“E nos últimos dias, derramarei do meu ‘livre espírito’ sobre todos, através da INTERNET” — parece ser essa, a versão dos tempos atuais para as palavras proféticas que estão escritas no Livro de Joel 2: 28”(Bíblia Sagrada).
Os avanços da tecnologia e da ciência estimulam o homem do mundo dito cristão, a fazer uma releitura ou reinterpretação dos fatos sagrados do livro que mais influenciou e vem influenciando o ocidente. Aqui e acolá, surgem vozes de convocação para uma tarefa árdua: a de reinscrever os traços da Escritura, à moda Talmúdica: uma leitura aberta ao infinito.
A divergência entre povos descendentes de um mesmo pai (Abraão) vem se tornando cada vez mais efervescente na configuração geo-política e religiosa lá no Oriente médio, com repercussão mundial.
Na raiz dessa encrenca milenar está o lema do homem paradoxal: “conseguir o que deseja, quando se deseja e como se deseja”. E isto vem ocorrendo em nome de uma “maldita/bendita” liberdade anunciada desde os tempos mais remotos, lá nas areias finas e quentes do deserto, berço das civilizações.
Pelas ondas invisíveis (como o próprio Deus) da internet, essa coisa diabólica e divina que fundou uma nova era de comunicação, faz transbordar de dentro de nossas cabeças, discursos virtuais que varrem o mundo em questão de poucos segundos.
Nossos encontros, via internet, fizeram renascer epigramas, versos, máximas, ensaios, estudos com uma velocidade descomunal, que mal temos tempos de discuti-los com profundidade.
No entanto, a despeito desses novos anseios cibernéticos, muito do que as pessoas fazem, ainda é governado por velhos modos de pensar.
Na verdade, lá no nosso mais íntimo recanto somos assombrados pelo desassossego de viver sem a proteção de alguém mais poderoso, sem uma mão mais forte a segurar a nossa. Ser dependente para nós é uma constatação terrível e insuportável, apesar de existir dentro de nós um tipo de liberdade: a de dar nomes às coisas.
Psicanaliticamente falando somos escravos dos instintos. Somos consumidos por um desejo de algo novo. Esse anseio primitivo, no entanto, se torna cansativo e doloroso, e terminamos por ceder a um “senhor mais forte”, que nos oferece o antigo fio em que nos quedamos escravos. Nossas autobiografias, caso retrocedessem a nossos ancestrais, poderiam nos fazer ver de que forma eles foram escravizados, e até que ponto nos libertamos dessa herança.Veríamos que não somos nós que falamos; dentro de nós há muitas vidas. Muito de nossa ancestralidade grita através de nossa garganta. Caminhamos em um círculo, onde tudo que vemos e que racionalizamos como novidade, já foi passado.
Usamos os pés de outras pessoas quando andamos para frente, usamos os olhos de outra pessoa para reconhecer as coisas, usamos a memória dos que se foram, para formatar as nossas ambições. Escreveu Plínio (o Velho) 77 d.C.: “as únicas coisas que guardamos para nós mesmos são os nossos prazeres”.
Será que somos realmente livres?
Como “ser livre”, se as memórias que guardamos do nosso passado, ainda regem e influenciam os nossos sentimentos no presente?
Dizemos que somos livres ao pensarmos que os conceitos que adotamos são puramente nossos, quando não passam de um somatório de influências que incorporamos no dia a dia de nossa existência. “O homem moderno vive na ilusão de saber o que quer, quando de fato ele quer o que se supõe que deva querer” (Erich From — O Medo à Liberdade)
Não podemos deixar de reconhecer que o mundo se tornou complexo demais, deixando-nos quase sem nenhuma saída para nossos dilemas, a vivenciar uma situação de carência em que os desejos não suprem o vazio da alma.
Escolhemos a INTERNET (ou ela nos escolheu?), como um bálsamo ou remédio para as nossas dores existenciais. É por ela, que enfim, encontramos a rachadura ou brecha para sonhar com a reforma do mundo, e assim, poder nos sentir VIRTUALMENTE LIVRES.
Ensaio por Levi B. Santos
Guarabira, 28 de fevereiro de 2011