29 dezembro 2014

Uma Fuga Para o Lazer?!




É em época de final de ano e começo do que está por vir que a grande maioria dos terráqueos da espécie “homo sapiens” deixa as suas atividades obrigatórias para o descanso e lazer. Não por acaso, o mito ocidental da criação fala de um Criador que escolhe o final da semana para descansar de sua árdua tarefa.

Theodore Zeldin — um dos mais importantes pensadores da modernidade —, em “Uma História Íntima da Humanidade” já dizia: “Todos os seres humanos são, por sua origem, escapistas”. 

Todos, sem exceção, exercem a fuga da realidade dolorosa do trabalho. Até aqueles que nas férias permanecem estáticos em seus lares, viajam em pensamento. Não deixam de viajar os que têm na arte seu exercício diário: é que eles se abstraem da realidade em seus mundos imaginários, mesmo sem sair do lugar. Sobre a fuga da realidade, o filósofo grego, Heráclito (552 — 487 a.C.) já afirmava em seu ceticismo: “estando o Universo em constante mudança, não há para onde fugir”. 

Às vezes, o refúgio das férias se transforma em dores da alma. A medicina, sempre ela, já descobriu a Síndrome do Lazer: trata-se de um quadro patológico em que crises de ansiedade severas, nas férias, assolam indivíduos obsedados pela rotina de trabalho: a abstinência abrupta do emprego por trinta dias é responsável por suas dores de cabeça, depressão e noites insones. Para os portadores dessa síndrome, que não conseguem se desligar do trabalho nas horas livres, a solução é levar para seu suposto ambiente de lazer, alguma ferramenta (celular, laptop, etc) que possa simular o ambiente laboral.

Como o mundo anda passando por um estado tão frenético e caótico, o indivíduo ao entrar de férias, pode estar simplesmente arranjando sarna para se coçar: na ânsia de fugir do intolerável pode acabar caindo em um outro lugar igualmente insuportável. 
  
Em tempos de globalização, a sociedade tecnológica pós-industrial com seu discurso racional vem subjugando os indivíduos (peças de sua engrenagem) aos seus ditames: para ela, tanto o trabalho quanto o lazer seguem uma lógica mecanicista ou mercadológica. Ao programar o seu “lazer correto”, a mídia não leva em conta a subjetividade de cada pessoa. Na era atual, o esforço dispensado na prevalência dos projetos consumistas é acachapante, e o que menos importa são o descanso e o ócio criativo.

Dizem que os que cultivam a arte já vivem em permanente fuga. Os artistas, penso, não são acometidos da síndrome do lazer, pois, vivem constantemente empenhados em fazer de sua ansiedade uma fonte inesgotável de belas criações. É que eles, em sua longa experiência na arte de fugir pela imaginação, quanto mais ansiosos ficam, mais produzem.

Alguns dizem que o nosso desejo de tirar férias provém de um arquétipo que foi implantado e adormecido em nossa psique desde tempos imemoriais: arraigada nas camadas profundas de nossa mente existe uma parte secreta que nos estimula a vagar pelo mundo. É que no curso da História fomos primeiramente nômades. Só depois é que nos tornamos sedentários.

Domenico de Masi, em seu best seller, “O Ócio Criativo”, chega a afirmar que “para reencontrar a prazerosa felicidade, os cidadãos se sentem, periodicamente, atiçados pelo demônio da viagem”.

São muitas as opções ou dicas de “férias inteligentes” oferecidas na internet. Há milhares de anúncios apelativos, tipo: O cronograma está muito apertado, portanto, projete suas férias com urgência, e fuja da superlotação nos transportes, da poluição sonora, do estresse, da violência, do engarrafamento no trânsito.

Mas o que há de se fazer, sabendo que os dias de dezembro e janeiro, os mais tumultuados do ano são, de praxe, reservados para o lazer dos funcionários municipais, estaduais e federais?  Muitos poderão pensar, com certo grau de congruência, que tudo não passa de despeito do pobre ensaísta que, por ora, teima em nadar contra a corrente de um caudaloso rio.

 À multidão de resignados e corajosos que saem de férias nessa época, só me resta desejar que voltem aos seus lares menos cansados e mais revigorados para enfrentar mais um ano que se prenuncia carregadíssimo, em todos os aspectos. Tudo faz crer que os dias de 2015 serão mais interessantes, eletrizantes e decisivos em todos os setores de nossas vidas, que os de 2014 (ano em que as falácias foram usadas com um despudor nunca visto).




Por Levi B. Santos
Guarabira, 29 de dezembro de 2014

Site da Imagem:  jornaldaorla.com.br

15 dezembro 2014

Um Natal sem Comilança




Há poucos dias, encerrando a última consulta do ano a meu endocrinologista ataquei com essa pergunta: “Como seria a minha ceia de Natal, doutor?”

 — Sua ceia de Natal será primorosa, por que não? — confidenciou-me.

Cá comigo, por alguns segundos, fiquei a me perguntar: “Como poderia ser primorosa uma ceia de Natal sem torta, sem vinho, sem coca-cola, sem docinhos, sem pratos maravilhosamente caprichados, carregados na manteiga e nas massas?”

