“Este teu olhar quando encontra o meu / fala de umas coisas que eu não posso acreditar”
"Tom Jobim"
"Tom Jobim"
Disse, certa vez, um professor de
judô a seu aluno: “Quando lutar perceba que
está lutando contra você mesmo. Os únicos adversários são seus próprios medos.
E se lutar contra o outro lutador, vai perder mesmo que ganhe a disputa. Mas se
entender que a sua batalha é contra seus medos, você irá ganhar, não importa qual
seja o resultado do combate contra seu adversário.”
Sartre, no seu livro, “Entre Quatro Paredes”, mostra outra versão da metáfora INFERNO ― àquela que transparece quando o indivíduo está em relação com o DIFERENTE.
Por que se percebe o OUTRO como se
fosse um INFERNO?
Porque o relacionamento com o OUTRO
implica na experiência dramática de se ver pelo OLHAR alheio.
Ora, se o OUTRO vê em mim o que não
sou, passo, então, a ser um objeto do desejo dele. Por esse tipo de OLHAR, o EU
vai transformar o TU em um ISSO. Quando o EU acolhe o TU como uma coisa, ou um
ISSO, a única opção que resta no tabuleiro de cartas para o TU, é se retirar,
pois, não existe graça em jogar um jogo cujo resultado foi estabelecido,
previamente, de forma unilateral.
Caio Liudvik, em seu livro, “Sartre e o Pensamento Mítico” (Edições Loyola ― página 161) tem um trecho do diálogo entre Júpiter e Egisto (do mito de Oréstia e Electra) no qual podemos perceber uma pequena amostra do mal estar do homem ao ser definido pelo OUTRO:
JÚPITER:
Vês bem como somos parecidos!
EGISTO:
“Parecidos? Que ironia é essa de
um Deus se dizer parecido a mim. Desde que Reino todos os meus atos e todas as
minhas palavras visam a compor a minha imagem; quero que cada um de meus súditos
a traga em si e que sinta, até mesmo na solidão, meu OLHAR severo pesar sobres
seus pensamentos mais secretos. Mas sou eu a primeira vítima: não me vejo mais
senão como eles me vêem; me inclino sobre o enorme poço de suas almas, e minha
imagem está lá, bem no fundo, ele me repugna e me fascina. Deus Todo-poderoso
que sou eu, senão o MEDO que os outros têm de mim?”.
Aquele que rejeita o diálogo e o
pluralismo dos OLHARES, talvez não entenda que o seu OLHAR quando define o OUTRO
está contaminado pela sua própria subjetividade. Talvez não perceba que o OLHAR
neutro não existe.
Para sair desse impasse, o que
deveríamos conceber?
Uma nova percepção passaria pela
revisão desse OLHAR determinista, para compreender que ele deve sempre estar em
construção, haja vista, que os valores com os quais estabelecemos relações
humanas não são fixos ou imutáveis. Para um ser em freqüentes mudanças, a
rigidez do OLHAR, por não acompanhar a dinâmica evolutiva, se constituiria na
nossa própria prisão, no nosso próprio INFERNO.
Por Levi B. Santos
Guarabira, 03 de fevereiro de 2012
Site da imagem: ultimatransmissaohumana.blogspot.com
Site da imagem: ultimatransmissaohumana.blogspot.com
19 comentários:
Nobre Mago Levi, esse olhar no outro o que eu deveria detectar em mim mesmo, é regra geral segundo a psicanálise para todos os processos de desconforto relacional, ou existe a possibilidade objetiva do outro ser um inferno mesmo?
Levi,
parece que o Kilim está com sua pergunta, tentando infernizar "mesmo" o outro enquanto ele mesmo estaria sempre num estado de "celestialização"..kkkkkk
Mas já que ele tocou nesse aspecto, eu acredito que quando uma pessoa é "um inferno" para muita gente, ela deve mesmo possuir um estado de existência infernal.
Quem pode negar que Hitler foi um inferno para os milhões que ele assassinou? do mesmo modo entram nessa lista todos os grandes ditadores da história como Stalim, Mao, Fidel, etc.
Levi,
O olhar neutro não existe. Mas quando de fato o OUTRO me vê como eu NÂO sou, quer dizer que este meu olhar sobre mim mesmo é equivocado? De certo, sabemos quem somos?
Levi, esqueci de dizer que você deveria ter publicado esse texto lá nos comentários do nosso irmão crítico das teologias infernais...rss
Ele respondeu meu longo comentário de forma bem educada mas o OLHAR dele não é o meu olhar(evidente) mas ele crê que essa interação de olhares é um inferno.
Mas por outro lado, essa atitude visa proteger o quê a nível psíquico? a segurança daquilo que ele tem como verdade da sua fé? Isso é necessariamente ruim? Ou é realmente não querer ser olhado pelo olhar alheio por receio de se ver neste olhar?
Ao Edu e ao Franklin
O “Inferno” que vemos no OUTRO não é nada mais que o reflexo das partes obscuras ou rejeitadas de nós que foram reprimidas.
