao lançar mão de um escudo de proteção, ele, inconscientemente, está a reprimir ou recalcar fatos inconfessáveis e crimes não ditos em um abismo secreto de sua psique. Para os que sofrem de infantilismo e insegurança neurótica, o ATAQUE, representado pelo brado ameaçador em pauta, é, ao mesmo tempo, arma de DEFESA.


Por Levi B. Santos
Guarabira, 02 de maio de 2020