O endocrinologista com os seus possíveis 70 anos (formou-se em medicina um ano antes de mim), como que adivinhando minhas conjecturas silenciosas, exclamou:

— Puxa rapaz, sua ceia poderá ser saudável e maravilhosa! Você vai comer do arroz, do peru ou do chester, com abundantes verduras, depois, rebate no final com muitas frutas.

— Como comer muitas frutas, doutor, se o senhor aconselhou-me devorar apenas duas frutas por dia?

— Ué! Uma salada de muitas frutas! — disse enfático, olhando-me por cima dos óculos de grossas lentes.

Sua afirmação consoladora estimulou-me o riso. Como médico, sei que o uso de certos clichês é importantíssimo para elevar a auto-estima do doente. Deu vontade, mas me contive, não perguntando quantas vezes em seu consultório o velho especialista em diabetes teria repetido para cada cliente a “tirada” da salada.

— Se as minhas taxas de glicose, uréia e creatinina estiverem normais, posso dar uma saidinha da dieta, doutor? — perguntei, quase sabendo sua resposta.

— Aí é que reside o perigo, meu colega. Você se esbalda e depois vem aqui começar todo o processo, como nunca estivesse se tratando. Quer isso? — indagou o endocrinologista de forma intimidadora. 

Conformei-me com o veredicto médico e saí do recinto da clínica matutando com meus botões: “Vou tirar de letra!”. É que já estava, há um mês, adaptado à dieta magra e insossa complementada com biscoitinhos “diet” que me fizeram perder, até agora, cerca de 1,5 quilos. Olhando para a barriga constato que, por enquanto, as calças vão dando para usar, necessitando apenas afivelar o cinturão um buraquinho adiante.

Os poetas dizem que não percebemos que morremos aos poucos à medida que paulatinamente um prazer hedônico nos é tirado. Mas a vida pode ser suportável e bem vivida sem os prazeres da gula natalina. Por que não?

Na minha imaginação já estou em plena ceia de Natal, cercado de convidados a me indagar: “Você ficou sem comer por quê?”. “Não posso, fazer o quê?” — respondo. “Mas só um pedacinho, não vai fazer mal. Prove?”. Os ritos da preparação da ceia causam-me azia. Entre castanhas, figos, passas, nozes e amêndoas confeitadas, farofas gordas e douradinhas recheadas de miúdos de peru, encontro meu vidro de antiácido, abro-o e tomo uma dose.

E não é que a salada de frutas adoçada com “Zero Cal” que degustei lentamente estava com sabor de mel!

Pretendendo acalmar o meu olfato e meu paladar na esperança de que o odor expelido dos pratos de guloseimas natalinas não invada o meu sono após a meia noite, sorvo rápido um copo de suco de maracujá. Diz a medicina popular que a polpa dessa fruta é um tranquilizante natural excelente para diabéticos.



Por Levi B. Santos
Guarabira, 15 de dezembro de 2014

Link da Imagem: combichocarpinteiro.pt

07 dezembro 2014

O Compulsivo e o Obsessivo em Nós




“Se sinto as raízes indago: por que não as vejo?/Esse legado de herança que invade os meus sonhos/São sonhos que se nutrem do meu passado opaco”. [Levi  B. Santos]



Diz-se que a Psicanálise é irmã gêmea da Arqueologia. Essas duas instâncias realmente têm muito em comum: elas se ocupam em investigar o que se encontra escondido nas profundezas, não se interessando tanto pelo que existe na superfície. Para esses arqueólogos, como acontece com o iceberg, a superfície deixa à mostra apenas a ponta de algo extremamente maior que se encontra submerso.

Na verdade, o trabalho do arqueólogo, de forma metafórica, se compara muito ao trabalho do psicanalista. Tanto o arqueólogo quanto o analista são escavadores que, incessantemente, anseiam descobrir um rico tesouro enterrado no subsolo. Seus objetivos são idênticos: trazer à luz do dia àquilo, o desconhecido, que reside nas profundezas das trevas geológicas e psíquicas.

Para Freud, os alicerces falhos e incompletos da infância do indivíduo devem ser resgatados de sua latência. Muitas marcas do irracional que hoje influenciam o agir e o pensar do homem moderno têm no subsolo da psique a sua origem. O pensamento de Freud abalou a certeza cartesiana, ao fazer ver que nada evolui da superfície do solo, senão daquilo que está nele enterrado.  

É do lugar mais profundo de nossa estrutura psíquica que surgem as pulsões ou desejos inconscientes de retorno a um estado primitivo. De certa forma temos todos um certo grau de compulsão ou uma tendência a repetir as primeiras experiências, sem saber que na miragem de nosso ideal estão encarnados os desejos fantasiosos da criança que se foi — um baú de histórias vivenciadas de amor e ódio.

