A foto é dos irmãos ‘Rothschild’
– banqueiros que dominaram o mundo dos
negócios por dois séculos.
O
capítulo III da primeira parte do Livro ― “Origens
do Totalitarismo” ― de Hannah Arendt, traz uma aguçada
análise da condição dos judeus dentro da esfera do Estado não judeu, a começar
pelo século XVIII. A renomada autora, para confecção desse compêndio, pesquisou
em torno de oitocentos autores (vide bibliografia).
De
sua vasta e antológica obra que repercute até hoje, como fonte de inesgotáveis consultas
por parte de pensadores, políticos e historiadores de todas as Universidades do
mundo, reuni alguns fragmentos emblemáticos do capítulo ― “Os Judeus e a Sociedade” que, para melhor reflexão, dividi-os em três partes.
Segundo
essa famosa historiadora judia nascida em 1906, em Hannover – Alemanha, o anti-semitismo
político surgiu porque os judeus imbuídos pela emancipação constituíam um corpo
à parte; enquanto a discriminação social foi resultado da crescente igualdade
dos judeus em relação aos demais grupos.
No
capítulo I de sua obra, cujo título é “O
Anti-semitismo”, Hannah, já apresenta um esboço
analítico da psicologia do judeu. Ela assim afirma: “...vastas parcelas dos Judeus que se preocupavam com a existência de
seu povo descobriram, num curioso e desesperado erro de interpretação, a idéia
consoladora de que o anti-semitismo, afinal de contas, podia ser um excelente
meio de manter o povo unido, de sorte que na existência do anti-semitismo ‘eterno’
estaria a garantia da existência judaica.”
A
seguir, transcrevo trechos da instigante narrativa dessa sensacional estudiosa
da condição judaica, que despertou, de maneira incomum, a minha curiosidade, no
tocante ao III Capítulo ― “Os Judeus e a
Sociedade”:
Hannah
Arendt, diz, “que o
idealismo da igualdade entre os grupos tende a tornar difícil em se admitir as
diferenças entre as pessoas. A formação do estereótipo do judeu foi em
decorrência desses dois fatos: à especial discriminação e ao especial
favorecimento. Portanto, quanto mais a condição do judeu se aproximava da
igualdade, mais surpreendentes se revelavam as ambivalências: de um lado o ressentimento contra os
judeus; de outro, uma atração peculiar por eles”.
“Os judeus lisonjeados como exceções, os
judeus ‘excepcionais’, sabiam muito
bem que só a ambiguidade ― isto é, o fato de serem judeus, mas presumivelmente
não iguais aos judeus ― abria-lhes as portas da sociedade. Ao se satisfazerem
com esse tipo de relação, procuravam ao mesmo tempo ‘ser e não ser judeu’.”
“O fato é que a sociedade não judaica
exigia que o judeu recém-admitido por ela fosse tão ‘educado’ quanto os seus próprios
componentes tradicionais. Exigia-se dos judeus a assimilação, isto é, o seu
ajustamento à sociedade como condição preliminar da emancipação judaica”.
“Em conseqüência, a elite não judaica
― tolerante, educada e culta ― preocupava-se socialmente só pelos judeus
igualmente educados e cultos. Os demais judeus estavam fora do interesse
humanístico da elite não judaica”.
“Schleiermacher, preconizava que a ‘separação entre eles, os
educados e os outros ‘judeus-judeus’ fosse legalizada pelos governos; por outro
lado se esperava que esses judeus se tornassem espécimes excepcionais da
humanidade, o que tornava obviamente periclitante a posição dos outros judeus
menos ‘ocidentalmente educados’.”
“A França vinha se tornando a terra da
glória política para os judeus. A Prússia iniciava o esplendor social dos
judeus. Mendelssohn, na Alemanha,
estabelecia estreitas ligações com homens famosos da época. Os amigos de Mendelssohn, por sua vez, se utilizavam
dessas relações para fins impessoais ideológicos, e até mesmo políticos”.
Segundo
Hannah
Arendt, “Só depois da derrota
Prussiana em 1806, é que a Alemanha foi tomada de pavor: a emancipação
libertaria os judeus educados, juntamente com as massas judias ‘atrasadas’. A
igualdade destruiria aquela preciosa distinção sobre a qual, como bem sabiam os
judeus emancipados, se baseava seu status social”.
