04 janeiro 2013

Os Judeus na Sociedade [1ª Parte]



A foto é dos irmãos ‘Rothschild’  banqueiros que dominaram o mundo dos negócios por dois séculos.


O capítulo III da primeira parte do Livro ― “Origens do Totalitarismo” ― de Hannah Arendt, traz uma aguçada análise da condição dos judeus dentro da esfera do Estado não judeu, a começar pelo século XVIII. A renomada autora, para confecção desse compêndio, pesquisou em torno de oitocentos autores (vide bibliografia).

De sua vasta e antológica obra que repercute até hoje, como fonte de inesgotáveis consultas por parte de pensadores, políticos e historiadores de todas as Universidades do mundo, reuni alguns fragmentos emblemáticos do capítulo ― “Os Judeus e a Sociedade” que, para melhor reflexão, dividi-os em três partes.

Segundo essa famosa historiadora judia nascida em 1906, em Hannover – Alemanha, o anti-semitismo político surgiu porque os judeus imbuídos pela emancipação constituíam um corpo à parte; enquanto a discriminação social foi resultado da crescente igualdade dos judeus em relação aos demais grupos.

No capítulo I de sua obra, cujo título é “O Anti-semitismo”, Hannah, já apresenta um esboço analítico da psicologia do judeu. Ela assim afirma: “...vastas parcelas dos Judeus que se preocupavam com a existência de seu povo descobriram, num curioso e desesperado erro de interpretação, a idéia consoladora de que o anti-semitismo, afinal de contas, podia ser um excelente meio de manter o povo unido, de sorte que na existência do anti-semitismo ‘eterno’ estaria a garantia da existência judaica.”

A seguir, transcrevo trechos da instigante narrativa dessa sensacional estudiosa da condição judaica, que despertou, de maneira incomum, a minha curiosidade, no tocante ao III Capítulo ― “Os Judeus e a Sociedade”:

Hannah Arendt, diz, “que o idealismo da igualdade entre os grupos tende a tornar difícil em se admitir as diferenças entre as pessoas. A formação do estereótipo do judeu foi em decorrência desses dois fatos: à especial discriminação e ao especial favorecimento. Portanto, quanto mais a condição do judeu se aproximava da igualdade, mais surpreendentes se revelavam as ambivalências: de um lado o ressentimento contra os judeus; de outro, uma atração peculiar por eles”.

“Os judeus lisonjeados como exceções, os judeus ‘excepcionais’, sabiam muito bem que só a ambiguidade ― isto é, o fato de serem judeus, mas presumivelmente não iguais aos judeus ― abria-lhes as portas da sociedade. Ao se satisfazerem com esse tipo de relação, procuravam ao mesmo tempo ‘ser e não ser judeu’.

“O fato é que a sociedade não judaica exigia que o judeu recém-admitido por ela fosse tão ‘educado’ quanto os seus próprios componentes tradicionais. Exigia-se dos judeus a assimilação, isto é, o seu ajustamento à sociedade como condição preliminar da emancipação judaica”.

“Em conseqüência, a elite não judaica ― tolerante, educada e culta ― preocupava-se socialmente só pelos judeus igualmente educados e cultos. Os demais judeus estavam fora do interesse humanístico da elite não judaica”.

“Schleiermacher, preconizava que a ‘separação entre eles, os educados e os outros ‘judeus-judeus’ fosse legalizada pelos governos; por outro lado se esperava que esses judeus se tornassem espécimes excepcionais da humanidade, o que tornava obviamente periclitante a posição dos outros judeus menos ‘ocidentalmente educados’.”

“A França vinha se tornando a terra da glória política para os judeus. A Prússia iniciava o esplendor social dos judeus. Mendelssohn, na Alemanha, estabelecia estreitas ligações com homens famosos da época. Os amigos de Mendelssohn, por sua vez, se utilizavam dessas relações para fins impessoais ideológicos, e até mesmo políticos”.

Segundo Hannah Arendt, “Só depois da derrota Prussiana em 1806, é que a Alemanha foi tomada de pavor: a emancipação libertaria os judeus educados, juntamente com as massas judias ‘atrasadas’. A igualdade destruiria aquela preciosa distinção sobre a qual, como bem sabiam os judeus emancipados, se baseava seu status social”.