O velho ditado muito conhecido que diz — “De médico e louco todos nós temos um pouco” —, pode perfeitamente ser aplicado ao nosso âmbito psicológico. Parafraseando esse significativo adágio, poderíamos dizer: “De compulsivo e obsessivo, todos nós temos um pouco”. O que varia nesse caso é a graduação desses sintomas: o excesso deles é que provocaria o quadro patológico denominado T.O.C. (Transtorno obsessivo-compulsivo)

No nosso dia a dia quem nunca experimentou as chamadas pequenas obsessões, sob a forma de pensamentos repetitivos, dúvidas persistentes, uma música que se cantarola quase involuntariamente por alguns dias, uma viagem que sempre pensamos em fazer e nunca a efetuamos?

Quer queiramos ou não, somos colecionadores de lembranças e recalques. Impulsionados por um discreto grau de obsessão classificamos, separamos, etiquetamos e guardamos reminiscências ou coisas sem notar que por trás desse trabalho todo, em sua mediação, se insere algo parecido com um ritual compulsivo.

A confirmação da ocorrência de desejos obsessivos e compulsivos em nosso recinto psíquico está implícita na afirmação corriqueira que sai da boca de nossos ancestrais: “Ele foi sempre assim, desde criancinha!”.

Esse homem de chumbo, frio e já desvanecido fisicamente, nunca vai deixar de ser reflexo do menino que um dia foi. Quando ele rir triunfante, ou quando fica triste e melancólico o que se vê é a criança de tempos atrás. A sua sentença é viver entre espasmos de retração e abertura. Tal qual um molusco ele, involuntariamente, deixa aparecer e desaparecer a sua parte frágil sepultada sob a carapaça endurecida e esmaecida pelo tempo.

Abram-se os arquivos arqueológicos presentes em nosso ego primitivo e lá encontrarão, com certeza, doses de desejos obsessivos e ritos compulsivos.
 Sobre esses arquivos subterrâneos produtores de diversos sentimentos recorrentes, entre eles o nostálgico, o escritor e psicanalista Rubem Alves, em seu livro — “Retorno e Terno”— assim, se expressou:

 “Enquanto depender de mim, os campos ficarão lá. Enquanto depender de mim os cerrados ficarão lá. Porque tenho medo de que, se eles forem destruídos, a minha alma também o será”.


Por Levi B. Santos

Guarabira, 06 de dezembro de 2014


Site da Imagem: leituraescrita.com.br

27 novembro 2014

Objeto Vivo



Dizia Weber: “o desempenho de cada indivíduo é matematicamente medido, cada homem se torna uma engrenagenzinha da grande máquina e, ciente disso, sua única preocupação é saber se poderá tornar-se uma engrenagem maior.”

O escritor e poeta americano, Thomas Stearns Eliot (1888—1965), em “O Coquetel”, trata da coisificação do homem. Como peça de uma grande engrenagem, o indivíduo, enquanto durar, está fadado a exercer o seu papel, quer nas fábricas, escolas, órgãos do governo, tribunais, presídios, igrejas, lojas, corporações militares, hospitais, etc. Como no mito do herói grego Sísifo, o ser humano está sentenciado a carregar, diuturnamente, a grande pedra até o cume do monte, mesmo sabendo que após seu árduo trabalho, pela força da gravidade, ela retornará ladeira abaixo. O mito nos mostra que a tarefa dolorosa de subir a montanha com o fardo e ter alívio na descida, é uma constante. Freud, por certo, deve ter retirado dessa história, subsídios para formular a teoria ou conceito de “princípio do prazer” versus “princípio da realidade”.

O trecho poético de “O Coquetel”, de Eliot, através de uma situação crítica, nos oferece um exemplo contundente de como o homem da vida moderna se sente despersonalizado ou reduzido a uma coisa:

“...tomemos uma operação cirúrgica.
Na consulta com o médico e o cirurgião,
Ao ir para a cama na casa de saúde,
Ao falar com a enfermeira-chefe, você ainda é sujeito,
O centro da realidade. Mas, estirado na mesa,
Você é um móvel numa oficina
Para aqueles que o cercam, os atores mascarados;
Tudo o que existe de ‘você’ é seu corpo
E  o “você” é retirado.
Há uma perda da personalidade;
Ou melhor, você perdeu o contato com a pessoa
Que supunha ser. Já não se sente tão humano,
Você fica reduzido à condição de um objeto —
Um objeto vivo, porém não mais uma pessoa.
Isso está sempre acontecendo, porque se é tanto um objeto
Quanto uma pessoa. Mas a gente se esquece disso
O mais depressa que pode. Quando você se veste para uma festa
E vai descendo a escada, com tudo a seu redor
Arranjado para sustentá-lo no papel que você escolheu,
Às vezes, ao chegar ao último degrau,
Há um degrau além do que seus pés esperavam,
E você vem abaixo num solavanco. Por um momento,
Você teve a experiência de ser um objeto
À mercê de uma escada malévola.


Yannis Gabriel, em “Freud e a Sociedade”, disse: “Poucas pessoas avaliaram tão bem quanto Eliot, o sofrimento dos indivíduos em sua vida pública e em suas relações pessoais”.