“Assim, quando a emancipação de todos
os judeus finalmente se realizou, a maioria dos judeus assimilados converteu-se
ao cristianismo, achando que, se era suportável e seguro ser judeu antes da
emancipação de todos os judeus, não seria sensato manter o seu judaísmo conspurcado
pela adesão das massas judaicas, que retrógradas, tirariam do judeu excepcional
o halo que dele emanava.
“Em 1816, quando as províncias
ex-polonesas foram recuperadas , os antigos judeus protegidos, que formavam 60%
da população judaica total foram registrados como cidadãos prussianos de fé
mosaica, e perderam o seu status de ‘judeus
exceção’.”
“Na década de 1820, os ricos Rothschild com seu grandioso palácio todo em ouro
e mármore, situado à rua Laffite, em Paris, sustaram uma vultosa doação
destinada à sua comunidade nativa de Frankfurt, num contra-ataque à influência
de reformadores que desejavam que as crianças judias recebessem educação geral.
(“Nova História dos Israelitas” de Isaak
Markus Jost, Berlim – 1846, pag
102). Conta-se que o primeiro judeu da corte, um judeu de Praga,
fornecedor de suprimentos à Saxônia no século XVI”, alimentou ambições
monárquicas em sua própria nação.
“Johan
Jacob Schudt,
em seu livro ‘Curiosidades Judaicas’,
narra que o orgulho desenvolveu-se entre os judeus privilegiados. Eles reinavam
como príncipes absolutos entre seu próprio povo”.
“A Arrogância da classe se externou
quando se estabeleceram ligações comerciais entre banqueiros judeus ― em geral
estatais ― de diferentes países, seguiram-se casamentos entre famílias judias
mais importantes, gerando um verdadeiro sistema trans-nacional de casta, até
então desconhecido na sociedade judaica”.
“Enquanto os judeus ricos desejavam
dominar o povo judeu, o que caracterizava os judeus intelectuais era o
contrário: eles queriam deixar o seu povo para ser aceitos na sociedade. Ludwig Boerne, cita, que havia na
Alemanha um bom número de famílias que, durante gerações, haviam sido batizadas
e, no entanto, permaneciam puramente judias”.
A situação social transformou os
primeiros judeus cultos em rebeldes [...]. [...] Era geralmente mais fácil para
os círculos elegantes admitirem um judeu culto. Para racionalizar uma ambiguidade que eles próprios não
entendiam inteiramente, podiam fingir que cabia ao judeu ‘ser um homem na rua e um judeu em casa’[...]. [...] Os judeus
sentiam simultaneamente o arrependimento do pária que não se tornou arrivista e
a consciência pesada do arrivista que traiu o seu povo ao trocar a participação
na igualdade de direitos de todos por privilégios pessoais.
(CONTINUA
na parte II ― com o fenômeno Benjamin Disraeli)
FONTE:
Hannah Arendt, Origens do Totalitarismo – (páginas 76 à
86) – 8ª edição – Companhia das Letras
Site da Imagem: thoth3126.com.br
Site da Imagem: thoth3126.com.br
4 comentários:
Estou gostando Levi vou acompanhar...
Levi esta questão de classe social parece ser sempre o stopim de uma situação não agradável.
Mas vamos esperar o fim desta história né? Estarei aqui pode acreditar rssrrs
Também estou gostando. No aguardo da segunda parte.
Abraços!
GIL
Que bom que você gostou dos trechos que trouxe à tona, sobre a situação judaica, escritos pela pena da grande pesquisadora, Hannah Arendt.
Penso que na próxima semana sairá do forno a parte II
Caro Pastor Geremias Couto
Sinto-me honrado com a sua presença nesse recanto.
A história da condição judaica, não só nos primórdios quanto depois da revolução Francesa, é realmente atraente.
A releitura quase que de fundo psicológico/filosófico que Hannah Arendt nos presenteia, tem realmente subsídios valiosos para uma reflexão mais aprofundada sobre a ambivalência judaica – que fazia com que o “judeu fosse um homem na rua e um judeu em casa”. (rsrs)
Estou preparando a 2ª parte.
Abraços,
Levi B. Santos
Postar um comentário