“Assim, quando a emancipação de todos os judeus finalmente se realizou, a maioria dos judeus assimilados converteu-se ao cristianismo, achando que, se era suportável e seguro ser judeu antes da emancipação de todos os judeus, não seria sensato manter o seu judaísmo conspurcado pela adesão das massas judaicas, que retrógradas, tirariam do judeu excepcional o halo que dele emanava.

“Em 1816, quando as províncias ex-polonesas foram recuperadas , os antigos judeus protegidos, que formavam 60% da população judaica total foram registrados como cidadãos prussianos de fé mosaica, e perderam o seu status de ‘judeus exceção’.”

“Na década de 1820, os ricos Rothschild com seu grandioso palácio todo em ouro e mármore, situado à rua Laffite, em Paris, sustaram uma vultosa doação destinada à sua comunidade nativa de Frankfurt, num contra-ataque à influência de reformadores que desejavam que as crianças judias recebessem educação geral. (“Nova História dos Israelitas” de Isaak Markus Jost, Berlim – 1846, pag  102). Conta-se que o primeiro judeu da corte, um judeu de Praga, fornecedor de suprimentos à Saxônia no século XVI”, alimentou ambições monárquicas em sua própria nação.

“Johan Jacob Schudt, em seu livro ‘Curiosidades Judaicas’, narra que o orgulho desenvolveu-se entre os judeus privilegiados. Eles reinavam como príncipes absolutos entre seu próprio povo”.

“A Arrogância da classe se externou quando se estabeleceram ligações comerciais entre banqueiros judeus ― em geral estatais ― de diferentes países, seguiram-se casamentos entre famílias judias mais importantes, gerando um verdadeiro sistema trans-nacional de casta, até então desconhecido na sociedade judaica”.

“Enquanto os judeus ricos desejavam dominar o povo judeu, o que caracterizava os judeus intelectuais era o contrário: eles queriam deixar o seu povo para ser aceitos na sociedade. Ludwig Boerne, cita, que havia na Alemanha um bom número de famílias que, durante gerações, haviam sido batizadas e, no entanto, permaneciam puramente judias”.

A situação social transformou os primeiros judeus cultos em rebeldes [...]. [...] Era geralmente mais fácil para os círculos elegantes admitirem um judeu culto. Para racionalizar uma ambiguidade que eles próprios não entendiam inteiramente, podiam fingir que cabia ao judeu ‘ser um homem na rua e um judeu em casa’[...]. [...] Os judeus sentiam simultaneamente o arrependimento do pária que não se tornou arrivista e a consciência pesada do arrivista que traiu o seu povo ao trocar a participação na igualdade de direitos de todos por privilégios pessoais.

(CONTINUA na parte II com o fenômeno Benjamin Disraeli)


FONTE:

Hannah Arendt, Origens do Totalitarismo – (páginas 76 à 86) – 8ª edição – Companhia das Letras

Site da Imagem: thoth3126.com.br

4 comentários:

Gilberto Ângelo Begiato disse...

Estou gostando Levi vou acompanhar...

Levi esta questão de classe social parece ser sempre o stopim de uma situação não agradável.

Mas vamos esperar o fim desta história né? Estarei aqui pode acreditar rssrrs

Pastor Geremias Couto disse...

Também estou gostando. No aguardo da segunda parte.

Abraços!

Levi B. Santos disse...

GIL

Que bom que você gostou dos trechos que trouxe à tona, sobre a situação judaica, escritos pela pena da grande pesquisadora, Hannah Arendt.

Penso que na próxima semana sairá do forno a parte II

Levi B. Santos disse...

Caro Pastor Geremias Couto

Sinto-me honrado com a sua presença nesse recanto.

A história da condição judaica, não só nos primórdios quanto depois da revolução Francesa, é realmente atraente.

A releitura quase que de fundo psicológico/filosófico que Hannah Arendt nos presenteia, tem realmente subsídios valiosos para uma reflexão mais aprofundada sobre a ambivalência judaica – que fazia com que o “judeu fosse um homem na rua e um judeu em casa”. (rsrs)

Estou preparando a 2ª parte.

Abraços,

Levi B. Santos