“...Aprendem a evitar as expectativas exageradas,
Tornam-se tolerantes com eles mesmos e com os outros,
Dando e recebendo, nas ações costumeiras,
O que há para dar e receber”. (Eliot. T. S.)

“O homem se transformou num autômato” — disse Erich Fromm. “O homem virou uma coisa” — acrescentou Marcuse. Será que existe uma fórmula diferente da fornecida acima por T. S. Eliot, para se conviver pacificamente em uma sociedade tecnicamente globalizada e despersonalizada?




Por Levi B. Santos
Guarabira, 27 de novembro de 2014

Site da Imagem: Ibahia.com

13 novembro 2014

O Efeito Sazonal Assusta



Por conta do feriado do próximo dia 15, saí hoje, com a finalidade de antecipar as compras de hortaliças e frutas que seriam realizadas no final de semana. Após fazer o  apanhado dos citados alimentos em um dos Sacolões de minha cidade, tive um susto: a soma dos produtos que adquiri para consumo durante a semana, na pontinha do lápis, teve um aumento de mais de 20% em relação à semana anterior.

Resolvi não por a culpa no governo e acreditar no ministro Mantega que, apesar de já saber que não vai continuar no governo Dilma, vem se desdobrando para explicar as causas da inflação que por ora está assustando os consumidores. Disse ele: “a elevação nos preços dos alimentos é sazonal”. Ou seja, o ministro falou que era a falta de chuva que vinha causando a alta dos alimentos.

 20% de inflação, em uma semana, no setor de hortifrutis, convenhamos, não seria algo estarrecedor para se colocar toda a culpa na conta de São Pedro? Mas decidi acreditar que os 20% que paguei a mais em relação à semana anterior, não foi efeito reprimido da ressaca eleitoral.

Sabedor de que em um passado recente, o “chuchu” foi responsabilizado pela inflação durante mais ou menos dois meses, decidi procurar a opinião de um especialista em Economia, nessa área.

 Para que serve o Google?

 Em alguns segundos, encontrei a resposta: O professor, Rogério Gomes de Economia alimentar da Unesp de Araraquara – SP dá o seu veredicto: “a alta do preço dos alimentos está relacionada à seca que atingiu às lavouras dos EUA”. [Vide Link]

Conformei-me com a resposta do Especialista. Afinal, o mundo está globalizado tanto para o que é bom quanto para o que é mal: isto eu já sabia. Só não sabia que a culpa recaía sobre o malfadado país, EUA, tão cantado e decantado pelo seu progresso tecnológico em todas as áreas de saberes.

Através de minhas recentes pesquisas, detectei que foi de lá (dos EUA), que o nosso atual secretário de política econômica do Ministério da Fazenda, Marcio Holland, foi buscar a grande descoberta científica de que o ovo tem até mais nutrientes que a carne.

Deve estar bem fresquinho na memória de todos, o pedido que o ministro fez aos brasileiros para trocar por ovos a carne de preço bastante elevado — o que ocasionou uma reprimenda por parte da Dilma(Como pode, na reta final das eleições, um ministro sair com uma explicação científica altamente prejudicial à candidata ao cargo maior da república?).

A nutróloga Tâmara Mazaracki, membro da Associação Brasileira de Nutrologia, confirmando a afirmação “fora de tempo” do ministro, explica que a carne vermelha pode ser substituída, sim, por ovos e outros tipos de alimentos, como cogumelos, laticínios e sementes (Vide Link). O conselho do ministro, contrário ao script eleitoreiro, afinal, tinha lá sua veracidade comprovada pela ciência.

Como os hortifrutis são imprescindíveis na manutenção adequada do funcionamento do organismo humano e, a meu ver, não há substitutos à altura deles, esperemos que na falta de resposta de São Pedro, os EUA (o berço de todas as tecnologias avançadas) façam chover sobre o seu quintal (O Brasil)  barateando esses alimentos que, por ora, pesam tanto no nosso bolso.

Tomara que a decisão de bombardeamento de nuvens, tomada há três meses pelo Governo de São Paulo, dê resultados satisfatórios[Vide Link]. Se tudo ocorrer bem (São Pedro ajudando São Paulo) o efeito sazonal (a seca) que a todos prejudica de forma veemente, não será mais culpada de produzir índices inflacionários tão elevados nessa época do ano. 


Por Levi B. Santos
Guarabira, 13 de novembro de 2014

Site da Imagem: Agenda Pública

01 novembro 2014

Os Mortos de Javé e Alah em Véspera de Finados



O bloqueio da Esplanada das Mesquitas efetuado pelo governo de Israel, ontem (dia 31) ―, o primeiro em 14 anos, foi motivado pela morte do Yehuda  Glick ― profeta das hostes javelianas que liderava um movimento pela reconstrução de um novo templo judeu nesse local "sagrado". 

Do lado ocidental é assim: os cristãos vêem a reconstrução do Templo de Salomão como um sinal inequívoco da volta do Messias (que dizem ter ressuscitado há quase dois mil anos), para arrebatar a sua igreja. Quanto mais quente for o conflito e quanto mais gente morrer defendendo os seus deuses mais os fundamentalistas cristãos, de braços erguidos e olhos arregalados para as nuvens, dizem em êxtase: “Ora vem Senhor Jesus!”