A “santificação”, que a meu ver, no caso do fundamentalista ou conservador, deveria ser a integração dos dois pólos antagônicos da psique, não pode coexistir , com aquilo que ele acha “impuro” e que, por ser de natureza “má” deve ser eliminado, extirpado, isolado ou esmagado.
Quando compreendemos que os arquétipos “Ceu” e “Inferno” estão em nossa psique desmantelamos todo esse padrão ou maniqueísmo de achar que em si reside só a “Teologia do Céu” e no OUTRO a “Teologia do Inferno”.
O problema está no OLHO de quem vê. A metáfora dita por Cristo foi nesse sentido: Se o teu OLHO te escandalizar ARRANCA-O
O Herege, o liberal é perigoso por que ele se despe, mostrando o NU. O Fundamentalista reage em defesa daquilo que está escondido em si mesmo, debaixo das vestimentas que a sociedade e as instituições de um modo geral (principalmente a religiosa) o vestiu.
Respondo SIM a sua pergunta, Edu
“... essa atitude (ou reação) do fundamentalista (exemplo: o do Blog “Apenas”) é realmente não querer ser olhado pelo olhar alheio, por receio de se ver neste olhar. O medo de ver na nudez do “transgressor” as suas próprias vergonhas encobertas.
"Hipócrita, tira primeiro a trave do teu olho, depois verás perfeito, para tirar a do teu próximo."
Parece que tem o meu inferno e o do outro. Nem sempre o inferno do outro é o meu e vice versa.
As vezes o meu céu pode mudar a história de inferno do outro e vice versa.
Beijo.
É isso aí Guiomar
É a trave do olho daquele que é radical nos seus conceitos que impede o diálogo com o outro diferente.
A trave no olho é metáfora daquele que é rígido em suas doutrinas e dogmas, e só vê escuridão(inferno) no OUTRO que considera a Escritura Sagrada, não um livro fechado, mas aberto a novas interpretações.
Abraços,
Caro Mago e Nobre Herege Mor, dá pra juntar os 2 comentários de vcs e fazer um outro post...
Show de bola!
Vamos lá, mestre herege da psicanálise teológica:
O “Inferno” que vemos no OUTRO não é nada mais que o reflexo das partes obscuras ou rejeitadas de nós que foram reprimidas.
Eu dei o exemplo extremo de hitler exatamente para entender se eu a ver em Hitler um inferno, o desejo insano que ele tinha e pôs em prática de exterminar os judeus da Europa existe também potencialmente em mim.
Pelo que já compreendi desse assunto, não seria assim. Essa questão cai muito bem quando se comparam morais diferentes ou teologias diferentes. Aí sim, o diálogo com o outro sem negá-lo seria o caminho. Mas em momentos extremos, existem "seres infernais" com quem não dá para ter diálogo.
No caso citado de Hitler, a psicanálise vê nos aliados que derrotaram seu reich, potenciais hitleres?
Edu
Na guerra, meu caro, o que entra em atividade são os instintos de vida e de morte (O Eros e o Tânatos). Freud dizia que a guerra põe a NU o homem primitivo que há em nós.
Não sei do que sou capaz se alguém vier agir com violência dentro do meu lar. Aí é aquela forma da explosão de agressividade em legítima defesa da vida.
Por outro lado, a metáfora inferno são os outros, pode perfeitamente se aplicar nos conflitos em que estão inseridos a religiosidade (acho que são quase todos). Sabemos que grande parte dos soldados marcha para a guerra para defender a sua pátria, como os cruzados defendiam o seu deus ou como os guerreiros de Velho Testamento pelejavam pela destruição dos seguidores de Baal.
No caso de Hitler, há quem diga que, inconscientemente, ele sentia inveja do judeu. E o invejoso é aquele que quer privar o outro de ter o que ele não pode ter. Aí entra a história metafórica dos irmãos Abel e Caim com todas as suas nuances psíquicas.
Ainda hoje o irmão mais velho percebe o mais novo como o intruso ― aquele que veio destroná-lo.
Como primogênito, lembro-me bem quando da chegada do meu irmão, muitos zoavam comigo: Eitaaaa, você agora ficou no canto, que era o mesmo que dizer: você agora não é mais o preferido (rsrsrs)
Quanto aos EUA (e seus aliados), entendo que não entraram de graça na guerra na luta contra Hitler. Uma prova disso é que ainda hoje são a maior potência mundial.
Edu,
Para corroborar que o inferno são os outros, não podemos esquecer a célebre frase de Bush, depois do atentado as Torres Gêmeas, o qual usou o maniqueísmo do bem contra o mal, na emblemática frase: “Quem não está conosco está contra nós”, e outro lado revidou: “Nossa luta é contra Satã”. (rsrs)
Mas no fundo, no fundo, a religião não sobrevive sem o seu combustível mágico que faz incendiar os hereges que desejam o diálogo entre “Javé” e “Satã”. (rsrsrs)
Ok, Levi, mas você concordaria com o termo "guerra justa"?