O “Céu” e o “Inferno”, como placas tectônicas, estão sempre em atritos nessa região. Nessa véspera de Finados, a luta insana ou louca dos deuses, por ora, resultou em uma morte para cada facção divina. Poucas horas depois de ser morto o judeu que pregava e sonhava  com a reconstrução do Templo de Jerusalém no local da Mesquita muçulmana, o palestino Moataz Hejazi foi assassinado, de acordo com preceito da Torah, que preconiza o “olho por olho e dente por dente”. Foram duas vítimas na véspera de finados: tomara que fique só nisso. Mas, segundo o que se noticia, as tensões podem se agravar no final de semana.

A Folha de São Paulo, de ontem, dá uma sucinta explicação para se entender o conflito imaginário entre os deuses Javé e Alah na mente dos neuróticos de um lado e de outro:

“A Esplanada é gerida desde as cruzadas por religiosos muçulmanos. Israel que ocupa Jerusalém Oriental desde 1967 controla o acesso ao local, mas mantém um veto a manifestações religiosas a todos os não muçulmanos, como medida de segurança”.

Vale salientar que o último fechamento da esplanada foi devido à visita do profeta e ministro de Javé, Ariel Sharon, que em setembro de 2000 invadiu o local sem ter conversado com Alah.

Para complicar ainda mais o imbróglio sagrado-infernal, o monte Moríá, onde no século VII foi construído o Domo da Rocha ― a Mesquita de Al-Aqsa ―, segundo a análise de Diogo Bercito, é local considerado sagrado pelos judeus. É que a tradição sugere que foi ali que Abraão se dispôs a sacrificar seu filho, no que seria o primeiro infanticídio em nome de Javé. Diogo Bercito é jornalista da Folha, formado em Filosofia, Letras, e estudioso de línguas orientais.

Quem tiver um pouco de inteligência, sem dúvida, irá concluir que toda essa ação montada não passa de uma jogada política, para que se concretize a hegemonia de Israel na região, e se cumpra os vaticínios vétero-testamentários de destruição dos que não seguem o deus único e verdadeiro da tradição judaico-cristã. Javé e Alah, nas mentes dos fundamentalistas, continuam a se digladiarem no sentido de fazer ver qual deles vai levar a melhor. (rsrs)

Segundo, Nilton Bonder, líder da Congregação judaica no Brasil, todo este conflito fabricado tem na praga do convencimento, a sua raiz. Diz ele:
“A idéia que norteia nossa civilização ocidental é que para um lado ter razão o outro tem que necessariamente, estar errado. [...] A luta pela afirmação de uma nação judaica vai contra a maioria das correntes no seio do judaísmo [...]. Paradoxalmente é em Israel que a visão sionista está tendo o custo mais alto, por um processo típico do retorno do recalcado”.

Bernardo Sorj, formado em História pela Universidade de Haifa, PhD em Sociologia pela Universidade de Manchester, diz algo extramemente duro, em seu livro “Judaísmo para o Século XXI”:

O Judaísmo moderno acabou, mas não sabemos como enterrá-lo. [...] A imposição de uma língua única, o esforço, em boa medida fracassado, de criar uma cultura judaica secular “naturalista” e o desapreço pela diáspora como fonte de valores e de vivência criativa foram elementos constitutivos do esforço normatizador e disciplinador da ideologia e do sistema educacional que se implantou em Israel”.

A Esplanada da Mesquita e das ruínas do templo de Salomão tem sido palco da luta ente o bem e o mal. Cada facção, ver Satã na outra que professa o deus de nome diferente. Na verdade, ele projeta o “satã” que habita em si próprio. Plagiando Nilton Bonder, “Satã não seria tão importante e não causaria tantas mortes se as questões que ele traz à luz na mente de cada fundamentalista não fossem as grandes questões humanas.”

Que os exércitos de Javé e de Alah façam uma pausa nesse dia de Finados e reflitam sobre os seus desejos de destruição que tantas vítimas fizeram e ainda fazem: justamente àquelas que não professam o mesmo deus. Acabem de uma vez por todas com a história de que só o seu deus salva, e que o do outro é que leva a perdição.  O maior mal da humanidade é o desejo de triunfo teológico que, ainda em plena pós-modernidade, infelizmente, vem marcando grandes conflitos; guerras, que certos religiosos, em sua imaginação, percebem como se fossem ordens emanadas de seus deuses vingativos e sanguinários.


Por Levi B. Santos

Guarabira, PB


Site da Imagem: culturabrasil.org

20 outubro 2014

Maquiavel e a Corrupção




Acredito que no Brasil nunca se falou tanto em corrupção, quanto vem ocorrendo nesta campanha presidencial entre Dilma e Aécio. Já não se suporta mais tanta lavagem de roupa suja sendo exibida pelos candidatos nos meios de comunicação ― um verdadeiro “vale tudo”, rotulado como “debate de ideias”, entre dois “vendedores de bondades” postulantes ao cargo máximo da república.

Não há como deixar de recorrer ao famoso conselheiro dos príncipes da idade média ― o italiano Nicolau Maquiavel (1469 ―1527) ―, para se compreender bem a agressividade e os desaforos trocados entre os dois meliantes.

O filósofo e historiador americano e ex-consultor do Conselho de Segurança dos EUA, Michael A. Ledeen, em seu livro ― “Maquiavel e a Liderança Moderna” ― mostra de forma inteligível o quanto os lideres políticos contemporâneos, com a sua tendência em perdoar os grandes erros de todo o mundo, estão se descuidando daquilo que preconizava Nicolau Maquiavel.

O autor de “O Príncipe” (o preferido de Napoleão), em suas lições, falava sobre a importância de punir os grandes malfeitores de uma forma a mais dramática possível, para que influísse no estado psicológico do povo. Sobre o efeito da punição, diz Michael A. Leeden (página 156/157) de seu livro: “Em primeiro lugar, o povo sente um assombro reverente pela violência do ato, que derruba por terra algum personagem poderoso. Isso lhes mostra que mesmo os mais poderosos estão sujeito à justiça da Lei [...]. O segundo elemento psicológico é a ‘satisfação’, o tipo de catarse por que passa à platéia enquanto assiste uma tragédia clássica. [...] Nossos expurgos periódicos de políticos corruptos são exatamente o tipo de coisa que Maquiavel tinha em mente, seja Watergate nos EUA, a destruição da velha classe política italiana, ou a humilhação de políticos e gerentes no Japão.”

O autor de “Maquiavel e a Liderança Moderna” faz ver que os conselhos de Maquiavel não estão desatualizados, foram apenas substituídos por outra forma de pena. Afirma ele: “Hoje ao invés de tirar a vida se destrói a reputação e a carreira dos corruptos, mas o efeito sobre o público é o mesmo, especialmente porque muitos de nossos carrascos modernos são jornalistas e comentaristas de TV que proporcionam o palco necessário e levam o drama a uma grande platéia. Não há nada que lembre tão eficazmente ao povo que seus líderes precisam agir dentro dos limites legais quanto botar na cadeia alguns homens poderosos que se acreditavam acima da lei ou destruí-los por meio do escândalo”.

Em tempos de maquiagem de contas públicas, lavagem da dívida do país para patrocinar superávits mentirosos, diante de bate-bocas com alto potencial demagógico e acusações sem limites entre debatedores guiados por marqueteiros de ocasião, torna-se imperativo registrar uma magistral fala de Tocqueville, que tem muito a ver com essa trágica palhaçada de atores “mal” treinados, montada nos sofisticados palcos de nossos principais canais de Televisão para elevar a audiência e o faturamento das emissoras.  

O povo nunca penetrará no escuro labirinto das intrigas palacianas e sempre terá dificuldade em perceber a torpeza que espreita sob os modos elegantes, os gostos refinados e a linguagem graciosa. Contudo pilhar a bolsa do povo e vender os favores do Estado são artes que o mais ordinário vilão compreende e espera praticar por sua vez.”

Por último, quero aqui ressaltar o emblemático epílogo da obra de Michael A. Ladeen (página 179):

“As regras de Maquiavel se apóiam numa claríssima visão da natureza humana. Se você acha que as pessoas são essencialmente boas e, quando deixadas por conta própria, criarão comunidades amorosas e bons governos, você nada aprendeu com ele”.



Por Levi B. Santos
Guarabira, 20 de outubro de 2014

16 outubro 2014

Tempos em Que a Pureza Pode Ser Fatal





Maximilien de Robespierre (1758 ―1794), líder da Revolução Francesa que, sob o lema “liberdade igualdade e fraternidade”, encantou o mundo de sua época, defendendo com toda tenacidade a República e o seu ideal de democracia social.  

Ontem (dia 15), na coluna de Mônica Bergamo (Folha de São Paulo), Walter Feldman ― coordenador da campanha de Marina Silva à Presidência da República ― disse algo profundamente filosófico para reflexão de todos: a pureza não existe nem em nossas vidas”.

A pretensão de ser um "ser puro" foi explorada ao máximo pelos dois candidatos à Presidência de nossa República. Passaram cerca de duas horas em rede nacional pela TV Bandeirante trocando farpas e desaforos que nada têm a ver com o termo DEBATE. 

Não poderia deixar de destacar, aqui, o que Robespierre, provavelmente desiludido e pouco antes de ser guilhotinado, deixou escrito. Disse ele:

“Quando é que o povo será educado? Quando tiver pão suficiente para comer, quando os ricos e o governo deixarem de subornar penas e línguas traiçoeiras para enganá-lo... Quando acontecerá? Nunca”. (trecho de “Pureza Fatal” na VEJA de 11 de  Novembro de 2009)

Comentando, ontem (dia 15), a digladiação entre integrantes da Rede Sustentabilidade, Walter Feldman, coordenador da campanha de Marina, aconselhou a todos digladiadores de ocasião lerem o livro “Pureza Fatal” ― obra que fala de como a pretensa pureza de Robespierre levou a França ao terror, com ele destruindo seus próprios companheiros.