Parece certo que "o inferno são os outros" se manifesta exemplarmente no meio religioso radical. Estamos cheios de exemplos disso.
Minha mãe também falava esse negócio de "ficar no canto"...kkkkkkekkekk
Levi, como consegui recuperar minha conta onde estava o meu "caminhos da teologia" do blogger, vou publicar lá alguns destes seus comentários para o blog não ficar às moscas, já que tinha(tem) 70 seguidores e parece que o pessoal do blogger não costuma muito ir ao wordpress...rssss
É claro que não estou dizendo que seus comentários servirão apenas para espantar moscas....ah, você entendeu...rsss
EDU
Você vai espantar os fundamentalistas publicando esses comentários heréticos lá no CAMINHOS.
E por falar em fundamentalismo, não esqueçamos que o “INFERNO SÂO OS OUTROS” tem mão dupla (rsrs)
E aqui ficam duas reflexões em forma de pergunta:
Será que um pouco de nossa ojeriza ao fundamentalista não se deve ao fato de termos, ainda, no porão do inconsciente, resquícios saudosos dos tempos em que éramos ortodoxos e não sabíamos?
Não suportamos ver no OUTRO as marcas do que fomos um dia, concordas, Edu?
(kkkkkkk)
P.S.:
Se Guiomar pegar essa confissão, vai dar muitas gargalhadas.
Bem profundo o texto, Levi!
Dentro do entendimento que expôs, transtornos como a síndrome do pânico seriam nada mais do que o medo que a pessoa tem de si mesma projetado nos outros.
"Aquele que rejeita o diálogo e o pluralismo dos OLHARES, talvez não entenda que o seu OLHAR quando define o OUTRO está contaminado pela sua própria subjetividade. Talvez não perceba que o OLHAR neutro não existe."
Concordo com essa visão! Isto demonstra que os ditadores e homens autoritários são, na verdade, uns covardes medrosos. Daí eles banirem o diferente e o contestador para não haver reflexos sobre o que eles e o sistema corrupto dominante são.
Acrescente-se que os sistemas autoritários, bem como os ditadores, tendem a ser "fixos" e não "em construção".
Em tempo!
Achei bem interessante a interpretação que fez do texto do Sermão da Montanha sobre a frase hiperbólica de alguém arrancar o próprio olho que o escandaliza (Mt 5.29).
Se tentarms ligar este verso ao anterior, talvez poderíamos dizer que não é a mulher gostosa a causa de um homem cair em adultério. Isto porque o v. 28 diz o seguinte:
"Eu, porém, vos digo, que qualquer que atentar numa mulher para a cobiçar, já em seu coração cometeu adultério com ela."
Mas pode ser que o v. 29 não tenha nada a ver com o precedente e que tenha existido isoladamente antes da redação do evangelho de Mateus. Tanto é que a mesma frase aparece no cap. 18.
Em Mt 18.7, que seria a situação precedente, Jesus fala dos "escândalos". Ou seja, dos tropeços que armamos como cilada para o outro. E aí no v. 10, Jesus fala novamente dos pequeninos:
"Vede, não desprezeis algum destes pequeninos, porque eu vos digo que os seus anjos nos céus sempre vêem a face de meu Pai que está nos céus".
É possível também que o dito sapiençal em comento não seja expressão original de Jesus, mas sim anterior a ele e de uso comum em sua época. Logo, a expressão aparece no texto bíblico talvez para dar sentido ao que está sendo dito.
De qualquer maneira, o fato de ter lembrado desta passagem do Evangelho aqui nos comentários ao seu brilhante artigo foi bem inspirador.
Abraços.
Rodrigo
Irretocáveis as suas duas colocações
1.A síndrome do pânico tem origem nos nossos medos internos.
2.O ditador ou autoritário ao banir o outro (seu desafiante) o faz não por coragem mas por covardia, pois está agindo em defesa dos seus próprios recalques reprimidos no porão secreto de sua psique.
Pois é. Acho que no fundo, todos sofrem de pânico, em maior ou menor grau. Até Jesus parece ter tido um medo ou uma reação de não querer morrer...
Levi,
penso que talvez você tenha razão. Afinal de contas, muitos que se declaram "não fundamentalistas" acabam por se tornarem fundamentalistas em seu não-fundamentalismo...
Isso é uma espada de dois legumes, meu velho....kkkk
Quem não está conosco está contra nós, e outro lado revidou: “Nossa luta é contra Satã”. (rsrs)
Puro politicagem, cobiça. O EUA creio, ainda perderá as patas de ferro e bronze.
"Se Guiomar pegar essa confissão, vai dar muitas gargalhadas."
E não é que dei mesmo kkkkkkkkkkkkkkkkkkkk oro quase todos os dias por vocês, quero dançar com todos lá na glória eterna. Se quero...
Beijão.
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