Para quem não lembra, o próprio Robespierre, confundindo a realidade com seus ideais e desejos, assumiu o papel de um ser puro, uma espécie de sacerdote. Mal sabia que estava contaminado por sintomas de esquizofrenia auditiva em que “vozes religiosas” sopravam aos seus ouvidos: “impeça qualquer defesa diante do Tribunal Revolucionário!” 

Em obediência aos ditames de uma pureza que a religião persegue, o defensor da “liberdade, igualdade e fraternidade” ordenou a execução dos adversários da revolução francesa. Todos sabem no que deu a “Pureza Suprema”: Robespierre e a sonhada república fundiram-se em um único e mesmo tirano.

O livro Pureza Fatal ― Robespierre e a Revolução Francesa, de Ruth Scurr, nos remete a refletir sobre as picuinhas, bajulações, charlatanismos e lavagens de roupa suja que, hoje, sob o rótulo de debate entre candidatos à Presidência da República, invadem os nossos lares e tiram o nosso sono.

Como todos sabem, e a religião ratifica, o “dom de iludir” é muito forte, e a platéia raramente resiste à tentação de dar uma espiada no desempenho dos artistas em cena. Já se fala que o próximo debate entre Aécio e Dilma baterá todos os recordes de audiência. Indubitavelmente teremos mais uma reprise de troca de acusações e tiradas de efeito: cada um querendo ser mais puro e mais transparente. No fundo, os debatedores sabem que devem seguir a estratégia  maquiavélica: atenção máxima para não cometer sincericídio (“ato falho” ― revelar verdades inconvenientes que deveriam permanecer ocultas).

Dom de Iludir” ― fenomenal canção do grande letrista da MPB, Caetano Veloso, define de forma precisa e poética o “Divino Poder de Iludir”. Não deixe de conferir essa emblemática música caetaneana, caro leitor/eleitor. E se quiser (e cai bem), substitua a palavra “mulher”(da letra da modinha) por “revolucionário”, “reformador”, “salvador da pátria”, “governo novo-ideias novas”, etc.



Por Levi B. Santos
Guarabira, 16 de outubro de 2014

05 outubro 2014

O Estado e o Uso do Papel Higiênico



Na França, Luis XIV, apelidado de “Rei Sol” cunhou a célebre frase: “O Estado Sou Eu”, que resumia bem o poder absoluto que encarnava em seu tempo (1638 ― 1715).

É em época de eleições que postulantes a governo dos estados e da presidência do Brasil revestem-se da onipotência presente em Luis XIV. De lá para cá, o espírito que movia o venerado rei Francês, virou uma obsessão irremediável, particularmente, desde os tempos imemoriais da forçada “proclamação da República” pelo marechal Deodoro da Fonseca.

Como é do conhecimento de todos, o Estado Brasileiro se imiscui em todas as áreas de nossa vida, instituindo normas, regras e métodos sobre como viver e se comportar de acordo com o que pensa ser bom e politicamente correto para si.

O Estado, na falsa ilusão de fornecer proteção à população, chega a se meter onde não devia: tentando regulamentar até os hábitos ou preferências do indivíduo. Quando muitos, hoje (dia 05), são obrigados a sufragar nas urnas nomes que mal conhecem para reger seus destinos, nada melhor que ler a última crônica que João Ubaldo fez antes de partir dessa para outra.

A genial crônica desse fenomenal romancista tem por título, “O Correto Uso do Papel Higiênico”. Deixo-a abaixo transcrita para a reflexão do sofrido e idealista eleitor brasileiro que, neste domingo(dia 05), sai da tranqüilidade de sua casa para, segundo as leis do país, exercer seu suposto direito de cidadania:

"O correto uso do papel higiênico"
Última crônica escrita pelo imortal da Academia de Letras, João Ubaldo (1941 ― 2014), publicada no jornal “O Globo” em 18 de julho de 2014:

“O título acima é meio enganoso, porque não posso considerar-me uma autoridade no uso de papel higiênico, nem o leitor encontrará aqui alguma dica imperdível sobre o assunto. Mas é que estive pensando nos tempos que vivemos e me ocorreu que, dentro em breve, por iniciativa do Executivo ou de algum legislador, podemos esperar que sejam baixadas normas para, em banheiros públicos ou domésticos, ter certeza de que estamos levando em conta não só o que é melhor para nós como para a coletividade e o ambiente. Por exemplo, imagino que a escolha da posição do rolo do papel higiênico pode ser regulamentada, depois que um estudo científico comprovar que, se a saída do papel for pelo lado de cima, haverá um desperdício geral de 3.28 por cento, com a consequência de que mais lixo será gerado e mais árvores serão derrubadas para fazer mais papel. E a maneira certa de passar o papel higiênico também precisa ter suas regras, notadamente no caso das damas, segundo aprendi outro dia, num programa de tevê.
Tudo simples, como em todas as medidas que agora vivem tomando, para nos proteger dos muitos perigos que nos rondam, inclusive nossos próprios hábitos e preferências pessoais. Nos banheiros públicos, como os de aeroportos e rodoviárias, instalarão câmeras de monitoramento, com aplicação de multas imediatas aos infratores. Nos banheiros domésticos, enquanto não passa no Congresso um projeto obrigando todo mundo a instalar uma câmera por banheiro, as recém-criadas Brigadas Sanitárias (milhares de novos empregos em todo o Brasil) farão uma fiscalização por escolha aleatória. Nos casos de reincidência em delitos como esfregada ilegal, colocação imprópria do rolo e usos não autorizados, tais como assoar o nariz ou enrolar um pedacinho para limpar o ouvido, os culpados serão encaminhados para um curso de educação sanitária. Nova reincidência, aí, paciência, só cadeia mesmo.
Agora me contam que, não sei se em algum estado ou no país todo, estão planejando proibir que os fabricantes de gulodices para crianças ofereçam brinquedinhos de brinde, porque isso estimula o consumo de várias substâncias pouco sadias e pode levar a obesidade, diabetes e muitos outros males. Justíssimo, mas vejo um defeito. Por que os brasileiros adultos ficam excluídos dessa proteção? O certo será, para quem, insensata e desorientadamente, quiser comprar e consumir alimentos industrializados, apresentar atestado médico do SUS, comprovando que não se trata de diabético ou hipertenso e não tem taxas de colesterol altas. O mesmo aconteceria com restaurantes, botecos e similares. Depois de algum debate, em que alguns radicais terão proposto o Cardápio Único Nacional, a lei estabelecerá que, em todos os menus, constem, em letras vermelhas e destacadas, as necessárias advertências quanto a possíveis efeitos deletérios dos ingredientes, bem como fotos coloridas de gente passando mal, depois de exagerar em comidas excessivamente calóricas ou bebidas indigestas. O que nós fazemos nesse terreno é um absurdo e, se o estado não nos tomar providências, não sei onde vamos parar.
Ainda é cedo para avaliar a chamada lei da palmada, mas tenho certeza de que, protegendo as nossas crianças, ela se tornará um exemplo para o mundo. Pelo que eu sei, se o pai der umas palmadas no filho, pode ser denunciado à polícia e até preso. Mas, antes disso, é intimado a fazer uma consulta ou tratamento psicológico. Se, ainda assim, persistir em seu comportamento delituoso, não só vai preso mesmo, como a criança é entregue aos cuidados de uma instituição que cuidará dela exemplarmente, livre de um pai cruel e de uma mãe cúmplice. Pai na cadeia e mãe proibida de vê-la, educada por profissionais especializados e dedicados, a criança crescerá para tornar-se um cidadão modelo. E a lei certamente se aperfeiçoará com a prática, tornando-se mais abrangente. Para citar uma circunstância em que o aperfeiçoamento é indispensável, lembremos que a tortura física, seja lá em que hedionda forma — chinelada, cascudo, beliscão, puxão de orelha, quiçá um piparote —, muitas vezes não é tão séria quanto a tortura psicológica. Que terríveis sensações não terá a criança, ao ver o pai de cara amarrada ou irritado? E os pais discutindo e até brigando? O egoísmo dos pais, prejudicando a criança dessa maneira desumana, tem que ser coibido, nada de aborrecimentos ou brigas em casa, a criança não tem nada a ver com os problemas dos adultos, polícia neles.
Sei que esta descrição do funcionamento da lei da palmada é exagerada, e o que inventei aí não deve ocorrer na prática. Mas é seu resultado lógico e faz parte do espírito desmiolado, arrogante, pretensioso, inconsequente, desrespeitoso, irresponsável e ignorante com que esse tipo de coisa vem prosperando entre nós, com gente estabelecendo regras para o que nos permitem ver nos balcões das farmácias, policiando o que dizemos em voz alta ou publicamos e podendo punir até uma risada que alguém considere hostil ou desrespeitosa para com alguma categoria social. Não parece estar longe o dia em que a maioria das piadas será clandestina e quem contar piadas vai virar uma espécie de conspirador, reunido com amigos pelos cantos e suspeitando de estranhos. Temos que ser protegidos até da leitura desavisada de livros. Cada livro será acompanhado de um texto especial, uma espécie de bula, que dirá do que devemos gostar e do que devemos discordar e como o livro deverá ser comentado na perspectiva adequada, para não mencionar as ocasiões em que precisará ser reescrito, a fim de garantir o indispensável acesso de pessoas de vocabulário neandertaloide. Por enquanto, não baixaram normas para os relacionamentos sexuais, mas é prudente verificar se o que vocês andam aprontando está correto e não resultará na cassação de seus direitos de cama, precatem-se.”

P.S.:
Fica a cargo do eleitor, advinhar qual candidato (ou candidatos) à presidência da república, tem na alma, a intenção que o texto maravilhosamente revela.

Guarabira, 05 de outubro de 2014

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